Todo Dia Oito #3 Olga, a revolucionária que jamais perdeu a ternura
Geórgia Santos
8 de maio de 2021
Todo dia Oito. Todo dia oito, uma história. Todo dia oito, uma mulher
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No terceiro episódio do podcast, Olga, a revolucionária que jamais perdeu a ternura. Ou, na letra batida a máquina dos arquivos da Gestapo, a polícia secreta do Terceiro Reich,uma mulher plenamente judia. Uma comunista ousada e astuta. Uma comunista convicta que casou com Luis Carlos Prestes e foi entregue a Adolf Hitler. Olga Benário poderia ter sido apenas uma alemã que viveu no Brasil.Mas quando Getúlio Vargas a expulsa daqui, ela se torna nossa.
Cantinho da Leitura #4 Política também pode ser coisa de criança
Geórgia Santos
26 de fevereiro de 2021
No quarto episódio do podcast Cantinho da Leitura, política também pode ser coisa de criança. A jornalista Geórgia Santos conversa com Flávia Cunha, jornalista, mestre em Literatura pela UFRGS, produtora editorial de livros infantojuvenis e colunista do Vós.
A política está em todos os lugares. E o tema é cada vez mais comum nas conversas dos adultos, principalmente depois da eleição de 2018 e da polarização decorrente. As crianças ficam por perto e começam a fazer perguntas. Como explicar o que faz um presidente? O que é democracia? O que é comunismo? Pois a literatura infantil pode ajudar nessa missão.
Há quase 60 anos, em 12 de dezembro de 1962, Patrícia Galvão, a Pagu, partia desse plano. Porém, seu legado permanece, tanto suas obras literárias como pela sua trajetória marcada por posturas arrojadas e corajosas. Destacarei 10 momentos em que essa escritora, nascida em 1910, demonstrou a grandiosidade de sua personalidade, que a levou a ser pioneira em diversas áreas.
Estilo à frente do seu tempo – No auge de seus 20 anos, Patrícia Galvão chamava a atenção pelas roupa ousadas, maquiagem acentuada e cabelo arrepiado. Ela era apenas uma estudante nessa época, mas já destacava-se das mulheres de sua geração por usar minissaia e roupas com transparências. Além disso, fumava e falava palavrões. Foi nessa época que ganhou o apelido de Pagu, por um equívoco do poeta modernista Raul Bopp, que achava que seu sobrenome era Goulart.
Abandona a imagem de musa do modernismo e torna-se ativista política – Muito jovem, Pagu torna-se uma protegida dos modernistas Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade. Virou uma espécie de musa inspiradora do movimento modernista. Até que Oswald separa-se de Tarsila para ficar com Pagu, um escândalo na tradicional sociedade paulistana. Porém, ao invés de acomodar-se na situação de mulher casada com um escritor famoso, ela encontra no ativismo político um ideal de vida e acaba levando Oswald a também interessar-se pelo comunismo
Viveu um relacionamento aberto com Oswald de Andrade – O casamento com Oswald, que durou até 1935, é marcado pela sinceridade completa, em que a infidelidade é tolerada. Porém, quando Pagu engravida do primeiro filho, precisa lidar com os relatos de Oswald sobre as relações com outras mulheres. Ela revela seu sofrimento a respeito da situação no livro Paixão Pagu (A autobiografia precoce de Patricia Galvão) , um romance epistolar dirigido a seu segundo marido, o escritor Geraldo Ferraz. Casou-se com Ferraz em 1941 e ficou com ele até sua morte, em uma relação marcada pela cumplicidade e confiança. Juntos, escreveram, em 1945, o romanceA Famosa Revista, uma crítica ao Partido Comunista, com o qual ambos haviam rompido.
Vira operária por convicções ideológicas – As ideias marxistas tornam-se uma convicção tão profunda em Pagu, que ela resolve abandonar a área literária e tornar-se uma proletária no sentido estrito da palavra. Entre outros empregos, foi operária em duas fábricas
É considerada a primeira presa política do Brasil republicano – Sua prisão ocorreu em 1931, durante um comício com trabalhadores na Praça da República. Antes de sua prisão, amparou nos braços o estivador negro Herculano de Souza, morto devido à repressão policial. Esse incidente é citado por Rita Lee na letra da música “Pagu”, no verso “Sou Pagu indignada no palanque”. Ao longo de sua vida, Pagu foi presa 23 vezes devido às suas ligações com o comunismo
Publicou o primeiro romance proletário brasileiro – Depois de sua experiência como operária, Pagu escreve Parque Industrial, publicado sob o pseudônimo de Mara Lobo. O romance não agradou o Partido Comunista, que o considerou “pornográfico e feminista”.
