Samir Oliveira

Um ano depois: LGBTs vão do medo à luta para enfrentar Bolsonaro

Samir Oliveira
20 de novembro de 2019

Os dias que se seguiram à vitória de Jair Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018 foram marcados por um sentimento de medo profundo entre a comunidade LGBT. Era como se, de repente, nossas vidas estivessem ainda mais em risco. Como se passássemos a viver sob o fio de uma espada, pronta para decepar nossos sonhos, nossas conquistas e nossas possibilidades de ser e amar.

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Como pode uma política que agride nossa existência receber o voto entusiasmado de quem diz nos amar?

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Um ano já se passou desde então. Eu senti esse medo. Meus amigos sentiram este medo. Foi impossível não se deixar tomar por este sentimento. Ainda mais quando muitos de nós percebemos, como foi o meu caso, que este projeto violento de Brasil foi eleito com o apoio de nossos familiares, amigos e conhecidos. Como pode uma política que agride nossa existência receber o voto entusiasmado de quem diz nos amar? O Brasil ainda ficará devendo esta resposta a milhões de LGBTs por um bom tempo.

O sentimento imediato era de que os 57 milhões de brasileiros que votaram em Bolsonaro não toleravam nossa existência. Como viver em um país que está disposto a patrocinar nosso extermínio? Conheço gente que não conseguiu suportar. Pessoas que partiram antes das eleições e não pretendem mais voltar. E pessoas que ainda estão pensando em se mandar de vez.

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Assim como percebi medo e horror, também vi brotar um sentimento de resistência muito grande entre LGBTs
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Mais do que nunca, nossa estética virou uma forma de afrontar o sistema. As cores do arco-íris, que tanta repulsa causam à base de apoio mais dura do bolsonarismo, ostentam nosso orgulho. As paradas LGBTs continuam levando multidões às ruas, demonstrando ao mundo que não iremos voltar ao armário. A criminalização da LGBTfobia pelo STF foi uma conquista civilizatória em tempos de Bolsonaro. A decisão do Supremo de equiparar LGBTfobia ao crime de racismo é um espinho na garganta do bolsonarismo. Não é pouca coisa que ela tenha ocorrido justamente durante o reinado de ódio que se instalou no país.

Também causa indigestão a esta gente o fato de que um casal gay se encontra no epicentro da oposição ao governo. O jornalista Glenn Greenwald e o deputado federal David Miranda (PSOL-RJ) viram suas vidas serem reviradas do avesso pela segunda vez. A primeira aconteceu quando revelaram ao mundo a rede suja de espionagem dos Estados Unidos. Agora Glenn, com a coragem característica dos bons jornalistas, desnudou a tragédia farsesca de um juiz-acusador e de um procurador apaixonado por si mesmo. E com isso atraiu para si a fúria do bolsonarismo e os insultos dignos de quinta série associados à sua sexualidade e à sua família. A disputa chegou ao esgoto quando até mesmo sua mãe, com câncer em estágio terminal, e seus filhos foram atacados.

A conjuntura política é grave. Não podemos contar apenas com nosso voluntarismo diante da corrosão democrática que o país vive. O melhor que temos a fazer é nos organizarmos para enfrentar este período histórico. Nossa resistência individual precisa encontrar na luta coletiva um elo que dê sentido à revolta e à mobilização por transformações estruturais no Brasil. 

Bolsonaro nada mais é do que a face mais desumana de um sistema podre que recorreu ao medo para rebaixar ainda mais as condições de vida da classe trabalhadora. O recrudescimento da opressão contra a população LGBT está inserido neste projeto nefasto de país, em que interessa ao capitalismo que nós sejamos considerados cidadãos de segunda categoria, para que possamos ser mais facilmente explorados. Por isso, nossa resistência precisa andar lado a lado de uma luta que também seja antissistêmica, encontrando sentido nas trincheiras ao lado das mulheres, da negritude, do sindicalismo, dos ambientalistas, dos estudantes, e de todas e todos que estejam dispostos a apontar um novo rumo para o país.

