Geórgia Santos

Sobre o BBB17 e a normalização da brutalidade

Geórgia Santos
10 de abril de 2017

Vamos lá, podem me chamar de esquerdopatafeminazi ou de alguma outra atrocidade delirante, mas dedo na cara não é a norma e hematoma não é marca de amor. O que aconteceu no BBB17 é a normalização da brutalidade.

Nesta semana, um dos assuntos mais comentados no país foi a agressão protagonizada por Marcos Harter durante o Big Brother Brasil. Na cena assistida por milhões de pessoas, o médico é flagrado agredindo sua namorada, Emily, verbal e fisicamente. Visivemelmente agressivo e descontrolado, ele aponta o dedo para o rosto da companheira de casa, aperta o braço e belisca a jovem de maneira bruta. Eu não acompanho o programa mas, segundo informações de quem o faz, existia um padrão de constrangimento que vinha se perpetuando entre o casal.

Por bem, após analisar as imagens e, segundo Tiago Leifert, “ouvir especialistas”, a Globo decidiu expulsar Marcos do programa. A polícia foi até a casa do BBB e tomou depoimento de todos os envolvidos no caso. Ficou comprovada a agressão.

Agora veja bem, não sou eu, não é uma esquerdopatafeminazi, não é uma louca mentirosa que está dizendo. A polícia confirmou a agressão.

     Dito isso, acho que algumas coisas precisam ser discutidas:

  1. O que é agressão?

Segundo relatos da imprensa, Emily ficou bastante impactada com a decisão e tentou justificar a ação de Marcos, afirmando que ele “estava muito nervoso”. Após a saída, ela repetiu que sabia que ele jamais tinha a intenção de machucá-la. Na mesma linha, inúmeros telespectadores ficaram consternados com a saída do “brother”, afirmando que não houve agressão e que aquilo não passava de uma discussão normal de marido e mulher e que as pessoas (leia-se feministas) estavam exagerando e que ela também era culpada.

Não, amigos e amigas. Não é normal.

Isso apenas mostra o tamanho da nossa ignorância com relação ao que é aceitável em um relacionamento, seja amoroso ou não. Não precisa de tapa na cara ou um chute para se configurar agressão, que pode ser física (e aqui se inclui a sexual) ou psicológica.

Nesse caso, houve violência física, comprovada pelos hematomas deixados no braço da vítima após ela ser apertada e beliscada; e violência psicológica, que inclui constrangimento, humilhação e manipulação, insultos, entre outras coisas. Todas observadas na imagem quando ela foi praticamente “embretada” em um canto como se fosse um animal assustado.

Então, não, não é uma briga normal de casal. E se tu vês isso com naturalidade, eu sugiro que procure ajuda, sendo homem ou mulher.

  1. Qual o limite?

Nós já definimos agressão, mesmo que superficialmente, então talvez essa pergunta pareça relativamente mais fácil de responder. Mas não é. O limite dentro de um relacionamento abusivo pode ser uma linha bastante borrada e difícil de identificar. Quando Emily tentou defender o agressor, uma das colegas de casa replicou “Talvez tu gostasse tanto dele que tu não estivesse enxergando”, disse a advogada Vivian sobre o nível da agressão. Ou seja, o limite não estava claro.

Aparentemente, nem para a TV Globo, que não considerou as imagens perturbadoras o suficiente para caracterizar como agressão. Precisou esperar a polícia.

O lance é que nós vivemos em uma sociedade machista – e o fato de tantas pessoas acharem aquela briga normal prova isso – e o discurso vigente torna essa tarefa mais difícil. Mas É possível identificar alguns sinais e entender o limite que não deve ser cruzado.

O movimento Mexeu com uma, mexeu com todas produziu um material bastante elucidativo e que pode ajudar muita gente.

É fácil encontrar justificativas para a agressividade em uma sociedade em que a brutalidade é normalizada, mas elas são todas vãs. Então, não permita que nenhuma dessas coisas aconteça a você ou a alguém que você conheça.

ECOO

Três hábitos simples e sustentáveis para adotar no trabalho

Geórgia Santos
9 de abril de 2017

Levar uma vida verde não é fácil, já entendi. Mas isso não significa que tudo seja difícil. A seguir, veja 3 hábitos simples e sustentáveis para adotar no trabalho – e em casa. Acredite, já é um passo enooooorme.

