Brasília - O deputado Jair Bolsonaro discute com a deputada Maria do Rosário durante comissão geral, no plenário da Câmara dos Deputados, que discute a violência contra mulheres e meninas, a cultura do estupro, o enfrentamento à impunidade e políticas públicas de prevenção, proteção e atendimento às vítimas no Brasil (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
“Não acho que quem ganhar ou quem perder, nem quem ganhar nem perder, vai ganhar ou perder. Vai todo mundo perder.”
A frase, dita pela ex-presidente Dilma Rousseff, é tão confusa que mais parece uma premonição. Sairemos todos perdedores desse processo eleitoral. O único vencedor será o ódio, o sentimento de ódio que já se mostra em cada esquina.
A presença do ex-capitão Jair Bolsonaro, do PSL, no pleito desse ano (e alcançando níveis altíssimos de aceitação) é o principal sintoma de um fenômeno que não é brasileiro e, sim, mundial. Vivemos a era do individualismo, do neopopulismo, do antiglobalismo, expresso no seu maior ícone, Donald Trump.
O ódio que se espalha pelo mundo e – na Europa e nos Estados Unidos – tem como alvo os imigrantes e os refugiados, no Brasil é canalizado internamente. O ódio tupiniquim é pelo seu próprio povo, pelos jovens pobres da periferia, pelo movimento feminista, pelos intelectuais de esquerda. O ódio legitimado pelo candidato de extrema-direita é, em parte, uma reação de quem perdeu as garantias e o status nos últimos anos. Como no trumpismo, o bolsonarismo usa o ódio e o rancor como orgulho e afirmação.
É esse sentimento já existe, independentemente do vencedor. Na vitória de Bolsonaro, a legitimação da homofobia, misoginia, machismo, racismo e intolerância. Na vitória de Haddad, a desconfiança, o boicote por parte de outros setores, a instabilidade política por mais quatro anos, o revanchismo.
O que acontece com ódio depois da eleição? Na rua, simplesmente ser é perigo. Ser jovem, gay e querer caminhar (somente caminhar com seu fone de ouvido) pode ser perigoso se você estiver sozinho. Ter um adesivo contrário ao candidato do momento faz você correr um grande risco de levar uma fechada numa grande avenida e ter que ouvir coisas do tipo “comunista tem que andar de ônibus”. Andar com sua filha pequena numa praça e pedir que os manifestantes parem de gritar palavrões ao defenderem o dito candidato pode resultar em tiros para o alto. Ser judeu e amanhecer com um símbolo nazista pintado no portão da sua casa.
As histórias acima poderiam ser fictícias, numa espécie de exercício de futurologia, mas todas elas são reais e aconteceram na mesma semana em três estados diferentes.
Seja quem for o presidente, no Congresso aumentamos ainda mais o conservadorismo com o reforço das bancadas evangélica, ruralista e da bala (a famosa Boi, Bíblia e Bala, BBB), o que deixa o país na mesma encruzilhada de sempre. Acabamos com a velha política e colocamos o que no lugar dela?
Serão quatro anos de um país que não se assusta em ter um ex-militar que tirou do armário o conservadorismo de quem anseia um líder que se guia pelos princípios dos tempos da ditadura. Como dizia Pedro Aleixo, então vice-presidente às vésperas do Ato Institucional -5, “o problema não é a lei ou os que governam. O problema é o guarda da esquina.”
A socióloga e pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo, Esther Solano, avalia que o ódio virou uma moeda de troca importante no campo político atual. Segundo ela existe um uso eleitoral do ódio, já que o “ódio potencializado” é um caminho às urnas. A pesquisadora espanhola é autora de estudos sobre o que pensam os eleitores do capitão reformado do Exército e deputado federal, Jair Bolsonaro. Ao comentar seu novo livro “O ódio como política”, lançado pela editora Boitempo, Esther ainda falou sobre o “risco real” de fascismo no Brasil e na vanguarda da luta das mulheres contra esse sistema. Confira a entrevista.
*Originalmente a conversa foi veiculada pela Rádio CBN. A entrevista foi realizada em parceria com os jornalistas Roberto Nonato e Kennedy Alencar.
Estamos em uma fase onde o ódio está cada vez mais presente na sociedade?
O que o livro quis fazer é justamente chamar atenção para essa presença de ódio como uma moeda de troca importante no campo eleitoral e no campo político. Vivemos no Brasil em uma sociedade que se constrói muito na ideia do ódio, do machismo, do racismo, da desigualdade. O que vemos hoje é uma politização do discurso de ódio, uma “eleitorização” do discurso de ódio e ódio polarizado, pois ele é um bom caminho para as urnas.
O candidato Jair Bolsonaro (PSL) é que mais recorre a esse tipo de discurso. O que explica o crescimento desse discurso de ódio e da extrema-direita no Brasil?
Eu sempre digo que a candidatura da extrema-direita brasileira, de forma geral, se constrói sobre três “antis”. A primeira delas é a politização da antipolítica, que é aquele sentimento de “são todos iguais, todos corruptos”. A segunda é a negação do petismo e da esquerda. Existe um discurso muito forte de combate á esquerda e ao campo progressista e intelectual. E, por fim, há uma reação muito forte aos movimentos identitários, onde ganhou força o discurso antifeminista, movimento negro, movimento LGBT, colocando esses movimentos como culpados pela diferenciação social tão grande que existe nas relações sociais no Brasil.
Antes de passar por governos alinhados socialmente à esquerda, o Brasil passou por governos alinhados social e economicamente à direita. Por que esses discursos de ódio não surgiram antes? Existe um fator econômico no ódio?
Sem dúvida. Existe hoje um realinhamento de uma força neoconservadora e intolerante no campo dos valores e uma força econômica liberal ou ultraliberal. A candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) é altamente simbólica nisso. Ele é um personagem construído nessa ideia dos valores, da família cristã, do militarismo, mas atrás da candidatura dele está o Paulo Guedes, que é uma pessoa que simboliza esse liberalismo ,a privatização e esse capitalismo mais selvagem. Existe um casamento obviamente oportunista aí. Só que as pessoas não são conscientes disso. Quando você pergunta para eleitores da extrema-direita sobre economia, ele não é consciente desse discurso neoliberal que está por trás, já que ele é tratado de forma escondida, às escuras.