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O medo experimentado após o resultado eleitoral vem, ao longo deste ano que insiste em não terminar, cedendo lugar à certeza de que não estamos sozinhos
Mas apenas nossos aliados de sempre não bastam
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Precisamos conduzir um esforço de diálogo com setores da base bolsonarista que não compactuam com ideias fascistas – base essa que vem sendo corroída desde a posse do presidente. Bolsonaro não seguirá seu mandato agarrado ao que existe de mais alucinado, radical e intransigente em sua base de apoio – e a criação de seu novo partido indica essa tentativa de organizar com mais solidez este setor. Suas declarações absurdas e as palhaçadas cotidianas servem para manter um núcleo fiel energizado, mas afastam franjas importantes do bolsonarismo que não estão dispostas a ir para o vale tudo em nome de uma cruzada ideológica e antidemocrática da extrema-direita.

Essas pessoas precisam estar do nosso lado na luta pelos direitos sociais, contra o autoritarismo e em defesa das chamadas “minorias”. Muitas pesquisas já demonstram evidências fartas de que nem todo mundo que votou em Bolsonaro é racista, misógino e LGBTfóbico. Não podemos desprezar este dado, pois não iremos virar este jogo apenas com nossas próprias forças. Temos que energizar nossas bases e falar para os nossos também, mas precisamos ir além, encontrando em nossa organização coletiva um canal para ampliarmos nossas vozes e furarmos as bolhas.

Foto capa: Mídia Ninja

Voos Literários

Lorca e a homofobia do passado (e do presente)

Flávia Cunha
18 de junho de 2019

Muitos intelectuais do século 19 e 20 viveram no armário. Alguns do século 21 ainda vivem, com receio de expor sua sexualidade em uma sociedade em parte conservadora, apesar dos inegáveis avanços da pauta LGBT, como a decisão do STF que criminaliza a homofobia e a transfobia.

Ainda existem vozes contrárias, como a de líderes religiosos que evocam a “liberdade de expressão” para continuar pregando que a homossexualidade é pecado. Isso seguirá liberado, apesar da decisão do Supremo. O que está proibido é incitar a violência contra a comunidade LGBT, pelo simples fato de existirem.

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Lamentavelmente, os crimes de ódio contra gays ocorrem há muito tempo e uma dessas possíveis vítimas é o escritor espanhol Federico García Lorca

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Digo possível porque sua execução durante a Guerra Civil espanhola é cercada de controvérsias. Investigações mais recentes apontam que talvez não tenham sido os fascistas os responsáveis pela morte de Lorca, mas que poderia se tratar de uma briga familiar em torno de terras. De qualquer forma, seja lá quem foram seus executores, o que pairou no ar na época de sua morte (1936) e segue como um dos pontos de convergência das teorias sobre os motivos de seu assassinato é a sua homossexualidade, acima do fato de sua visão política de esquerda e antifascista.

Lorca, apesar de nunca ter assumido publicamente sua orientação sexual, não teve um casamento de fachada com uma mulher, como era costume na época. O fato de circular pela sociedade espanhola sempre acompanhado de homens também provocava desconforto. Mesmo perante partidários de esquerda, Lorca enfrentava dificuldades em relação à sua sexualidade. Relatos apontam que Luis Buñuel (diretor do antológico Cão Andaluz) preferiu afastar Salvador Dalí da influência “negativa” de Lorca,  já que os dois tinham uma relação muito próxima.  

Salvador Dalí e Federico García Lorca, 1927 / Reprodução: Internet

Mas antes de Buñuel “roubar” Dalí da convivência de Lorca, houve pelo menos um registro de um trabalho artístico envolvendo o escritor e o pintor. Em 1927, Dalí foi o responsável pela concepção cênica e figurinos da primeira montagem do espetáculo teatral Mariana Pineda, um dos poucos trabalhos declaradamente políticos de Lorca. A peça teatral é baseada na vida de Mariana de Pineda Muñoz, figura lendária da região de Granada. É até hoje, na região, um símbolo de liberdade e resistência à opressão. No texto do dramaturgo, a história da heroína é romantizada, ao mostrar o amor frustrado da protagonista por um revolucionário foragido e a justificativa para ordenar sua execução é por ter guardado uma bandeira:

 

(Exaltada e protestando ferozmente). Não pode ser! Covardes!  Quem ordena tais vilanias na Espanha? Que crime cometi? Porque me matar? Onde está a razão da justiça? Na bandeira da liberdade bordei o maior amor da minha vida. E eu tenho que ficar aqui encerrada? Queria ter asas cristalinas para voar em busca de você.”