É considerada a primeira mulher cartunista do país – Na década de 1930, publicou no jornal O Homem do Povo, de Oswald de Andrade, as tirinhas Malakabeça, Fanika e Kabeluda. Ela criava os desenhos e os argumentos, de conteúdo subversivo e feminista.
É jornalista em plena década de 1940 – Pagu sobreviveu durante grande parte de sua vida como jornalista, tendo dedicado-se de forma mais sistemática a publicações na imprensa a partir da década de 1940. Vale lembrar que, nessa época, a maior parte das mulheres era dona de casa e poucas dedicavam-se a profissões dominadas por homens, como era o jornalismo nesse período. Sua obra jornalística está sendo estudada na Universidade de Yale e deve ser publicada em formato de livro, conforme informações divulgadas em seu site oficial.
Primeira escritora brasileira a publicar literatura policial – Sob o pseudônimo de King Shelter, publicou contos policiais na década de 1940. Outra área predominantemente masculina que Pagu adentrou sem pudores. Seus contos policiais, publicados originalmente na revista Detective, foram reunidos e lançados, em 1998, no livro Safra Macabra.
Foi candidata a deputada na década de 1950 – Ainda mantendo seu ativismo político mas fora do Partido Comunista, Pagu tenta ser deputada pelo Partido Socialista Brasileiro. Não foi eleita, mas demonstra mais uma vez sua postura feminista, já que em pleno século 21 ainda são poucas as mulheres na política. No Congresso Nacional do século 21 aproximadamente 10% do total de eleitos são mulheres,
Além dos livros citados, usei como referência para balizar esse texto a dissertação de mestrado Um Caminho à Liberdade: O Legado de Pagu, de Sarah Pinto de Holanda, do Programa de Pósgraduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, de 2014.
Mas é isso o que acontece. Uma vez encerrada a tragédia humana, cabe aos jornalistas banalizarem-na para convertê-la em entretenimento. Talvez porque todo aquele frenesi irracional tenha arrombado a porta da nossa casa e nenhum detalhe maledicente e distorcido dos jornais deixasse de chamar a minha atenção, acabei considerando a era McCarthy o início do triunfo da fofoca no pósguerra, a fofoca que se estabeleceu como o credo unificador da mais antiga república democrática do mundo. Na Fofoca Nós Acreditamos. Fofoca como o evangelho, a religião nacional. O macarthismo como o início da conversão não só da política séria mas de tudo o que é sério em entretenimento para distrair a massa. O macarthismo como a primeira florescência do vazio mental americano que agora está por toda parte.
O negócio de McCarthy, na verdade, nunca foi a perseguição de comunistas; se ninguém sabia, disse, ele sabia. A virtude dos julgamentos espetáculo da cruzada patriótica de McCarthy era simplesmente a sua forma teatralizada. Ter câmeras voltadas para aquilo apenas lhe conferia a falsa autenticidade da vida real. McCarthy compreendeu melhor do que qualquer político americano anterior a ele que as pessoas cujo trabalho era legislar podiam fazer muito mais em benefício de si mesmas se representassem um espetáculo; McCarthy compreendeu o valor de entretenimento da desgraça e aprendeu como alimentar as delícias da paranóia. Ele nos levou de volta a nossas origens, de volta ao século XVII e a nossos antepassados. Foi assim que o país começou: a desgraça moral como entretenimento público. McCarthy era um empresário dos espetáculos e, quanto mais desvairados os pontos de vista, tanto mais ofensivas as acusações, maior a desorientação e melhor a diversão para todo mundo. Os livres e corajosos de Joe McCarthy, este era o espetáculo em que meu irmão ia representar o papel mais importante da sua vida.”
Vocês me desculpem a digressão pessoal que farei na coluna de hoje, mas é que o texto o de Philip Roth me inspirou um certo saudosismo, sabem?