1 – Adote uma caneca

Fala aí, tu passas o dia inteiro tomando café pra conseguir chegar ao final de um dia de trabalho, né? Começa por aí. Em vez de utilizar copos de papel, plástico ou isopor a cada cafezinho, adote uma caneca. Beba café o dia inteiro em uma caneca só tua, é até mais gostoso.

2 – Use talheres de verdade

Cada vez mais as pessoas levam o almoço de casa em vez de almoçar fora, certo? Seja por economia ou pra manter a forma. Sem contar as telentregas que nos economizam um tempão. Aproveita essa onda e abandona os talheres descartáveis. Usar garfo e faca reutilizáveis deixam o almoço mais agradável e o planeta agradece.

3 – Utilize guardanapos de tecido

Essa é uma mudança mais radical, mas é tão simples quanto as outras duas e pode ser adotada em casa. Basta substituir os guardanapos de papel por guardanapos de pano. É mais barato, limpa melhor e, no trabalho, ainda serve de toalhinha. “Ah, mas tem que lavar!” E daí? Por acaso tu usas roupas de papel pra não ter que lavar?

E aí, vai aderir? =)

Guia de Viagem

Cartagena 2 – As praias e os sicários

Geórgia Santos
8 de abril de 2017

Já falei aqui sobre as maravilhas de Cartagena, uma das cidades mais belas e procuradas da Colômbia. Só tem um probleminha: as praias são decepcionantes. Uma vibe meio litoral gaúcho – com todo o respeito que tenho pelo litoral gaúcho. O mar é escuro, bastante agitado, areia estranha, enfim, não são praias bonitas. Mas há opções belíssimas no entorno: a Playa Blanca Baru e o Arquipelago de Rosario. E mesmo parecendo duas lombrigas pálidas que fogem do sol, Cléber e eu não perdemos a oportunidade e começamos pela Playa Blanca. Mas foi aí que tudo começou a dar errado. Óbvio.

As pessoas podem escolher ir à Playa Blanca de barco ou carro – há uma ponte que liga a ilha ao continente. Nós conversamos com a gerente do hotel em que estávamos e ela disse que se fôssemos por terra teríamos uma experiência exclusiva, digamos assim. Iríamos sozinhos e teríamos atendimento personalizado em vez de viajarmos em um barco atrolhado de gente. E foi o que fizemos. Acontece que o irmão da moça fazia isso eventualmente (ele era mecânico originalmente) e ficou de viajar conosco. Às 7h da manhã estava nos esperando com um carro limpinho, cheiroso, aguinha e umas cumbias no rádio. Muy bueno.

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“Após uma hora e alguma coisa de viagem, avistamos um grupo de oito motoqueiros parados em uma encruzilhada”

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Aos poucos fomos nos afastando de Cartagena e indo em direção a um local bastante remoto, digamos assim. Estrada de chão batido, casebres, raras pessoas no entorno e coisa e tal. Após uma hora e alguma coisa de viagem, avistamos um grupo de oito motoqueiros parados em uma encruzilhada. Todos encostados em suas motos, como se esperassem algo acontecer. Ou alguém aparecer.

Não seguimos adiante, viramos à direita. Foi a deixa para os rapazes simpáticos montarem em suas motos e acelerarem na direção do carro. Conforme avançávamos pela via estreita e coberta pelo mato, eles se aproximavam. Até que nos cercaram. Dois ultrapassaram o carro e guiavam o caminho; quatro avançavam ao nosso lado na mesma velocidade como um pequeno comboio; Outros dois nos seguiam.

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Eram sicários, eu tinha certeza. Seríamos assassinados ali

No meio do nada

Na Colômbia

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Cléber me olhou mais pálido do que o normal, com um semblante ligeiramente apavorado, agarrou minha mão e eu senti que ele havia entendido o que estava acontecendo: estávamos paranoicos de tanto assistir Narcos e El Patrón del Mal. Lógico.