Conforme análise de especialistas, a peça teatral aborda a opressão sofrida pela mulher e a luta contra o patriarcado, o autoritarismo e a moral religiosa. E talvez, ouso dizer, tenha sido a saída encontrada pelo escritor e dramaturgo para abordar também a opressão vivida por gays, em uma época em que a pauta LGBT ainda estava longe de ser consolidada. Menos de 10 anos depois da primeira montagem desse espetáculo teatral, em que a protagonista é executada, Lorca enfrenta o mesmo destino.

A luta contra o patriarcado, o autoritarismo e a moral religiosa ainda é necessária para integrantes da comunidade LGBT (e também para mulheres) em pleno século 21.   

Até quando?

 

 

Fotos: Reprodução/Internet

 

 

Voos Literários

Uma mulher contra Hitler

Flávia Cunha
12 de março de 2019

Virou lugar comum falar sobre o ódio disseminado nas redes sociais, principalmente entre pessoas com visões políticas (e de mundo) opostas. Como se a culpa fosse da tecnologia e não do momento tenso que vivemos no Brasil. Mas em meio a comentários intolerantes, trocas de ofensas e robôs com mensagens prontas, muitas vezes achamos conteúdo valioso e interessante para reflexão e aprendizado.

Se não fosse por uma postagem compartilhada por diversas pessoas na minha rede no facebook talvez eu não ficasse sabendo sobre a existência de Sophie Scholl, uma das poucas alemãs a combater ativamente o nazismo e a ser morta em função disso.

O episódio assusta pela singeleza dos atos praticados por um grupo de universitários: eles apenas distribuíram panfletos contra o governo de Hitler. A trajetória do movimento de resistência Rosa Branca é contada por Inge, irmã de Sophie e de Hans, irmão das duas que também foi executado pelo regime nazista, no livro A Rosa Branca, lançado apenas em 2014 no Brasil.

Na sexta edição dos manifestos, Sophie foi detida após atirar os panfletos de cima de um prédio da Universidade de Munique. Saiu do campus universitário presa pela Gestapo, em companhia de seu irmão. Em um julgamento-relâmpago, Sophie e os outros integrantes do Rosa Branca foram condenados à morte e guilhotinados.  

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A ousadia de Sophie custou-lhe a vida, assim como acontece com diversas mulheres ao redor do mundo ainda hoje

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E a verdade é que, em plena década de 1940, em uma sociedade entorpecida pelo totalitarismo, a maior parte dos alemães preferia mesmo não enxergar os horrores cometidos pelo nazismo. Um dos panfletos, reproduzido no livro escrito por Inge Scholl, publicado originalmente em 1952, parece-me bem atual:

“Não há nada mais indigno para um povo civilizado do que se deixar ‘governar’ sem resistência por uma corja de déspotas irresponsáveis, movida por instintos obscuros”.

Por isso, precisamos seguir na resistência. Se na época do nazismo eram necessários mimeógrafos e panfletos, hoje podemos usar a Internet com esse objetivo. Não precisamos de ódio. Precisamos ter paciência para abrir os olhos de quem prefere ver pureza e boas intenções no bolsonarismo.

Foto: Reprodução do filme Uma Mulher contra o Nazismo (de 2005)

Voos Literários

Resistência cultural em debate

Flávia Cunha
4 de dezembro de 2018

Como ser oposição ao presidente eleito e seus ideais conservadores sem cair em discursos de ódio ou em utopias inalcançáveis?