Pra começar, posso dizer que bom mesmo era no meu tempo, em que o professor de história falava sobre Guerra Fria, socialismo e comunismo em sala de aula e ninguém acusava-o de ser doutrinador, estava só cumprindo o seu papel de ensinar o conteúdo aos alunos. Hoje em dia, esses moderninhos ficam querendo questionar o conhecimento e autoridade dos docentes, vocês acreditam nessa pouca vergonha?
São esses mesmos moderninhos, aliás, que resolveram que o correto é se atualizar pelo whatsapp em vez de ler um livro ou um jornal como o pessoal da velha guarda, como eu, ainda faz. Aonde esse mundo vai parar?
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No meu tempo, gente, militar ficava era na caserna, bem escondido depois da ditadura. Não tinha essas modernidades de se candidatar às eleições
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Aliás, lá na época da minha adolescência, no início da década de 90, não existia uma só pessoa que defendesse publicamente a volta do regime militar. Isso seria um vexame completo! As viúvas da ditadura eram enrustidas. Agora, tão aí, na maior pouca vergonha, relativizando tortura e dizendo que nem houve ditadura, o que só pode demonstrar que esse mundo tá perdido, mesmo.
Vocês vão me desculpar o tom nostálgico, mas é que “o meu tempo” era da redemocratização e os candidatos iam aos debates, não tinha essa de dar desculpa e não aparecer. Os debates depois eram manipulados pela edição da Globo e a esquerda podia falar mal da mídia, como deve ser. Agora é uma loucura, ficam dizendo que a Globo é comunista e a gente nem sabe mais quem deve defender. Essas modernidades não são mesmo pra mim!
Por fim, já que a Educação desse país tá de mal a pior e o governo federal só sabe nomear louco para esse ministério, só tenho uma coisa a dizer. Bom mesmo era no meu tempo de adolescência, em que Paulo Freire era secretário de Educação em São Paulo e não execrado publicamente como nesse século 21.
(Esse texto contém ironia mas é baseado em fatos reais. Tenhamos forças para suportar a atualidade)
O Jovem Karl Marx mantém vaga a cadeira disponível para que uma cinebiografia honrosa do filósofo alemão possa enfeitar as nossas memórias. O filme de Raoul Peck é altamente contraditório no mau sentido, isto é, não no sentido de como a filosofia de Marx pensava o processo da história. Peck filmou uma estátua, não um homem. Não necessariamente por idolatrar Marx, pois não parece ser esse o caso, mas antes por não penetrar o seu pensamento e, neste processo, revelar um Marx menos repleto de jargões. Dificilmente este filme articula a ideia de uma encenação econômica a uma montagem novelística (que parecem ser propostas do cineasta), pois está baseado num ritmo estranho ao próprio objeto de sua investigação.
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Os primeiros contatos com Engels, apenas modestamente criativos tal como filmados, impossibilitam que os personagens estejam à altura de suas ideias
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Embora o didatismo seja uma escolha evidente da narração, Peck conduz seu filme movendo situações por atropelos para encaixar flashes das principais (as mais virais) ideias de Marx. Não resolve muito: a gênese do jovem Marx não está lá senão como encarnação publicitária do gênio revolucionário que ele significa para a esquerda mundial, apesar da grande caracterização pessoal que August Diehl dá a seu personagem, como grande ator que é. Publica-se a lenda.
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É período pleno da Revolução Industrial e lá está tudo o que ela representou e representa: as máquinas aumentam a produtividade do trabalho, produz-se mais riqueza social, mas esta produtividade aniquila os trabalhadores que enfrentam longas jornadas por salários miseráveis e que esta riqueza não fica com eles
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Engels, Marx, Proudhon, Stirner e outros estão vendo o que Adam Smith e David Ricardo não puderam ver tão claramente pois o objeto de suas pesquisas ainda estava em transformação. O filme expõe estes contatos, as divergências, as ideias teóricas de cada um apenas rapidamente para conseguir estabelecer um corpo básico de sequências, o que é tanto sua força quanto sua fraqueza. Força, pois há um nítido esforço de representar um período central da produção intelectual de Marx dos mais complexos (o da escrita de A Ideologia Alemã, 1845/46, e do Manifesto Comunista, 1848), que talvez pela própria impossibilidade da representação seja disperso e frenético. Fraqueza, pois este frenesi empresta a Marx uma frivolidade cartunesca e, paradoxal que seja, idealista.