Eram apenas vendedores ambulantes, todos vindos de uma vila de pescadores vizinha, esperando os turistas para achacar. Estávamos entre os primeiros a chegar à praia e, por isso, fomos seguidos. Foi colocar o pé pra fora do carro para começar a oferta de tudo o que se possa imaginar. Até massagem, veja só.

Mas passado o susto, a viagem valeu a pena. Cada minuto de sol, mojito, pescado e mar transparente compensou o medo de morrer. Até voltarmos e o motorista quase nos enfiar embaixo de um carro durante uma ultrapassagem.

 

PLAYA BLANCA

Desculpem pelos pés do Cléber, mas o cenário era esse. E aquele pontinho acima do pé direito sou eu.

Como chegar

O lugar é absoltamente incrível: uma areia branca (rá), mal azulzinho, drinques e espreguiçadeiras. Um ótimo lugar pra passar o dia. Há duas formas de chegar: barco ou carro. Os barcos saem de um porto próximo à Torre do Relógio e tem uma desvantagem: o passeio é em grupo. Ou seja, horário pra sair, pra voltar, almoço no restaurante ao estilo refeitório com bandeja. E uma galera no entorno pra infernizar. Já de carro, que me parece a melhor opção, é uma viagem privada. Os pacotes também incluem uma refeição (pescado, arroz con coco e patacones), a diferença é que o guia entrega o almocinho na espreguiçadeira e a gente finge que é rico. É só falar com a gerência do hotel em que se está hospedado e eles arranjam a viagem, seja de barco ou carro.

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O que fazer

É um dia na praia, sem preocupações e com uma água quentinha. Há, porém, algumas atividades como mergulhos, trilhas e passeios de barco. Nós, como bons preguiçosos, passamos o dia embaixo do guarda-sol, lindamente deitados e ociosos.

Cuidados

A praia é lotadassa de ambulantes. Sério. Nós, brasileiros, estamos relativamente acostumados com isso, mas lá a coisa toma outra proporção. E eles vendem de colares a mariscos. De pulseiras a…. massagens. Sim. Aliás, as minas massagistas já chegam te pegando pra cobrar depois. Eu tava deitadona lá e uma delas chegou me apalpando. Não rolou.

A recomendaçãoo é não comer nada que os ambulantes oferecem e só aceitar massagens das meninas credenciadas. Enquanto descansávamos rolou um barraco entre duas massagistas, foi massa. Rolou até tapa na cara. A nossa deixa pra sair de lá.

ISLA DEL SOL

Como chegar

Nesse caso, o barco é a única alternativa. Também parte da Torre do Relógio, mas é uma viagem bastante longa e é feita em uma espécie de lancha – não conheço barcos. Não vista nada que não possa molhar, porque vai molhar. E guarde qualquer coisa eletrônica, porque vai molhar. Confesso que detestei a viagem, me borrei toda e achei que morreríamos afogados. Mas a gente chegou e voltou e valeu a pena. O pacote inclui um belo almoço tradicional. Esse passeio também pode ser organizado pela gerência do seu hotel.

O que fazer

É uma ilha pequena e faz parte do Arquipelago de Rosario – ou seja, há outras ilhas. Mas também há passeios, trilhas e mergulhos. Nós, novamente, ficamos deitados ao sol sem fazer absolutamente nada. Há mar, piscinas naturais e piscinas artificiais. Cabanas e redes. Ócio pra que te quero…

Cuidados

Nenhum. É uma ilha privada, tudo muito seguro e as únicas pessoas no local são as pessoas com as quais se divide o barco. Mas eu me preocupei muito com os lagartos.

Geórgia Santos

Nosso muro particular – O fim do Ciência Sem Fronteiras

Geórgia Santos
4 de abril de 2017

Passamos horas debatendo o absurdo do muro que Donald Trump pretende construir para separar os Estados Unidos do México. É um tema quase querido, digamos assim, como se de estimação. Mas esquecemos do nosso pequeno muro particular. Não, Michel Temer não pretende empilhar tijolos para isolar o Brasil de qualquer vizinho que seja, mas ele está, sim, se empenhando em construir uma parede invisível que nos afasta do resto do mundo com o fim do Ciência Sem Fronteiras.