Essa percepção vai além do Brasil em uma espécie de onda global?
Se dúvida. Globalmente existe um ressurgimento dessa extrema direita e isso é uma coisa que, efetivamente, você vê em países da Europa, América Latina e Estados Unidos. A diferença no Brasil e o que me preocupa bastante é que normalmente nos países europeus a retórica dessa extrema-direita se constrói com base no inimigo externo, no imigrante ou no refugiado. No Brasil existe uma peculiaridade. Essa retórica na extrema-direita se constrói com base em um inimigo interno. Então aqui a luta é contra o jovem negro da periferia, contra a feminista, contra o professor, contra a pessoa da esquerda. Existe uma violência contra o próprio brasileiro que é considerado como um “não cidadão de bem”
Nos últimos tempos a palavra fascismo vem sendo dita com uma frequência muito grande. Em alguns momentos , até, corre-se o risco de esvaziar a palavra de significado. Existe um risco real de fascismo no Brasil?
Sem dúvida. E nesse caso é importante contextualizarmos o que significa fascismo. Muitas pessoas confundem fascismo com uma certa política adotada em determinado momento histórico, fundamentalmente na Europa. Mas o fascismo na sua concepção política e filosófica mais ampla é o silenciamento, aniquilamento do outro que é considerado diferente. É uma política que mobiliza o ódio, que utiliza o ódio como mobilizador para fazer política. Então quando você tem candidatos que são abertamente xenofóbicos, misóginos, que dizem que “bandido bom é bandido morto”, esse é um discurso claramente fascista. O que não quer dizer que todo mundo que vote nesse tipo de pessoa seja fascista. Há pessoas que votam por outros fatores, como a descrença na política. Mas essa tendência política pode, sim, ser nomeada dessa forma.
Se o candidato Jair Bolsonaro for eleito, esse movimento terá no presidente da república o seu líder. No entanto, se ele perder a eleição quem ficaria nesse grupo de direita? A senhora vê uma retomada desse eleitorado pelo PSDB ou pelo João Amoêdo, do Partido Novo?
Por um lado existe um certo paradoxo, pois você tem uma “bolsonarização” da esfera pública. Se o Bolsonaro não foi eleito o que fica capilarizado na esfera pública é esse discurso de ódio, da intolerância, do antipetismo, da moralização do debate público. Agora, ele é um candidato que não tem um partido político com estrutura, é isolado politicamente. Eu não vejo nesse momento uma estrutura político-partidária, institucional que consiga capitalizar esse discurso de ódio a ponto de você ter, de fato, uma estrutura forte ou competitiva como você tem na França. Mas isso é secundário, pois quando você já tem essa bolsonarização do debate na sociedade é questão de tempo para eles encontrarem outros tipos de canalizações. Temos que atacar esse discurso no campo social para que ele não extrapole o campo político.
Nos últimos dias vimos o crescimento de um movimento muito forte de mulheres que se opõem ao candidato Jair Bolsonaro. É um movimento que surgiu na internet, mas que já vem sendo usado de forma partidária por outros candidatos. Já havíamos presenciado algo parecido na história recente? Qual a dimensão desse movimento fora das redes sociais?
Já tivemos movimentos parecidos encabeçados por mulheres quando elas encabeçaram a oposição ao Eduardo Cunha, na questão da descriminalização do aborto. Uma coisa muito importante é que a internet tem sido um ambiente muito colonizado ultimamente pelo pensamento feminista. Houve o movimento #meuprimeiroassedio, #agoraéquesãoelas, etc. Esse movimento Mulheres Contra Bolsonaro ele é extraordinário por vários fatores. Primeiro que o voto feminino vai ser determinante nessa eleição, também pelo fato de as mulheres serem claramente atacadas pelo discurso de ódio (estamos na linha de frente dessa luta) e também em função de outros grupos terem se juntado a isso. Temos agora os LGBT Contra Bolsonaro, Negros Contra Bolsonaro, Evangélicos Contra Bolsonaro. Você vê que no campo do social, do coletivo e das ruas o feminismo é muito forte. Ele tem potencial para criar uma frente contra o fascismo. Acho que a onda de feminismo brasileira é a vanguarda da luta contra o fascismo. Somos nós, mulheres, que temos mais dificuldades para entrar na política. Então acho simbólico que sejam as mulheres a tomar a frente desse movimento.
Na semana passada o Vós trouxe um compilado das propostas dos candidatos para as mulheres. No pleito de 2018 há duas candidaturas encabeçadas por elas e outras quatro compostas por mulheres na vice-candidatura, achamos interessante explorar o tema. Tão interessante, que procuramos duas pesquisadoras para comentar os planos.
Deisy Cioccari e Beatriz Pedreira estudam os temas mulher e política e, como já esperávamos, não ficaram surpresas com a falta de propostas para o público feminino. Para Deisy fica claro o uso a mulher como moeda de troca nas campanhas eleitorais. Já para Beatriz, temas como o aborto ainda ficam de fora , pois precisamos ainda desmistificar o tema antes de colocá-lo na berlinda. Separamos dois trechos da entrevista com cada uma delas.