Por óbvio, estão lá as críticas aos jovens hegelianos, aos anarquistas (da corrente de Proudhon), aos próprios socialistas; discursos mais ou menos efusivos contra a burguesia, os alentos quantos aos processos revolucionários, a organização de alguns de seus principais textos, a vida familiar com Jenny (sobre quem, aliás, se poderia fazer uma bela peça cinematográfica), enfim, vários momentos constitutivos da trajetória do jovem Marx.
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Acaba que, diante de tudo o que o filme quer mostrar, muito da força de O Jovem Karl Marx seja apenas picotado, fique de rebote daquilo que a ânsia em construir o mito deseja priorizar
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Em observação, parece relevante dizer que a expressão dos conceitos e das ideias de Marx são matérias de duro resgate – e o filme muito bem se esquiva de trazer para o cinema um Marx profeta. Se sempre o foram para os marxistas (e talvez principalmente para eles) e para seus detratores célebres (que em grande parte o leram mal), como não haveriam de ser para um singelo cineasta?
Le Jeune Karl Marx, de Raoul Peck, França/Alemanha/Bélgica, 2017. Com August Diehl, Stefan Konarske, Hannah Steele,Vicky Krieps, Olivier Gourmet.
O Velho e o Mar, uma inspiração para a resistência
Flávia Cunha
31 de outubro de 2017
Há duas semanas, escrevi esse texto fazendo algumas reflexões sobre a onda conservadora que resolveu usar o termo comunista como ofensa. Desde então, entre outros absurdos cometidos por aí, houve uma ameaça à aula sobre Revolução Russa em uma universidade do Rio de Janeiro.
A Revolução Russa completa 100 anos em 2017. Sendo assim, parece-me bastante natural seja analisada com certa deferência em cursos de história. O que chama atenção, no entanto, é a incoerência desse tipo de comportamento que prefere o silêncio ao debate. A pessoa bradar contra a “ditadura comunista” que supostamente teria sido implantada pelo PT no Brasil mas fazer uso de truculência e exigência de silenciamento de assuntos que consideram contrários a seus interesses.
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Afinal, a falta de liberdade não é uma das críticas dessas mesmas pessoas ao regime implementado na ex-União Soviética e, até hoje, em Cuba?
É difícil de entender
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Mas voltemos ao xingamento que recebi, que motivou meu primeiro texto: um dos chavões do momento “Comunista, vai pra Cuba”. A verdade é que o mundo mudou muito desde 1959, quando ocorreu a Revolução Cubana, até os dias atuais, com o irmão de Fidel Castro no comando da ilha. Existem muitas controvérsias sobre se é bom ou ruim morar em Cuba.
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Porém, o que proponho agora é uma volta no tempo, antes de Fidel e Che Guevara tirarem do poder o ditador Fulgencio Batista, que tinha o apoio dos Estados Unidos
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Foi a partir de 1939 que o escritor norte-americano Ernest Hemingway escolheu Cuba como seu lar. Viveu lá por cerca de 20 anos. Os relatos são de que Hemingway gostava muito de morar naquele país e foi onde escreveu uma das suas obras mais famosas: O Velho e o Mar. Poderia ser simplória a narrativa do pescador Santiago, um idoso que fica 84 dias sem conseguir fisgar nada até entrar numa brava luta para conseguir chegar à costa com um enorme peixe.
Porém, o livro é uma grande metáfora da solidão e da velhice, no meu ponto de vista. Além de remeter à ideia de que nunca é tarde para sonhar e tentar alcançar nossos objetivos. Uma das minhas frases preferidas dessa grande obra é:
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“ – Mas o homem não foi feito para a derrota – disse em voz alta. – Um homem pode ser destruído, mas nunca derrotado.”
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Acho que essa pode ser uma boa inspiração para os dias atuais. Sejamos como o velho Santiago, que não se deu por derrotado mesmo em meio a grandes adversidades.
Sobre Hemingway, é importante ressaltar que ele ganhou um Pulitzer e o Nobel de Literatura após a publicação de O Velho e o Mar, em uma época em que o autor já estava um pouco desacreditado pela crítica.
A respeito de Cuba, ainda resta dizer que ele viveu por lá até 1959. Com a Guerra Fria e o rompimento de relação com os Estados Unidos, precisou voltar para seu país de origem, onde suicidou-se alguns anos depois. Aqui tem uma matéria a respeito com detalhes interessantes sobre o assunto.