“A justificativa é falta de dinheiro, claro, como se fosse explicação para tudo”

No último final de semana foi confirmada a extinção do programa que financiava o intercâmbio de estudantes de graduação brasileiros em outros países. A justificativa é falta de dinheiro, claro, como se fosse explicação para tudo. O governo alega que o programa deixou dívidas (?) e que os alunos beneficiados não deixaram resultados expressivos em suas universidade – e aqui a vontade é de colocar um milhão de pontos de interrogação.

Há tantas perguntas que me faço ao ouvir essas pseudojustificativas. Que dívidas? Com quem? O que são resultados expressivos? Qual seria a resposta adequada dos alunos? Em quanto tempo esses resultados deveriam aparecer? Quais são esses resultados? Dinheiro? Pesquisa? Enfim. Eu passaria o dia todo fazendo perguntas. A questão é que o governo deixa claro que trata a educação como negocio e não como uma ferramenta transformadora de – preste atenção nisso – longo prazo.

Eu tenho relativa experiência com estudo no exterior. Fiz um mestrado em Portugal e agora estou como pesquisadora visitante nos Estados Unidos. Essa jornada começou em 2013, há quatro anos, quando fui uma das escolhidas pelo Instituto Ling para participar do programa Jornalista de Visão, que oferta bolsas de mestrado no exterior. Somente agora começo a devolver um pouco, muito pouco, do que me foi ofertado. Seja por meio da minha pesquisa sobre mídia, protestos e democracia no Brasil ou por meio deste que Vós fala.

O governo quer resultados imediatos? Quer retorno financeiro? Quer pesquisas que comecem e terminem em meses? Bom, isso não existe.

O muro invisível de Temer isola jovens ansiosos e brilhantes. Evita o crescimento que só o diferente pode nos ofertar. Impede que alunos curiosos evoluam fora de sua bolha a menos que tenham condições financeiras para tal – e sabemos que a maioria dos brasileiros não tem.

Digo isso, no entanto: tenha certeza, senhor Doutor Michel Temer, que os “resultados expressivos” aparecerão em alguns anos. O conhecimento daqueles que foram o senhor não pode extinguir.

 

 

 

ECOO

Sim, é difícil ser ecologicamente correta

Geórgia Santos
2 de abril de 2017

Nesta semana eu sofri a minha primeira derrota ecológica desde que iniciei uma jornada para recobrar a consciência ambiental que eu nunca tive. Não pensei que fosse fácil. Ao contrário, sei da dificuldade que envolve ir contra o fluxo. Ainda assim, acho que é a primeira vez que eu digo: é difícil ser ecologicamente correta. Muito difícil.

“Conforme avanço, deparo com obstáculos cada vez maiores”

 

Não me entendam mal, não pretendo desistir. Inclusive fiz progressos importantes ao longo dos meses, especialmente com a rotina da casa e cosméticos, uma jornada que divido com vocês aos poucos. Mas conforme avanço, deparo com obstáculos cada vez maiores e mais frustrantes.

Este post deveria ser sobre minha transiçãoo para um xampu sólido e natural. Ou seja, um produto que não polui, não agride meu corpo e ainda dispensa embalagem. Uma sequencia dos cuidados capilares que venho mostrando aqui com a hidratação e leave-in. Mas não rolou.

No último mês, testei três produtos diferentes e nenhum me deixou satisfeita. E não, não testei só uma vez, testei várias. Cada um deles. Todos deixaram meu cabelo empapado, oleoso e com aspecto de sujo. Fiquei muito frustrada.

Eu resolvi dividir isso com vocês porque parte da minha frustração vem do fato de que a maioria das blogueiras que escrevem sobre o assunto falam maravilhas desses produtos. É verdade que elas falam da dificuldade, mas nenhuma testou três produtos e os três deram resultados péssimos. O lance é que eu parecia um personagem do Mágico de OZ – e não era nem a Dorothy nem o Homem de Lata.

Eu não vou desistir. Fiquei feliz que o terceiro xampu funcionou melhor do que o segundo. Ou seja, houve uma evolução. Ainda preciso descobrir se o produto é ruim, se eu não estou lavando direito ou se não estou removendo o cosmético adequadamente – por isso não vou falar quais as marcas. Nesse meio tempo, encontrei um produto com o mínimo de química possível e tá tudo bem.

Um dia eu consigo.