Deisy Cioccari, jornalista, mestre em Produtos Midiáticos: Jornalismo e Entretenimento, doutora em Ciência Política e pós-doutoranda em Comunicação
A surpresa seria se as pautas do aborto e da equiparação salarial entre homens e mulheres estivessem bem específicas nos planos de governo. Lendo os planos de governo lembrei da presidente Dilma Rousseff na campanha de 2010. Ela tentou tocar na pauta do aborto e depois passou a campanha inteira sofrendo pelo que falou. Ela teve até que escrever uma carta à população e, ainda assim, foi super genérica. Eu costumo dizer que a política é feita de homens para homens e quando surge uma questão feminina eles silenciam. A conversa com o congresso (sobre o aborto) é quase impossível. As bancadas mais fortes na Câmara são a bancada ruralista, a bancada da bala e a bancada evangélica. E a bancada evangélica vai trancar qualquer pauta ligada ao aborto”
“A mulher é usada na propaganda eleitoral como moeda de troca. Quando interessa, ela aparece na pauta do debate eleitoral. Um exemplo é quando você vê o Bolsonaro falando algo sobre a mulher. Ele que é o candidato mais misógino que vimos nos últimos anos! Fora isso, a própria equiparação salarial não tem nenhuma proposta concreta. É tudo muito genérico quando a pauta é o feminismo. É uma política de homens para homens. Quando a mulher aparece nos planos de governo, ela aparece ainda associada a políticas voltadas para criação de creches, ou com alguma função mais familiar. A mulher não assume o protagonismo nos planos de governo. Mesmo tendo duas mulheres como candidatas a presidente e quatro como vices, não há protagonismo feminino.”
Beatriz Pedreira, é cientista social e especialista em inovação política, cofundadora do Instituto Update (instituto que mapeia iniciativas de inovação política na América Latina)
Eu não fiquei surpresa, mas fiquei impressionada com a pouca presença das mulheres nos planos, mesmo nos candidatos que têm uma visão mais progressista. Mesmo no que diz respeito a iniciativas de incentivo à equiparação salarial, qualquer mudança na legislação precisaria passar pelo Congresso. O que o presidente pode fazer é criar campanhas e incentivos para começar a discutir de uma forma mais direta isso na sociedade. A equiparação salarial entre homens e mulheres que ocupam os mesmos cargos já está na Constituição, só precisamos encontrar maneiras de cumprir.”
“O aborto é um tema muito sensível, um tema que não tem espaço para discussão na sociedade brasileira. Muitos candidatos, mesmo pessoalmente à favor, entendem essa iniciativa como inviável politicamente. É um tema extremamente impopular. Somos uma sociedade conservadora, religiosa, que tem pouquíssima informação sobre a descriminalização do aborto como política de saúde pública. Não temos nenhuma conscientização sobre isso. É outro tema que depende do Congresso. O que o presidente pode fazer é criar campanhas de conscientização, ir trabalhando isso na sociedade para desmistificar esse processo. Os números são muito racionalmente explicáveis, mas o tema é ainda muito tabu. É uma questão de tempo, não é algo para agora.”
É isso mesmo, vocês não estão lendo errado. Hoje, nesta coluna, eu quero agradecer a todos os intolerantes de plantão, especialmente ao candidato à presidência Jair Messias Bolsonaro, do PSL. Graças a ele a Companhia das Letras vai reeditar um livro que há anos estava esgotado no Brasil. Trata-se de Aparelho sexual e cia. O ataque que o candidato recebeu é inaceitável, porque coloca a disputa política no nível mais primitivo de enfrentamento. Bolsonaro e seus apoiadores estão aprendendo da pior maneira possível que adotar a violência como forma de fazer política é uma via de mão dupla. Este episódio, que rebaixa ainda mais a política brasileira – quando pensamos que isso não seria possível -, não muda a forma como o candidato do PSL vê o mundo, o que diz ou pensa. Pelo contrário: mesmo após ter sito vítima de violência, Bolsonaro segue incentivando o ódio, posando para fotos no leito do hospital fazendo referência a armamentos e tiros.
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Bolsonaro é um mentiroso contumaz
Mente sem sentir
Mente sem corar
Mente em rede nacional a quem quiser ouvir
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E o desespero de um Brasil em pedaços leva muita a gente a lhe dar ouvidos. Uma mentira recente foi dita em entrevista ao Jornal Nacional, quando apresentou o livro Aparelho sexual e cia como parte do suposto “kit gay” que seria distribuído nas escolas durante o governo de Dilma Rousseff. Esta mentira tem tantos lados que não sei nem por onde começar a desmentí-la.
O fato é que a menção ao livro resgatou sua popularidade, colocou a autora nos holofotes e fez com que a Companhia das Letras decidisse reeditá-lo. Por isso eu digo: obrigado, Bolsonaro. Desta vez, suas mentiras ao menos tiveram alguma utilidade.
O livro foi escrito pela francesa Helene Bruller e lançado em 2007 no Brasil. É uma obra publicada em mais de dez idiomas e com mais de 1,5 milhão de exemplares vendidos no mundo inteiro. A própria autora já declarou, em entrevista à Folha de São Paulo, que o pequeno Jair teria adorado o livro em sua juventude. Mas o jovem Jair não leu este livro. E o adulto Bolsonaro deu um tiro no próprio pé ao espalhar mentiras a respeito da obra.
O Ministério da Educação vem reafirmando, desde 2013, que nunca colocou este livro nas escolas. Aliás, o projeto de combate à homofobia nunca esteve voltado a crianças de seis anos de idade, como mente Bolsonaro. E, lamentavelmente, não saiu do papel porque Dilma Rousseff cedeu às pressões da bancada fundamentalista no Congresso. Em uma declaração profundamente infeliz, a presidente disse, à época, que não cabe ao governo fazer “propaganda de opção sexual”.
Enquanto a velha esquerda se acanha e a nova direita avança, seguimos sem uma política nacional de combate à LGBTfobia nas escolas. Seguimos sendo o país que mais mata LGBTs no mundo. Seguimos expulsando jovens trans das salas de aula e empurrando essa população para as esquinas da noite. Seguimos apostando em muros ao invés de erguer pontes. Menos mal que, agora, os pais verdadeiramente preocupados com a educação sexual de seus filhos poderão comprar Aparelho sexual e cia na livraria mais próxima. Algo me diz que será um campeão de vendas. Um recado silencioso e potente de um Brasil que ainda resiste, apesar de tudo.