Agora, uma última provocação. Acho que Hemingway também não se importaria de ser mandado para Cuba pelos conservadores da atualidade. Ainda mais ele, que (dizem) simpatizou com a causa comunista na Guerra Civil da Espanha, na década de 1930.
Essa frase (e variações dela) vem sendo reproduzidas em comentários pela Internet, essa rede criada para interligar as pessoas mas que parece cada vez mais ser usada como instrumento de propagação de ódio. Fiquei divagando sobre esse tipo de declaração, ao ter um comentário desses associado a um texto meu. Fiquei genuinamente intrigada.
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O que faz com que o internauta em questão ache que eu sou comunista?
E “comunista” é xingamento?
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Então, fui fazer algumas pesquisas para propor reflexões a respeito. A verdade é que o tão temido comunismo nunca foi aplicado em nenhum país, por prever o fim do Estado com a chegada da igualdade absoluta entre os cidadãos. A sociedade, portanto, arranjaria uma maneira de se autorregulamentar. Seria, a grosso modo, a etapa final do socialismo, esse sim implementado na antiga União Soviética e em Cuba, por exemplo.
Para entender as raízes do ódio ao comunismo, cheguei num artigo sobre o anticomunismo e constatei que não há um consenso nesse movimento. Liberais, conservadores, democratas cristãos, fascistas e nazistas têm (ou tiveram) em comum o ódio aos comunistas. O principal motivo, me parece, seria por essa ideologia prever o fim da propriedade privada.
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Mas o que está ocorrendo no Brasil para que de uma hora para outra tanta gente fale em comunismo de forma tão agressiva? Sempre foi assim?
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Nas minhas investigações de obras ligadas ao tema, encontrei alguns fatos curiosos. Em 1980, um livro da coleção Primeiros Passos, da Editora Brasiliense com o título O Que é Comunismo? foi lançado sem problema algum em território brasileiro, mesmo antes da abertura política.
Em 1985, era a vez de uma biografia sobre uma comunista virar sensação entre leitores de diferentes vertentes políticas. Olga, de Fernando Morais, aborda a trajetória da comunista e judia Olga Benário, como explica o jornalista, na introdução da obra:
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“A reportagem que você vai ler agora relata fatos que aconteceram exatamente como estão descritos neste livro; a vida de Olga Benario Prestes, uma história que me fascina e atormenta desde a adolescência, quando ouvia meu pai referir-se a Fílinto Müller como o homem que tinha dado a Hitler, “de presente”, a mulher de Luís Carlos Prestes, uma judia comunista que estava grávida de sete meses. Perseguido por essa imagem, decidi que algum dia escreveria sobre Olga, projeto que guardei com avareza durante os anos negros do terrorismo de estado no Brasil, quando seria inimaginável que uma história como esta passasse incólume pela censura.”
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Perceberam a última frase? Em 1985, era possível escrever sobre uma comunista sem ser execrado. Aliás, as críticas da época foram muito boas, como podemos notar pelas avaliações da imprensa da época, que constam nessa primeira edição.
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“Além de ser um retrato de corpo inteiro de Olga Benario, o livro acabou sendo uma história completa da revolta comunista de 1935.” (O Globo)
“Estou impressionado com a qualidade do texto e com o belo profissionalismo com que o trabalho foi encarado. É, sem sombra de dúvida, uma excelente obra e um livro indispensável.” (Tarso de Castro – Tribuna da Imprensa)
“Não é apenas o relato da vida e da morte de Olga Benario, mas traz revelações inéditas e polêmicas sobre a revolta comunista de 1935.” (Jornal O São Paulo)
“Só agora a fascinante história de Olga é contada de verdade para nós – e de forma apaixonada.” (Marília Gabriela – TV Bandeirantes)
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O livro Olga foi reeditado com sucesso em 1994 quando também não houve nenhum tipo de comoção por abordar, com humanidade e alguma ternura, a trajetória de uma comunista. O filme Olga, de 2004, tampouco enfrentou críticas do gênero. Alguma coisa realmente parece ter mudado nesses últimos anos no Brasil. E, no meu ponto de vista, não foi para melhor.
Sobre Cuba, citada no título desse texto, falarei em breve. A abordagem será de uma obra passada na terra de Fidel e escrita por um norte-americano premiadíssimo. Aguardem!