O termo resistência, utilizado com o objetivo de unir os opositores ao futuro governo, independente de partidos políticos, enfrenta críticas dos eleitores de Bolsonaro. Mas desde quando resistir é algo pejorativo? Ou violento?

Um exemplo de que é possível reagir a momentos difíceis de maneira positiva encontra-se no livro A Resistência, do celebrado escritor argentino Ernesto Sabato, falecido aos 99 anos, em 2011. A obra, lançada em 2000, constitui-se de cartas com alentos e conselhos aos leitore, com um teor extremamente atual.

Na carta intitulada A Resistência, o escritor pondera como ter uma postura combativa em meio aos compromissos impostos pela vida cotidiana:

Acredito que é preciso resistir: esse tem sido meu lema. Hoje, contudo, muitas vezes me pergunto como encarnar essa palavra. Antes, quando a vida era menos dura, eu teria entendido por resistência um ato heróico, como negar-se a continuar sobre este trem que nos leva à loucura e ao infortúnio. Mas pode-se pedir às pessoas tomadas pela vertigem que se rebelem? Pode-se pedir aos homens e às mulheres do meu país que se neguem a pertencer a esse capitalismo selvagem, quando eles têm de sustentar os filhos e os pais? Se eles carregam tal responsabilidade, como poderiam abandonar essa vida?”

No trecho final da carta A Resistência, Ernesto Sabato aconselha a resistir por meio de pequenos atos e também dos afetos:

Os homens encontram nas próprias crises a força para sua superação. Assim o demonstraram tantos homens e mulheres que, contando apenas com sua tenacidade e sua valentia, lutaram e venceram as sangrentas tiranias do nosso continente. O ser humano sabe fazer dos obstáculos novos caminhos, porque à vida basta o espaço de uma fresta para renascer. […] Não deixarmos desperdiçar a graça dos pequenos momentos de liberdade de que podemos desfrutar: uma mesa compartilhada com pessoas que amamos, umas criaturas que amparemos, uma caminhada entre as árvores, a gratidão de um abraço. Gestos de coragem como saltar de uma casa em chamas. Não são atos racionais, mas isso não importa: nós nos salvaremos pelos afetos.

O mundo nada pode contra um homem que canta na miséria.”

E é com muita esperança e afeto que convido a todos que estiverem em Porto Alegre (RS) no dia 17 de dezembro, às 20h, a comparecerem ao evento Resistência Cultural em Debate. Serei a mediadora da conversa entre três mulheres atuantes no meio cultural da cidade e do Estado: a cantora e jornalista Camila Toledo, a produtora-executiva de cinema Graziella Ferst e a atriz, diretora e produtora teatral Raquel Grabauska.

A ideia é fazer uma roda de conversa não apenas de produtores culturais e artistas, mas de todos aqueles que querem apoiar a Arte e a Cultura no Brasil.

O momento é de união, reflexão e apoio mútuo. Compareçam.

 

Voos Literários

Livro Livre . um slogan para a resistência

Flávia Cunha
6 de novembro de 2018

A Feira do Livro de Porto Alegre, um dos eventos literários mais tradicionais do país, vai até o dia 18 de novembro, no centro da capital gaúcha. A Feira, em sua 64a edição, é um exemplo de resiliência. Todos os anos é necessário um esforço para garantir sua realização, por meio de patrocínios, apoios e parcerias. Acompanho os bastidores do evento desde 2015, quando comecei a atuar na área editorial e conheci uma parte dos responsáveis pela organização da feira, que é uma das responsabilidades da Câmara Rio-grandense do Livro.