Meio ambiente . Dois candidatos não contemplam propostas para a área
Geórgia Santos
10 de setembro de 2018
É notório que o problema ambiental se agrava a cada dia que passa. Além do aquecimento global, há o excesso de consumo de plástico e péssimos hábitos sociais e alimentares. Mas a forma como os governos conduzem as políticas públicas voltadas para o meio ambiente é determinante para o nosso futuro. E a forma como os governos NÃO conduzem as políticas públicas voltadas para o meio ambiente é ainda mais importante.
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Por isso, decidimos explorar o conteúdo dos planos de governo dos candidatos à presidência da República – disponíveis no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – e compreender o nível de comprometimento de cada um e cada uma com as questões ambientais.
O plano de governo de Alvaro Dias (Podemos) tem 15 páginas e traça as principais diretrizes de um projeto com 19 metas. Até pelo tamanho, não é um texto com muitos detalhes sobre a forma como cada proposta será realizada. Uma das metas é voltada para o meio ambiente e se chama “Verde-água e saneamento 100%”.
No texto, o candidato propõe “preservação e aproveitamento integral dos biomas nacionais; proteção dos mananciais (replantio de matas em 3500 municípios); gestão produtiva dos cursos d’água e aquíferos; cumprimento do plano RenovaBio (créditos para descarbonização); e prioridade Saneamento RS 20 bilhões/ano em esgoto tratado.”
Alvaro Dias garante, ainda, que “o meio-ambiente não pode ser negligenciado e desenvolvimentos tecnológicos devem ser utilizados para a sua preservação.” São propostas gerais e genéricas, sem um plano focado nos problemas mais graves do Brasil como desmatamento para criação de gado e produção de soja, além da exploração de reservas naturais.
O plano de governo de Cabo Daciolo (Patriota) não contempla o meio ambiente. Mas faz questão de dizer, em caixa alta, que “BEM-AVENTURADA É A NAÇÃO CUJO DEUS É O SENHOR”. Salmos 33:12″ Ok.
O plano de governo de Ciro Gomes tem 62 páginas e lista o que são diretrizes gerais, mas não definitivas, de governo. É um projeto desenvolvimentista que tem no horizonte o fortalecimento do agronegócio, algo que, no Brasil, é um problema em si se considerarmos as atuais práticas de desmatamento e consumo de água para criação de animais e plantio de culturas sem rotação. De qualquer forma, é um dos planos mais completos e específicos no que tange ao meio ambiente e ainda prevê “prática de menores taxas de juros para aquelas que inovarem e preservarem o meio ambiente.”
No ítem “Desenvolvimento e Meio Ambiente”, o candidato dá detalhes do plano para a área ambiental reforçando que processos de desenvolvimento econômico, reindustrialização, agricultura e infraestrutura devem ocorrer de forma sustentável, preservando o meio ambiente. “A maior parte dos conflitos observados na Política de Meio Ambiente é fruto de uma oposição artificial entre dois conceitos originalmente interligados, a ecologia e a economia. Percebemos que não há falta de espaço, mas sim de ordenamento no uso e ocupação das terras.”
Ciro Gomes alerta para o fato de que os sistemas produtivos não precisam ocupar áreas vocacionadas a preservação, o que é um ponto importante para um candidato que tem Kátia Abreu (PDT) como candidata a vice, notória defensora do agronegócio e conhecida informalmente como a “rainha da motoserra”. Ele promete, então, avançar em “políticas de harmonização da preservação com a produção” por meio do desenvolvimento, no país, de agrotóxicos específicos e menos agressivos e ao incentivo à adoção de sistemas de controle alternativos na agricultura.
O projeto ainda prevê a redução da emissão dos gases de estufa até 2020, definidas pelo Acordo de Paris, e estímulo ao desenvolvimento de ecossistemas de inovação sustentável.
Outro ponto importante é a proposta de estimular setores que possam agregar mais valor à produção a partir parâmetros de sustentabilidade. Por exemplo, a indústria de móveis pode utilizar madeira de reflorestamento certificada e a indústria de cosméticos pode utilizar insumos vegetais em vez de químicos.
Em um plano de nove página, Eymael dedica um espaço ao “Meio Ambiente Sustentável”, em que promete “proteger o meio ambiente e assegurar a todos o direito de usufruir a natureza sem agredi-la”, além de “orientar as ações de governo, com fundamento no conceito de que a TERRA É A PÁTRIA DOS HOMENS.”
O plano de governo do candidato do PT tem 58 páginas e é um dos mais detalhados no que tange às propostas para os problemas ambientais, dedicando 13 paginas ao tema. Promete “garantir práticas e inovações verdes como motores de crescimento inclusivo.” No item 5 do programa, Lula propõe uma “Transição Ecológica para a nova sociedade do século XXI”. Esse item em específico contempla propostas para uma economia de baixo impacto ambiental e valor agregado por meio inovação; políticas de financiamento e Reforma Fiscal verde; infraestrutura sustentável para o desenvolvimento; soberania energética com foco na transição para a energia renovável; diversificação da matriz de transporte; gestão de resíduos e o fim dos lixões; e produção de alimentos saudáveis, com menos agrotóxicos etc.
O programa contempla uma proposta de país em que “as práticas, tecnologias e inovações verdes vão ajudar a criar mais e melhores empregos e serão novos motores de crescimento inclusivo”, com foco no longo prazo, em uma economia justa e de baixo carbono. Além de se comprometer a cumprir as diretrizes do Acordo de Paris.
De maneira geral, o projeto do candidato do PT, seja Lula ou Haddad, considera a área ambiental estratégica para questões de saúde, saneamento e infraestrutura. Dentre as principais propostas ainda estão a de reduzir o desmatamento e as emissões de gases do efeito estufa; a regulação do grande agronegócio para amenizar os danos socio-ambientais; promoção da agricultura familiar; e um programa de redução de agrotóxicos.Há, ainda, a promessa de adotar medidas concretas para diminuição dos impactos ambientais gerados pelo consumo de descartáveis, estimulando a mudanças de hábitos para redução de seu uso e/ou substituição por materiais biodegradáveis.
