OUÇA Bendita Sois Vós #10 Existe política externa sem ideologia?
Geórgia Santos
28 de novembro de 2018
Jair Bolsonaro ainda não assumiu, mas algumas decisões do novo presidente já tem efeito prático na sociedade brasileira. Especialmente na área da política externa, que prometeu ampliar “sem conotação ideológica” e aproximar o Brasil de outros países que, segundo ele, foram desprezados pelos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Por isso, os jornalistas Geórgia Santos, Tércio Saccol e Igor Natusch perguntam: existe política externa sem ideologia?
Ainda uma entrevista com Tanguy Baghdadi, professor de Política Internacional e host podcast Petit Journal. Ele fala sobre decisões políticas e comerciais e sobre o histórico do novo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, como tendência.
Evelin Argenta entrevista Mauro Junqueira, Presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, que entende que Cuba pode ter se precipitado ao retirar os médicos do Brasil.
No Sobre Nós, com Raquel Grabauska e Angelo Primon, uma reflexão sobre como seria se os tubarões fossem homens pelas palavras de Bertold Brecht.
O Velho e o Mar, uma inspiração para a resistência
Flávia Cunha
31 de outubro de 2017
Há duas semanas, escrevi esse texto fazendo algumas reflexões sobre a onda conservadora que resolveu usar o termo comunista como ofensa. Desde então, entre outros absurdos cometidos por aí, houve uma ameaça à aula sobre Revolução Russa em uma universidade do Rio de Janeiro.
A Revolução Russa completa 100 anos em 2017. Sendo assim, parece-me bastante natural seja analisada com certa deferência em cursos de história. O que chama atenção, no entanto, é a incoerência desse tipo de comportamento que prefere o silêncio ao debate. A pessoa bradar contra a “ditadura comunista” que supostamente teria sido implantada pelo PT no Brasil mas fazer uso de truculência e exigência de silenciamento de assuntos que consideram contrários a seus interesses.
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Afinal, a falta de liberdade não é uma das críticas dessas mesmas pessoas ao regime implementado na ex-União Soviética e, até hoje, em Cuba?
É difícil de entender
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Mas voltemos ao xingamento que recebi, que motivou meu primeiro texto: um dos chavões do momento “Comunista, vai pra Cuba”. A verdade é que o mundo mudou muito desde 1959, quando ocorreu a Revolução Cubana, até os dias atuais, com o irmão de Fidel Castro no comando da ilha. Existem muitas controvérsias sobre se é bom ou ruim morar em Cuba.
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Porém, o que proponho agora é uma volta no tempo, antes de Fidel e Che Guevara tirarem do poder o ditador Fulgencio Batista, que tinha o apoio dos Estados Unidos
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Foi a partir de 1939 que o escritor norte-americano Ernest Hemingway escolheu Cuba como seu lar. Viveu lá por cerca de 20 anos. Os relatos são de que Hemingway gostava muito de morar naquele país e foi onde escreveu uma das suas obras mais famosas: O Velho e o Mar. Poderia ser simplória a narrativa do pescador Santiago, um idoso que fica 84 dias sem conseguir fisgar nada até entrar numa brava luta para conseguir chegar à costa com um enorme peixe.
Porém, o livro é uma grande metáfora da solidão e da velhice, no meu ponto de vista. Além de remeter à ideia de que nunca é tarde para sonhar e tentar alcançar nossos objetivos. Uma das minhas frases preferidas dessa grande obra é:
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“ – Mas o homem não foi feito para a derrota – disse em voz alta. – Um homem pode ser destruído, mas nunca derrotado.”
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Acho que essa pode ser uma boa inspiração para os dias atuais. Sejamos como o velho Santiago, que não se deu por derrotado mesmo em meio a grandes adversidades.
Sobre Hemingway, é importante ressaltar que ele ganhou um Pulitzer e o Nobel de Literatura após a publicação de O Velho e o Mar, em uma época em que o autor já estava um pouco desacreditado pela crítica.
A respeito de Cuba, ainda resta dizer que ele viveu por lá até 1959. Com a Guerra Fria e o rompimento de relação com os Estados Unidos, precisou voltar para seu país de origem, onde suicidou-se alguns anos depois. Aqui tem uma matéria a respeito com detalhes interessantes sobre o assunto.
Agora, uma última provocação. Acho que Hemingway também não se importaria de ser mandado para Cuba pelos conservadores da atualidade. Ainda mais ele, que (dizem) simpatizou com a causa comunista na Guerra Civil da Espanha, na década de 1930.