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São pessoa apaixonadas pelo que fazem e que lutam contra a falta de recursos financeiros com jogo de cintura e  valentia

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E foi preciso coragem (e diplomacia) para enfrentar a prefeitura de Porto Alegre, que queria cobrar uma taxa de milhares de reais pelo uso do espaço público, já que uma das características – e charmes – da Feira do Livro é ser realizada a céu aberto, em uma das principais praças do centro da cidade. Houve pressão por parte do meio cultural, além de  negociações diretas com o poder público. No fim, o prefeito Nelson Marchezan, do PSDB, cedeu e desistiu da cobrança. Na abertura oficial da feira, no dia 10, ele ironizou a situação e resolveu dar mais esclarecimentos, citando que em época de fake news era melhor deixar claro o que tinha ocorrido na época. ““A Feira do Livro é uma das poucas unanimidades que temos na nossa cidade. A partir de agora, o evento vai contar com segurança jurídica para acontecer todo ano, independente de vontades pessoais”, ressaltou.

Ele se referia à modificação de um decreto que tornou isentos de compensação financeira eventos que estejam classificados como bem cultural e de natureza imaterial.  É o caso da Feira do Livro de Porto Alegre, que já recebeu distinções como a Ordem do Mérito Cultural, em 2006, concedida pela presidência da república por ser um dos eventos culturais mais importantes do Brasil. Em 2005, foi declarada como Patrimônio Cultural Imaterial do Rio Grande do Sul e, em 2010, passou a integrar o Patrimônio Histórico e Cultural Imaterial da cidade.

Mesmo assim, foi necessária um embate com a prefeitura para que enfim não ocorresse essa cobrança que inviabilizaria um evento com 100% das atividades gratuitas. E são muitas. Nesse ano, serão mais de 700 sessões de autógrafos, de autores de todos os gêneros literários. E cerca de 500 atividades, como oficinas, mesas de debate, palestras e espetáculos teatrais.

Em meio a esses percalços, a organização seguiu com o planejamento das ações para a feira do livro de 2018. E criou uma campanha com um slogan que tem tudo a ver com o momento atual: Livro Livre – Um Mundo na Praça.

É necessário se falar em liberdade, quando muitos querem cercear a liberdade de professores em sala de aula, uma das profissões que mais podem incentivar a leitura no país. É preciso ter livros livres para que possamos ter senso crítico, inclusive para discordar de forma articulada e racional do que estamos lendo. É preciso interpretação de texto para evitar sermos enganados por notícias falsas, tão comum nos dias atuais.

E é preciso ter eventos culturais como esse. Livres e ocupando espaços públicos. Um dos exemplos do que estou me referindo foi um debate sobre a luta para o acesso a leitura promovido por representantes de bibliotecas comunitárias.

O Slam Conexões trouxe poesia para a praça, sem deixar de lado o engajamento político, com o coro de: “Racistas, fascistas, não passarão!”

Outro evento que merece destaque é a Mostra da Resistência, que contará com o lançamento de um e-book sobre o legado de Paulo Freire.

Pessoalmente, estou envolvida com duas atividades na programação oficial da Feira do Livro de Porto Alegre, o que me traz muito orgulho. Um é um evento cultural infantil chamado MúsicaLivro ao Vivo, no qual conto com a parceria generosa de músicos para fazerem essa conexão entre musicalidade e literatura.  Será nessa terça-feira, dia 6, no Teatro Carlos Urbim, na Praça da Alfândega.

No dia 8, quinta-feira, participarei de um painel com a jornalista de São Paulo, Gabriela Romeu, sobre produção cultural para a infância e seu espaço na mídia.  Gabriela também é escritora, documentarista e crítica de teatro infantil. Será um bate-papo em que o cerceamento à liberdade certamente virá à tona durante a conversa.

Sigamos livres!!

Foto de capa: Maria Ana Krack / PMPA

Foto – Evento bibliotecas comunitárias : Diego Lopes/Feira do Livro de Porto Alegre

Foto – Slam Conexões: Pedro Heinrish/Feira do Livro de Porto Alegre

PodCasts

OUÇA Bendita Sois Vós #7 É preciso resistir?

Geórgia Santos
4 de novembro de 2018

O sétimo episódio do Bendita Sois Vós vem na sequência do resultado final das eleições de 2018, em que Jair Bolsonaro (PSL) foi eleito presidente do Brasil. Diante disso, perguntamos, é preciso resistir? Como resistir? Resistir a que?