O texto do plano de governo do candidato do PT ainda foca nas conquistas dos governo anteriores de Lula e Dilma, em que houve redução do desmatamento e das emissões de gases de efeito estuda. Embora ignore que o agronegócio se fortaleceu nos moldes de sempre e que não houve uma política pública específica para a redução de agrotóxicos.
No texto de nove páginas, o candidato do PSDB garante que, nas Relações Exteriores, o Brasil vai defender valores como a democracia e os direitos humanos e os “Objetivos do Desenvolvimento Sustentável” (ODS), servirão como referências no relacionamento externo brasileiro. Geraldo Alckmin ainda garante que a gestão da Amazônia receberá atenção especial, uma vez que o “meio ambiente e o desenvolvimento sustentável são grandes ativos do Brasil.”
Um ponto importante do programa é a garantia do cumprimento das metas assumidas no Acordo de Paris.
O plano ainda prevê que o Brasil deve liderar a economia verde e garante que a questão ambiental será tratada de forma técnica, “evitando a politização e a visão de curto prazo que pautaram os debates ambientais.” Infelizmente, essas palavras são códigos conhecidos de ambientalistas. Especialmente quando vem de uma candidatura que tem como vice Ana Amélia Lemos (PP), defensora ferrenha do agronegócio e barreira humana quando o assunto é o meio ambiente. Além disso, o partido de Alckmin representa uma série de problemas ao meio ambiente. Nilson Leitão (PSDB-MT), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária é um exemplo disso.
O programa de Guilherme Boulos é o mais extenso, com 228 páginas, e é um dos que mais se dedica ao tema do meio ambiente, recursos naturais, florestas e comunidades humanas. No item 10 do programa, Boulos fala de “Terra, Território e Meio Ambiente: um novo e urgente modelo de desenvolvimento.”
O plano dá muita importância à demarcação de terras indígenas, força da vice da chapa, Sônia Guajajara; reforma agrária e agroecológica; desmatamento zero e restauração das florestas com espécies nativas.
Boulos afirma, no plano de governo, que é possível e necessário zerar o desmatamento em uma década em todos os biomas e apresenta uma série de medidas para que isso aconteça, como aumento da fiscalização à atividade agropecuária e à grilagem de terra e o confisco de bens associados à crimes ambientais; estabelecimento de novas áreas protegidas; o uso da tributação para o estimulo à conservação; e incentivos financeiros para aumentar a produtividade. Além disso, a União, os Estados, Municípios e o Distrito Federal não mais concederão autorizações de desmatamento das florestas nativas brasileiras.
O programa ainda prevê a proteção das águas e sistemas hídricos; a defesa dos bens comuns e dos direitos da natureza; transição energética e produtiva, visando superar o uso dos combustíveis fósseis.
Boulos também se compromete a reduzir as emissões de gás e a restaurar 120 mil km2 de suas florestas até 2030, conforme previsto no Acordo de Paris.
O programa de 21 páginas indica que o governo patrocinará ações que visem à defesa das riquezas naturais e do meio ambiente – particularmente na Amazônia. Henrique Meireles afirma a importância da valorização da biodiversidade e ações de proteção ao patrimônio natural.
O candidato do MDB afirma que cumprirá com as diretrizes do Acordo de Paris, elevando a participação de bioenergia sustentável, incentivando o reflorestamento e estimulando o investimento em energias renováveis.
O plano de governo de Meirelles ainda prevê programas de redução do desmatamento na Amazônia; de recuperação de nascentes e de revitalização do Rio São Francisco; e a conversão de multas ambientais em novos recursos para serem usados em programas de conservação e revitalização do meio ambiente.
É importante lembrar, porém, que o governo de Michel Temer, do qual Meirelles fazia parte, foi extremamente nocivo ao meio ambiente e protagonizou retrocessos importantes, como o decreto extinguindo a Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), na Amazônia.
O plano de governo de Jair Bolsonaro tem 81 páginas e não contempla propostas ao Meio Ambiente. O candidato propõe, inclusive, terminar com o ministério da área e unir com o Ministério da Agricultura, tornando a questão ambiental secundária. “A nova estrutura federal agropecuária teria as seguintes atribuições: Política e Economia Agrícola (Inclui Comércio); Recursos Naturais e Meio Ambiente Rural; Defesa Agropecuária e Segurança Alimentar; Pesca e Piscicultura; Desenvolvimento Rural Sustentável (Atuação por Programas) Inovação Tecnológica.”
O plano de 23 páginas dá bastante destaque às questões do meio ambiente, ressaltando a “responsabilidade com as futuras gerações com foco na sustentabilidade”. Como a maioria dos programas, também dá um grande destaque ao agronegócio, mas o que chama de um agronegócio “moderno e indutor do desenvolvimento” com uma economia de baixo carbono.
João Amoêdo foca na questão de que é essencial combinar preservação ambiental com desenvolvimento econômico. No longo prazo, pretende universalizar o saneamento no Brasil e promover o que chama de conciliação definitiva entre conservação ambiental e desenvolvimento agrícola. O candidato do partido Novo também promete eliminar o desmatamento ilegal.
Dentre as principais propostas estão o saneamento e recuperação dos rios por meio de parcerias com o setor privado; aplicação do Código Florestal; avanço no cadastro ambiental rural; fim dos lixões também por meio de PPPs; ampliação da energia renovável na matriz energética e fim de subsídios à energia não-renovável.
O plano de João Goulart Filho tem 14 páginas e vincula, inicialmente, a questão ambiental à reforma agrária. O candidato se compromete a priorizar o processo de desapropriação de todas as terras que não cumprem, entre outras coisas, a preservação do meio ambiente.
O candidato ainda pretende rever o Código Florestal de forma a aumentar a proteção do meio ambiente e garantir a produção agropecuária, promovendo um desenvolvimento que supõe o uso racional dos recursos naturais, de forma a atender às necessidades crescentes da população e a respeitar o meio-ambiente. Segundo o programa, o capitalismo dependente brasileiro é vítima da exploração predatória não apenas da força de trabalho, mas também dos recursos naturais. Dentre as propostas estão o aumento da multa e da pena a crimes ambientais, o fim dos lixões e tratamento de esgoto. Além de fortalecer a transição para combustíveis menos poluentes.