Vós Ativa

Brasil x Paraguai: “Ô, bicha!”

Colaborador Vós
29 de março de 2017
Divulgação CBF

Por Jonatha Bittencourt, jornalista

Arena Corinthians, 28 de março de 2017. Pouco mais de 40 mil pessoas foram ao estádio para acompanhar mais um clássico do futebol sul-americano: Brasil e Paraguai, jogo válido pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2018, na Rússia.

Dentro de campo: três a zero para a seleção canarinho com direito a classificação para a Copa. Fora dele: mais uma derrota

Perdi as contas de quantas vezes o goleiro paraguaio foi alvo de xingamentos homofóbicos. Saí de lá com o estômago embrulhado. A cada tiro de meta, um “ôôôô…” surgia como se fosse um murmúrio em meio à multidão. O grito ganhava força e, assim que o jogador adversário tocava na bola, um estrondoso “bicha” ecoava pela Arena Corinthians.

Não estou acostumado a ir a jogos de futebol e como estava a passeio em São Paulo pensei que seria uma boa oportunidade para ver pela primeira vez a seleção do meu país entrar em campo. Mas saí com o coração ferido. O relativo bom futebol dentro das quatro linhas do gramado e a estrutura interessante da Arena não serviram para muita coisa, não.

O locutor do estádio usou duas vezes o microfone para recomendar à torcida que não dirigisse ofensas aos jogadores do Paraguai. Nas duas únicas ocasiões, a vaia surgiu como resposta ensurdecedora. Ousei aplaudir, o que deixou algumas pessoas constrangidas ao meu redor.

Na garganta, um grito entalado: “SOU BICHA, MAS NÃO TE DEI O DIREITO DE ME USAR COMO VAIA. VÊ SE ME RESPEITA!”

Afinal de contas, fui equiparado a uma vaia, a um xingamento. Na visão de considerável parte da torcida, classificar o goleiro como “bicha”, um gay, era depreciação.

Todos os dias, apesar das conquistas baseadas em muita luta, lágrimas e sangue, o Brasil perde ao discriminar LGBTs. Estádios de futebol, alguns com maior evidência nesse sentido, continuam sendo um recanto intocado de discriminação. Um lugar para extravasar o ódio com o aval de milhares ao redor.

A criança que assistia calada os coros de “bicha” porque seu pai não gritava junto passou a insultar o goleiro assim que ouviu, bem ao seu lado, alguém muito familiar vaiar o locutor que clamava por respeito. E assim caminha a humanidade. E assim funciona a máquina do preconceito, da dor, da exclusão.

Reporteando

A dúvida é a humanidade da reportagem

Évelin Argenta
22 de março de 2017

A ideia fixa é a morte do jornalismo. Dar o passo e comprovar uma tese é o pior caminho para a reportagem. O exercício da dúvida, o permitir-se titubear é o que ainda nos mantém no rumo certo. É o exercício mais complexo a ser feito em momentos de ideias confortáveis. A dúvida é a humanidade da reportagem.

Depois de alguns anos contando histórias, encontrei uma que não queria contar. pelo menos não do jeito tradicional, desse jeito de rádio que aprendi a fazer quase automaticamente. Sei reconhecer a melhor sonora em poucos minutos. edito, falo no improviso, sei o ponto certo de engatar outra. Assim, em um minuto e meio, resumo o mundo.

Mas essa história não merecia uma sonora. Merecia horas do nosso mundo

Era o juri de um caso complexo, mas sem polêmicas. Não havia polêmica alguma, discordância alguma nas imagens que mostravam três policiais militares assassinando a tiros um homem rendido, sentado no chão, em uma área nobre de São Paulo. O homem era um jovem de 18 anos e tinha roubado uma moto minutos antes. Provavelmente nem estaria naquele bairro cheio de condomínios fechados se não fosse a circunstância. Foi perseguido, entregou-se e morreu. Assim, às duas da tarde de um feriado de independência. O caso veio à tona dias depois, quando as imagens das câmeras de segurança de uma dessas ilhas de sossego chegaram à imprensa. Nem o noticiário sangrento e gritado dos fins de tarde apedrejou “os bandidos” e, quase dois anos depois, veio o dia do veredicto.