A jornalista e cientista política Geórgia Santos conversa com os jornalistas Flávia Cunha e Igor Natusch e com o jornalista e professor Tércio Saccol. Além disso, Evelin Argenta traz depoimentos de mulheres e homens que sentem que, mais do que nunca, é preciso resistir a determinadas ideias. Como voz de inspiração, também há a declaração de Pepe Mujica, que diz que “a vida é uma luta permanente. […] Não há derrota definitiva, nem triunfo definitivo.”

 

PodCasts

Sobre Nós # 7 O direito ao delírio

Geórgia Santos
4 de novembro de 2018

Neste episódio do Sobre Nós, Raquel Grabauska e Angelo Primon recitam parte de “O direito ao delírio”, de Eduardo Galeano. Em um período pós-eleição, em que ainda se ensaia uma resistência, é preciso respirar. “Mesmo que não possamos adivinhar o tempo que virá, temos ao menos o direito de imaginar o que queremos que seja.”

 

Samir Oliveira

As paradas LGBTs ecoarão resistência

Samir Oliveira
1 de novembro de 2018

Um sentimento muito forte de medo tomou conta de boa parte da população LGBT após a vitória de Jair Bolsonaro. Não é para menos. Os ódios mobilizados pelo presidente eleito fizeram desaguar o esgoto da internet. Não foram poucos os comentários celebrando a abertura de uma temporada de caça a homossexuais, pregando a morte de bichas ou até mesmo a criação de grupos de extermínio.

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Eu estou com medo. Meus amigos estão com medo. Especialmente aqueles que, assim como eu, integram a sopa de letras da comunidade LGBT

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As horas seguintes ao resultado das urnas foram de pavor. Os foguetes nas ruas pareciam comemorar o nosso fim. Em muitos lugares se ouviu barulho de tiros. Abriram a Caixa de Pandora e agora as manifestações de ódio correm soltas à luz do dia.
É impossível não ficar com medo. Mais do que impossível, é imprudente. O medo é um instinto natural de preservação. Não temos que lutar contra o medo. Temos que lutar apesar do medo. Ainda estamos elaborando o luto de uma eleição devastadora, em que o autoritarismo toma de assalto a democracia pela porta da frente, sem derrubar um prego.

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Precisamos entender como foi que chegamos até aqui. Este é o primeiro passo.

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Em seguida precisamos construir redes de acolhimento e espaços seguros para reuniões, encontros e diálogos. A organização da resistência passa também pela organização de cada um de nós, seja em partidos, em entidades da sociedade civil, em associações, em coletivos movidos por causas específicas. Cada espaço conta. Cada pessoa conta.

Ninguém pode ficar para trás. Este é o segundo passo. O terceiro passo é a nossa ação nas ruas. É lá que se dará o enfrentamento mais duro à política de Bolsonaro. É nas ruas que combateremos o ódio. E a comunidade LGBT tem seus próprios métodos para isso, sendo as paradas do orgulho a principal demonstração de força, de amor, de combatividade e de resistência diante daqueles que desejam a nossa volta ao armário.

O Rio Grande do Sul vai ter uma agenda intensa de paradas LGBTs neste final de 2018. A principal delas sem dúvida é a 22ª Parada Livre de Porto Alegre, que ocorre no dia 18 de novembro, na Redenção. Tradicionalmente o evento leva pelo menos 30 mil pessoas todos os anos para as ruas. O lema desta edição não poderia ser mais crucial: Resistir para não morrer.

Teremos pelo menos mais oito paradas até o final do ano. A maioria delas já possui data definida: Cachoeirinha (04/11), Sapucaia (11/11), Santa Maria (18/11), Porto Alegre (18/11), Caxias do Sul (25/11), Esteio (02/12), Pelotas e Rio Grande. A comunidade LGBT tem estado, junto com as mulheres, na linha de frente da resistência. Para nós, é uma questão de sobrevivência. Cada uma destas paradas deve ser um grito potente contra o projeto autoritário e intolerante de Bolsonaro. Estamos apenas começando. Onde querem armário, demonstraremos orgulho!