A área do meio ambiente é especial para a candidata Marina Silva, que tem a sustentabilidade como bandeira pessoal há muitos anos. Tanto é assim que o tema aparece já no nome do plano de governo, “BRASIL JUSTO, ÉTICO, PRÓSPERO E SUSTENTÁVEL. O programa reforça a convicção de uma sociedade socialmente justa e ambientalmente sustentável, “que assuma o papel de líder global, principalmente no que diz respeito à qualidade de vida de sua população, ao uso inteligente dos recursos naturais.”
O plano de Marina, com relação ao meio ambiente, foca no bem-estar animal; ciência, tecnologia e inovação; cidades sustentáveis e urbanismo colaborativo; futuro com sustentabilidade, inovação e emprego; infraestrutura para o desenvolvimento sustentável; e liderança para uma economia de carbono neutro.
O plano de governo destaca que “em nenhum outro país as condições naturais para uma transição justa para uma economia de carbono neutro são mais evidentes do que no Brasil. Temos alta capacidade para gerar energia de fontes renováveis como biomassa, solar, eólica e hidrelétrica e detemos as maiores áreas de florestas entre os países tropicais, enorme biodiversidade e a segunda maior reserva hídrica do mundo.” A partir disso, Marina propõe o alinhamento das políticas públicas econômica, social, industrial, energética, agrícola, pecuária, florestal, e da gestão de resíduos e de infraestrutura.
Marina também se compromete a cumprir as diretrizes do Acordo de Paris por meio de uma estratégia de longo prazo de descarbonização da economia com emissão líquida zero de gases de efeito estufa até 2050.
O programa ainda prevê papel de liderança da Petrobras nos investimentos em energias limpas. “Criaremos um programa de massificação da instalação de unidades de geração de energia solar fotovoltaica distribuída nas cidades e comunidades vulneráveis.”
O programa de cinco páginas de Vera Lúcia, do PSTU, não aborda o meio ambiente em específico. Mas no item três, em que fala dos “Planos de obras públicas para gerar emprego e resolver problemas estruturais”, ressalta que o meio ambiente deve ser respeitado. Também, no item sete, vincula o tema à Reforma Agrária. “Defendemos a nacionalização e estatização do grande latifúndio e do chamado agronegócio sob o controle dos trabalhadores para que definam a sua produção de acordo com as necessidades do povo e em harmonia com o meio ambiente.”
Li um artigo maravilhoso no Man Repeller que me inspirou a fazer um experimento: renomear aquilo a que chamo de falhas. O título é bastante explicativo: Maybe the Secret to Embracing Your Flaws Is Renaming Them – Talvez o Segredo para Aceitar suas Falhas seja Renomeá-las(tradução livre). Gostei da ideia. E vou começar pelo começo.
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A partir de agora, quando se trata das características do meu corpo, não tenho falhas. Tenho COISINHAS
Adorei algumas das sugestões do texto. Aquele bigodinho chato virou “angel hair“, pêlo ou cabelo de anjo. Gente, pêlo todo mudo tem, algumas mais, outras menos, mas todo mundo tem. Bora largar os pelinhos de mão. Outra ideia boa é o novo nome para as olheiras que agora se chamam “nature´s contouring“, ou contorno de natureza. As rugas são celebrações.
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O meu favorito, no entanto, é o nome novo para os cabelos com frizz:
CABELOS EM FESTA
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Muito mais adequado, não é mesmo. Mas, apesar de gostar dos nomes sugeridos por Amelia Diamond, acho que parte do processo de cura é que cada uma renomeie suas coisinhas. Nossa cara tem que estar nessa atitude. Então arrisquei e agora as coisas estão mais leves por aqui.
Esse foi um começo, um ensaio. Mas há mais inseguranças e muitos outros nomes para inventar. Me ajuda?
Ontem foi um dia muito massa. Todas lembramos das gurias do Rouge, todas lembramos do sucesso de Asereje. Mas ontem à noite, Aline Wirley, Fantine Thó, Karin Hils, Li Martins e Lu Andrade lançaram o clipe do single Dona da Minha Vida. A música é um berro, um hino do empoderamento feminino que lembra que nós somos donas das nossas vidas e escolhas.
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E eu estou nesse clipe
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É muito louco participar de uma coisa que tem uma repercussão dessas. É muito louco e muito bom, porque nesse processo eu também conheci várias mulheres muito legais. Aliás, nos momentos em que eu participo de alguma coisa assim, mesmo em rodas de conversa ou encontros, a quantidade de mulher foda com história diferente que a gente encontra, é muito legal. Não é surpreendente, mas é muito legal.
É legal porque a gente compartilha experiências. A nossa relação com o corpo está sendo construída todos dias e eu enxergo as mudanças. Eu vejo o quanto aceitar as coisas que sempre foram apontadas pelos outros, e muitas vezes por mim, como defeitos, fez com que um brilho aparecesse. Mas é um processo. Eu preciso brigar constantemente com uma pessoinha aqui dentro de mim, que fica dizendo: “Pára, tá se achando, não é assim.”
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Eu tento não dar ouvidos porque eu me inspirei em outras minas que estavam aparecendo com esse brilho. Foi por ver essas minas assim que eu comecei a me libertar de várias coisas
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Se isso servir pra uma mina botar um top e uma hot pant, ou uma roupa mais curta do que a sociedade diz que ela pode usar, já é muito maravilhoso. Hoje eu uso roupas que eu jamais pensei em usar, eu me porto de uma maneira que jamais imaginei que poderia e eu ainda acho que tem um absurdo de coisas pra (des)construir.
No mês de junho eu passei duas semanas produzindo uma série de reportagens para falar sobre um tema que respeito muito: segurança pública. O desafio era mapear os principais problemas de segurança do estado mais rico da federação e lançar para os postulantes ao Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista.