O julgamento

No tribunal, os três Policiais em nada lembravam aqueles das imagens. Em suas fardas, tinham passos certos, quase ensaiados e um desfecho pronto. Em frente ao júri eram a imagem do achaque. “Sim senhor.” “Não senhor”. “Não fiz isso, não, senhor”. Eram jovens também. O mais velho não passava dos 30. Nossos olhares nunca se cruzaram. Eu olhava pra eles e eles olhavam pro chão.

Enquanto defesa e acusação se enfrentavam numa espécie de festival de atuação, eu olhava para eles e buscava a humanidade que eu não queria encontrar. Eu queria que fossem condenados. Que pagassem pelo crime que cometeram. Eles não deveriam despertar em mim qualquer traço de piedade. “Mataram um homem sem chance de defesa” era o que dizia o promotor. “A sonora perfeita”, meu espírito de rádio. Mas eles precisavam ser julgados. Precisavam ter a chance da defesa.

Os advogados

Ao lado deles, cinco dos melhores advogados de São Paulo. Um deles, conhecido por defender Policiais Militares e conseguir bons resultados. Uma das únicas derrotas foi o caso Carandiru, que teve o julgamento anulado recentemente. Não teve nenhuma grande derrota, então.

O júri

Os jurados, cinco homens e duas mulheres, olhavam atentamente para os gestos daquele homem que esvoaçava a toga preta aberta. Parecia um corvo, curvo. Gritava o mantra dos tempos obscuros. A cada “bandido bom é bandido morto”, me contorcia na cadeira, sempre sob o olhar de um policial militar que fazia a segurança do fórum. Levantei duas vezes durante as oito horas de debate para passar informações à redação. Do outro lado da linha, pouco importava o embate. Queriam a sentença. Aceitei a minha.

Não atendi a alguns telefonemas que mostravam no visor “Estúdio do Ar”. Se era a sentença o interesse, não podia resumir o mundo todo naqueles “você tem quarenta segundos, flor!”. Como não podia usar o celular no tribunal, me dediquei como a uma aula de história. Maldita tecnologia que me tirou a mania de andar com cadernos e canetas marca texto!

O processo

Sem o peso da ansiedade das sonoras, resolvi ouvir com atenção a todos os argumentos dos advogados, que alegavam legítima defesa dos policiais. Sim, eles estavam se defendendo de um homem rendido, sentado no chão e sem camisa. E se estivessem? Me permiti fazer essa pergunta em silêncio. E se aqueles homens, que ganham pouco e não têm preparo algum para a rua tivessem, realmente, se assustado com um movimento brusco do suspeito (como dizia o advogado) e tivessem atirado por reflexo? Então talvez o réu devesse ser outro. Quem deveria responder pela morte do jovem?

O promotor também prendeu minha atenção quando perguntou o que diferenciava aqueles homens “da lei” dos homens “fora da lei”, que matam “por susto” em latrocínios? O que transformava os últimos em bandidos bons e mortos e os primeiros em heróis condecorados? Por que a vida de uns vale menos que uma moto?

A sentença

Foram mais de duas horas de sala secreta, quando os jurados se reúnem para determinar a sentença. Na sala de imprensa a opinião era quase unânime: “Vão ser absolvidos”. O que nos levava a tal conclusão era um vídeo exibido pela defesa nos 10 minutos finais, com imagens de policiais sendo rendidos e mortos por “bandidos maus e vivos”. Cada imagem era narrada aos gritos pelo advogado. Ex-policial, engasgou o pedido de absolvição num início de choro.

Na leitura da sentença, todos os textos prontos, com alguns espaços para trocar as palavras “absolvidos” por “condenados”. Lacunas vazias esperando os anos de pena, caso a segunda alternativa se comprovasse.

A juíza, terceira mulher no meio de tantos homens julgadores, decidiu que a diferença entre os policiais e o ladrão de moto é tudo o que separa os dois mundos. Os homens da lei não tinham aquele passo ensaiado por acaso. Ele era ensaiado, de fato. Sabiam usar as permissões da lei a seu favor. O ladrão de moto não tinha nada por si.

Homicídio simples para um dos PMs. Doze anos e cinco meses. Bem menos que os 26 que a acusação queria, com todos os agravantes. Absolvição para os outros dois.