Samir Oliveira

Parada Livre de Porto Alegre: um berro contra os retrocessos

Samir Oliveira
2 de novembro de 2017
Foto: Fernanda Piccolo

No dia 26 de novembro Porto Alegre realiza a XXI edição da Parada Livre. Um evento de massas, que reúne pelo menos 35 mil pessoas todos os anos na Redenção em uma verdadeira festa política de luta por direitos e celebração da diversidade.

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O tema deste ano não poderia ser mais adequado:

“Berro contra os retrocessos”

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É com esta combatividade que os LGBTs irão às ruas neste dia. O momento político do país exige uma resposta frontal ao conservadorismo e uma reação afrontosa às tentativas medievais de censurar expressões de sexualidade e identidade.

A Parada Livre representa essa resistência construída democraticamente por uma série de coletivos e organizações. É verdade que é preciso que ela seja cada vez mais política, no sentido de incidir sobre a estrutura política que nega nossos direitos, abafa nossa liberdade e espanca nossos corpos. Esse processo está permanentemente em curso, com as linguagens e estéticas próprias que a população LGBT domina para fazer política. Afinal, a própria existência da Parada é um ato político. É extremamente político que dezenas de milhares de corpos LGBTs saiam às ruas juntos para expressar seus afetos e exercer a plena liberdade de ser quem são.

A Parada Livre deste ano será mais uma etapa de um novo ciclo de lutas que a população LGBT vem travando no Brasil nos últimos meses. Os ataques de setores proto-fascistas da sociedade exigem uma resposta forte e impulsionam uma articulação entre todo o movimento.

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Ataques constantes

A representação maior deste novo ciclo foi a reação ao fechamento da exposição QueerMuseu em Porto Alegre. O episódio fortaleceu grupos de extrema-direita que destilam ódio contra qualquer manifestação de diversidade. Iniciou-se uma cruzada medieval contra a arte e as expressões de sexualidade e gênero no Brasil. O recuo vergonhoso do Santander diante destes grupos violentos catalisou esse sentimento antidiversidade.

A reação do movimento LGBT foi imediata e forte. Mais de duas mil pessoas se reuniram em frente ao Santander em plena quarta-feira para defender a liberdade artística. A vanguarda do movimento se uniu à categoria artística num duro enfrentamento aos grupos de ódio – especialmente ao MBL e seus satélites, que compareceram presencialmente no protesto e provocaram os ativistas.

A decisão da Justiça, em primeira instância, de autorizar a chamada “cura gay” representa um retrocesso de pelo menos 30 anos no que diz respeito ao consenso médico-psiquiátrico, científico e psicológico de que homossexualidade não é uma doença. Também esse episódio gerou uma onda de lutas muito forte. Em Porto Alegre, milhares foram às ruas para lutar contra este absurdo.

A população LGBT carrega consigo a responsabilidade de estar no enfrentamento diário à intolerância e ao fascismo, pois são seus corpos e suas expressões de afeto, identidade e sexualidade que estão sendo atacadas.

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O Brasil é o país que mais mata LGBTs no mundo. Só neste ano foram 169 transexuais assassinados e assassinadas. A população de travestis e transexuais é a mais vulnerável nesse contexto de extermínio

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Fortalecer a Parada Livre é fortalecer essa resistência tão necessária nos dias de hoje. É lutar por vidas humanas que estão em risco por causa do preconceito e da intolerância. Por isso é tão criminoso que a prefeitura de Porto Alegre tenha suspendido o apoio que sempre deu ao evento. O movimento não se intimidou diante da postura autoritária de Nelson Marchezan Júnior e batalha duramente por financiamento, contando com a parceria de casas noturnas e bares LGBTs e com a criatividade militante na venda de bottons, camisetas e canecas – que podem ser compradas através da loja virtual http://www.lojaafirme.com.br.

A Parada Livre deste ano não será menor. Pelo contrário, expressará com muita força o verdadeiro berro contra os retrocessos que a população LGBT dará na Redenção em 26 de novembro. Será fabuloso!

Foto: Fernanda Piccolo