Passei um dia inteiro lendo, relendo matérias, teses, artigos, conversando com especialistas da área até, enfim, delimitar cinco temas (correspondentes a cada um dos dias da semana). Passei outro dia inteiro digerindo a ideia de contar cada um deles em apenas três minutos e 30 segundos. É, amigos…rádio não é mais um latifúndio. Em tempos de 140 caracteres, quem tem três minutos é rei.
O resultado foi bom. Na exata semana em que a matéria foi ao ar, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública lançou seu anuário mostrando problemas, justamente, nas áreas que eu tinha selecionado. No dia da estréia a Ouvidoria das Polícias de São Paulo divulgou um relatório enfatizando os métodos bastante questionáveis da PM paulista.
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O primeiro capítulo foi ao ar falando sobre os desafios para frear a letalidade da polícia que mata muito. Em 2017, os policiais paulistas (civis e militares) mataram 942 pessoas. Isso. Quase mil pessoas foram mortas em 365 dias.
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Foi um recorde histórico desde 2001 – quando o acompanhamento começou a ser feito – e motivo de luz vermelha até para a Ouvidoria das Polícias. O órgão constatou que em 70% dos casos de morte houve excesso por parte dos policiais.
Para falar dessa história, conheci um grupo de mães que me contou como cada um de seus filhos havia sido morto “em confronto” com policiais. Curiosamente, esses casos não envolviam confronto embora, sim, esses jovens estivessem cometendo crimes na hora que foram mortos. Crimes pelos quais nunca foram julgados, por razões óbvias. Para lidar com a dor sozinhas, sem amparo do estado, elas formaram o Mães em Luto da Leste, um grupo de apoio para encorajar outras mães vítimas da violência policial. A história de cada uma delas renderia uma série inteira.
Eu sabia que a repercussão entre os ouvintes paulistas – paulistanos, em sua maioria – seria negativa. Aqui, no estado mais rico do país, a segregação geográfica (a periferia é, de fato, na periferia) cega ainda mais a percepção dos cidadãos para a violência que acontece lá, depois das marginais. Mas o que me surpreendeu foi a reação bastante legítima de uma colega que me questionou se eu não estava “falando só para a nossa bolha”. Ela adorou a matéria, mas me alertou para o fato de a reportagem “não tocar o coração” dos nossos ouvintes, já que a real preocupação deles era com a “sensação de insegurança” no estado.
Isso me fez pensar muito sobre as bolhas. Será que falar do perigo que representa termos uma polícia altamente letal é falar para um nicho específico? Será que a grande maioria das pessoas entende quando ouvimos especialistas falando em “necessidade de intervenção séria para frear a alta letalidade policial, fruto de uma escolha política, desde os tempos da república velha”
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“As pessoas não querem ouvir do candidato que ele vai investir em políticas públicas de educação para evitar que jovens entrem para o crime”, me disse ela. “Elas querem ouvir da boca do candidato: não vou deixar seu filho virar bandido”, completou.
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E faz todo o sentido. Faz todo o sentido na nossa sociedade pautada pelo medo. O medo de morrer num assalto, o medo de morrer por engano, o medo de ser estuprada, o medo de reagir mal, o medo de sair na rua. A tal sensação de insegurança. Faz todo sentido que isso toque o coração de uma sociedade que tem 29% dos adultos de 15 a 64 anos analfabetos funcionais – o equivalente a cerca de 38 milhões de pessoas. Como esperar que seja feita uma relação complexa de causa e efeito, quando o básico não fica claro.
É aí que está o perigo daqueles (não vou nomear, pois não é preciso) que falam o que o cidadão amedrontado quer ouvir e, por outro lado, daqueles (novamente não falo nomes) que defendem a salvação do mundo através de saraus de poesia e aulas de bambolê.
Pensei muito sobre isso e sobre a nossa real função no jornalismo, na comunicação. Será que estamos falando para bolhas? Esse medo exagerado também não é, de certa forma, fruto do viés que escolhemos para tratar da criminalidade? Fruto do estereótipo do criminoso? Do desespero por achar culpados? Não seria essa sensação se insegurança também uma bolha?
No final dos cinco capítulos eu me questionei mais do que quando comecei a empreitada. Por estar fora da lida diária da reportagem há um tempinho, isso mexeu comigo, especialmente. Mas acho que fiz a coisa certa. Não estamos aqui só para criar conteúdo sob demanda. É preciso causar desconforto. Nem que seja em nós mesmos, nas nossas convicções.
Para entender, sugiro a audição da série de reportagens
No início da semana, decidi fazer uma drenagem linfática. Estava inchada e desconfortável. Tinha exagerado no final de semana – muita comida e muita bebida – e tinha exagerado nas semanas anteriores. O resultado era visível no meu corpo. Eu precisava murchar. Chegando ao centro estético, a Lisiane Garroni, massoterapeuta, perguntou o que me incomodava. Eu respondi: tudo.
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Eu respondi que tudo no meu corpo me incomodava. Tudo.
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Corrigi imediatamente, mostrando as áreas de maior retenção de líquido, mas não tinha como esconder que eu falei que tudo me incomodava a respeito do meu corpo com uma velocidade impressionante, sem nem pestanejar. Ela terminou a drenagem e o efeito foi impressionante, eu estava menor, mais à vontade, mais confortável. Eu realmente precisava daquilo. Mas saí de lá pensando se eu realmente detestava tudo a respeito do meu corpo.
Fui pra casa e fiquei pensando nisso. Olhei meu corpo no espelho e analisei cada detalhe. Cada celulite, cada estria, cada pelinho. A papada, os cravos e espinhas, as dobras e os pneuzinhos. Os pés chatos, as mãos gordinhas. O nariz batatinha, o cabelo arrepiado. O braço grande de polenteira, Tudo.
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Ali, parada e analisando todo o meu corpo, lembrei de todas as vezes em que me senti feia ou inadequada e as tantas vezes em que chorei por isso e fiquei chocada
Voltei pra quanto eu tinha 13 anos
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Desde os 13 anos eu sinto a pressão de não ser magra. Desde os 13 anos eu entro e saio de dietas. Desde os 13 anos eu comparo o meu corpo ao de outras meninas e mulheres. Desde os 13 anos eu me torturo psicologicamente para caber em um estereótipo que não é meu e que eu não quero.