Vitoria da defesa. Satisfação da promotoria.

Voos Literários

Leitura para crianças – Investimento Certo Para O Futuro

Flávia Cunha
21 de março de 2017

Vivemos tempos estranhos no cenário sociopolítico brasileiro e mundial, mas sigo firme na convicção que se tem algo que vai mudar o mundo e garantir seres humanos melhores e mais íntegros, é o incentivo à leitura na infância. Eu já falei um pouco sobre o assunto aqui, mas resolvi fazer outro texto com sugestões de obras literárias para os pequenos escritas e publicadas no Brasil. Um pouco para tentar estimular a procura por livros nacionais, em tempos de exaustiva exposição das crianças a produtos derivados de franquias vindas de filmes hollywoodianos (entre eles, livros). Mas também porque as reminiscências me remetem a momentos muito únicos lendo livros brazucas. 

Clássicos infantis (Mas Que Seguem Atuais)

Monteiro Lobato: Tenho ressalvas na questão racial à obra do escritor, considerado o pai da Literatura Infantil Brasileira. (No aniversário de Lobato, 18 de abril, é comemorado o DIa Nacional do Livro Infantil). A figura da Tia Nastácia certamente é marcada pelo preconceito racial, ainda mais gritante do que hoje em dia lá em 1931, quando foi lançado o primeiro livro da turma do Sìtio do Pica-Pau Amarelo. Apesar disso, Reinações de Narizinho ainda merece meu respeito pela forma libertária de apresentar as personagens femininas: Dona Benta, a avó sábia e independente, Narizinho, a menina que sobe em árvores e desvenda o mundo de igual para igual com o primo Pedrinho, e, claro, a atrevida e desbocada Emília. Provavelmente foi depois de conhecer as aventuras dessa boneca de pano atrevida que comecei a questionar a autoridade dos adultos.

Bônus: Menino Maluquinho, do Ziraldo, Marcelo Marmelo Martelo, da Ruth Rocha, e Pluft, o Fantasminha, de Maria Clara Machado.

Autores Para Adultos Que Também Têm Obras Para Crianças

Érico Verissimo: No total, o escritor consagrado por obras como O Tempo e O Vento e Olhai Os Lírios no Campo, escreveu seis livros para o público infantil. Meu preferido é O Urso com Música na Barriga, uma história encantadora de como tratar com as diferenças. Um dos livros virou filme: As Aventuras do Avião Vermelho.

Bônus: O Mistério do Coelho Pensante e A Mulher Que Matou os Peixes, de Clarice Lispector, As Gêmeas de Moscou, de Luis Fernando Verissimo.

Para Crianças Moderninhas (Com Famílias Que Querem Estimular Esse Lado Libertário)

Por Meio da Música: A coleção Rock Para Pequenos, foi idealizada pelos donos da editora independente brasileira Ideal. O casal Felipe Gasnier e Maria Maier convidaram a escritora Laura D. Macoriello para selecionar os “personagens” dos três volumes e o designer Lucas Dutra para ilustrar os três livros. De Chuck Berry a Rita Lee, as obras buscam agradar roqueirinhos e roqueirões.

Pela igualdade de gênero: A escritora e ilustradora Pri Ferrari criou o livro Coisa de Menina, onde questiona os padrões de comportamentos impostos às crianças de ambos os sexos.  “Por que ainda dizem por aí que certas coisas não são apropriadas para as mulheres”, questiona a autora na apresentação da obra.

ECOO

Gel de linhaça – Cachos perfeitos

Geórgia Santos
19 de março de 2017

Nessa vibe de ser ecologicamente correta, a gente enfrenta algumas dificuldades e complicações. É uma vida toda na comodidade de usar os produtinhos que estão na prateleira do supermercado ou da farmácia e era isso. Agora, surge o gel de linhaça.

Não serei ingrata, os cosméticos tradicionais me salvaram a vida. Quando eu era criança e adolescente, não tinha esse lance de creme para pentear, modeladores de cachos e muito menos os leave-in. Fala sério, no máximo um Neutrox amarelinho. Ou seja, se já não tinha finalizador tradicional, imagina se eu ia ter acesso aos que não prejudicam o ambiente e a saúde. Eu nem sabia que existiam. Mas isso mudou.