Eu tinha 14 anos na foto da esquerda, em que estou com minhas amadas amigas de infância – e de até hoje. Me sentia horrível. Hoje, olho pra essa foto e amo cada detalhe. Na foto da direita, estava em uma viagem que fiz com meus pais. Eu lembro que me sentia enormeeee naquela época.
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Há 17 anos eu me sinto feia e inadequada, mas eu me recuso a seguir vivendo dessa forma
Ali, parada e analisando todo o meu corpo, lembrei de todas as vezes em que me senti feia ou inadequada e as tantas vezes em que chorei por isso e decidi que não mais
Hoje, eu resolvi me amar
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Fiz 30 anos em fevereiro. Chega. Não vou mais me martirizar por algo que sequer é um problema. Estou em processo de reeducação alimentar, comecei a fazer yoga, tento controlar meu peso e, eventualmente, faço procedimentos estéticos. Continuo reclamando da papada, do braço, da celulite e outras coisas. Mas agora eu também me acho bonita e não vou me sentir mal por isso.
Qual minha desculpa? Nenhuma. Eu faço o que quero e não faço o que não quero. Eu estou bem e quero continuar assim. Fazendo as coisas que gosto, comendo as coisas que gosto e, ao mesmo tempo, cuidando da saúde do meu corpo e, principalmente, da minha saúde mental. Hoje, eu resolvi me amar. E é muito bom – finalmente – dizer isso.
Nessa reminiscência, fui catar fotos da criança feliz – e gordinha – que eu era. Saca só as curvas da fofura =)
*Artigo publicado originalmente no site Coletiva.net
Eu estava apenas curtindo a água fria da piscina em um dia de verão na Califórnia. Na época, vivia nos Estados Unidos para aperfeiçoar a minha pesquisa de doutorado e resolvi nadar para descansar um pouco, oxigenar as ideias. Era um centro de lazer comunitário, ou seja, eu não estava sozinha. Havia também um senhor idoso, pesado, nadando com dificuldade ao som de música clássica.
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Eu estava apenas curtindo a água. Até que ele resolveu interagir
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Entre perguntar o meu nome e discorrer sobre o Brasil, era inevitável que indagasse sobre qual era minha profissão. Respondi que era jornalista com o orgulho do ofício que me é peculiar e ele fez uma cara horrível. “Não sabia que vocês ainda existiam”, disse em tom de deboche.
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Desabei. Eu queria apenas curtir a água
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Na primeira menção às famigeradas “fake news”, tive a impressão de ver um holograma de Trump sobrevoando a cabeça calva do homem cujo nome eu, estranhamente, esqueci. “TODAS as notícias são falsas, todas”, disse ele, que ocupou os minutos seguintes com um discurso sobre como a mídia é manipuladora, como há jornalistas desonestos, como a qualidade do jornalismo caiu.
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Eu digeri tudo em silêncio parcial, falando eventualmente para tentar salvar a pouca dignidade que ele concedia a mim e aos meus colegas. Em vão. Ele não estava interessado.
E eu queria apenas curtir a água
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Eu fui embora, mas as palavras inflamadas ficaram comigo. Eu não conseguia deixar de pensar na porção de razão que aquele homem tinha. Teorias da conspiração à parte, já não posso negar que o jornalismo tem falhado. E a sociedade sabe disso. Somos cobaias em um momento extraordinário da história, um período definido por intensa polarização política e social e pelo impacto sem precedentes de novas tecnologias. O debate na esfera pública mudou dramaticamente nos últimos anos e as empresas de jornalismo tentam, ao máximo, se adaptar a isso. Mas será suficiente? Basta tentar? Basta a adaptação? Acredito que não. As circunstancias em que apuramos, produzimos e reportamos uma informação mudaram o suficiente para forçar a revisão do que estamos fazendo e por que.
O modelo comercial adotado pelas grandes empresas está em decadência. É cada vez menos eficaz o formato em que se vendem anúncios estáticos para financiar o trabalho jornalístico. O novo padrão, que surge com os anúncios no Facebook, Twitter e Instagram, também está entrando em colapso. Ao contrário da cada vez mais procurada permuta com o digital influencer. Como resultado, a produção digital está cada vez mais vazia. A caça aos cliques completa a crise, com a necessidade de um fluxo de publicação frenético. A demanda por muita informação gerou, ironicamente, o esvaziamento das noticias.
. O jornalismo foi substituído por “conteúdo”
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Os leitores estão sobrecarregados pela quantidade de informação despejada todos os dias por diversos canais, portais e redes sociais; estão incomodados com posts patrocinados enfiados goela abaixo; estão confusos com o que é verdade e o que é mentira. Por isso, mais do que nunca, é fundamental redefinir a missão e viabilidade do jornalismo, qual o propósito do trabalho e que papel exercemos em uma sociedade que não considera nosso ofício importante. Precisamos reaproximar o público, recuperar a confiança das pessoas. Precisamos contar histórias com cuidado, precisamos dedicar tempo à apuração.
Precisamos checar os fatos, precisamos de compromisso com a informação, precisamos reforçar o comprometimento com a realidade.
Há um ano, meu sócio, Emerson Zapata, e eu criamos o Vós, justamente para tentar restabelecer esse diálogo. O caminho ainda é muito longo, mas estamos satisfeitos com o primeiro passo e prontos para ampliar essa conversa. É tempo de o jornalismo se posicionar, e nós temos lado. Não é um posicionamento a priori, mas uma atitude progressista construída em consonância com a realidade social da qual fazemos parte. Assim, optamos pela transparência, conceito que se tornou turvo pela suposta neutralidade oferecida por grandes conglomerados.
Em tempos em que as notícias falsas invadem as telas, jornalismo é resistência por essência, e o Vós quer fazer parte da reconstrução do propósito do jornalismo na sociedade. Não quero mais só curtir a água.