Há uns meses, descobri o melhor finalizador DA VIDA para os cabelos, especialmente para cabelos ondulados, cacheados ou crespos: o gel de linhaça. Ele deixa o cabelo macio, sedoso e modelado ao mesmo tempo. Os cachos ficam lindos, leves e soltos. E tem INÚMERAS vantagens

É natural;

Fácil de fazer;

Barato;

Saboroso;

Light;

Hein? Mas é de passar no cabelo ou de comer? Os dois!

MODELADOR DE CACHOS – QUE, DE QUEBRA, DÁ PRA COMER

 

Ingredientes

½ xícara de linhaça dourada

2 xícaras de água

folhas de gaze

1 pote de vidro

Modo de fazer

  • Misture a linhaça e a água em uma panela, leve ao fogo e mexa até que forme um gel;

  • Coe o gel com a gaze, espremendo até que o gel saia limpo;
  • Acondicione em um pote de vidro e guarde na geladeira;

Se quiser potencializar o efeito, pode misturar com babosa, especialmente se o seu cabelo for O produto dura cerca de um mês na geladeira, mas além de passar no cabelo, ele pode virar uma geleia light e delicinha. É só misturar o gel com uma xícara de purê de qualquer (prefiro de morangos) fruta e passar no pão. Super nutritivo, docinho, gostoso e light. Nham =)

Tão série

Mês das Mulheres – The Good Wife

Geórgia Santos
18 de março de 2017

 

O nome não parece ter a ver com empoderamento feminino, afinal, a premissa da “boa esposa” é herança da sociedade machista. Mas The Good Wife é o oposto disso. Ao longo de sete temporadas, a advogada Alicia Florrick (Julianna Margulies) se afasta daquilo que todos esperam dela: o estereótipo de bela, recatada e do lar.

Evolução da “boa esposa”

No primeiro episódio da primeira temporada, vemos uma Alicia pálida, mal vestida e com cara de dona de casa suburbana. Vemos uma esposa humilhada enquanto fica ao lado do marido, o procurador-geral que teve um caso com outra mulher e se envolveu em um escândalo de corrupção. Isso faz com que ela precise/queira mudar sua vida: ela volta a advogar e toma as rédeas da própria vida. Encontra um antigo amor dos tempos de faculdade, começa a trabalhar no escritório do bonitão e está armada a cama. Só precisamos deitar.

A trama tem tudo que a gente precisa pra não desgrudar os olhos da televisão: crimes, política, intrigas, sexo, affairs, mentiras, traições, mais crimes, mais intrigas e mais crimes. E sexo. E mentiras. E mais traições.

 

Com o passar do tempo, Alicia e a série amadurecem o suficiente para que fiquemos viciados na história dessa mulher poderosa que é uma mãe-dona-de-casa-que-trabalha-fora-e-é-casada-mas-não-é-e-ama-dois-caras-ao-mesmo-tempo-mas-não-tem-certeza-e-está-crescendo-profissionalmente-mas-talvez-não-saiba-lidar-bem-com-isso-ou-saiba. Ufa. Eu sei que ficou grande, mas na série também é assim, tudo ao mesmo tempo agora.

Mulheres poderosas

E não é somente Alicia. Temos Diane Lockhart (Christine Baranski), uma advogada fodona e Democrata até a alma, constantemente lutando contra os conservadores e pelos direitos da mulher, como regularização do aborto. Temos Kalinda Sharma (Archie Panjabi), uma mulher misteriosa e independente que não deixa que ninguém diga como viver a vida.

Então, se tu ainda não viu, corre pra assistir The Good Wife. A série está disponível no Netflix e vale cada clicada. É uma história de empoderamento e emancipação, uma história crua e real sobre os degraus que a mulher precisa subir ou escalar para conseguir ser vista. Eu não vou dar spoiler, mas se tu não te importa com isso, dá uma olhada neste texto da Time sobre o último episódio da série e entenda a evolução de uma personagem que estava em busca de si.

A série acabou, mas o nosso amor, não. Dá uma olhada no recap da primeira temporada e me diz se não é de viciar?