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BSV Especial Coronavírus #34 E o vencedor das eleições foi o centrão

Geórgia Santos
2 de dezembro de 2020

Um retorno ao domínio do centrão. Agora sim, o processo de eleições municipais foi finalizado no Brasil após a votação do segundo turno em diversas cidades do país. Quanto aos resultados em algumas capitais, pouca ou nenhuma surpresa. Eduardo Paes venceu Crivella  no Rio de Janeiro, Sebastião Melo venceu Manuela Dávila em Porto Alegre, Bruno Covas venceu Guilherme Boulos em São Paulo.

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DEM, MDB e PSDB. Parece que o centrão foi o grande vencedor de 2020
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Jair Bolsonaro pode ter saído enfraquecido, afinal, os candidatos que apoiou diretamente não se elegeram, mas não está acabado.  O bolsonarismo e o que ele representa estiveram vivos durante o pleito. E o namoro com o centrão parece estar só começando. Quando à esquerda, coube a renovação nas Câmaras e a possibilidade de forte oposição aos eleitos da direta no Executivo.

Participam do programa os jornalistas Geórgia Santos, Flávia Cunha, Igor Natusch e Tércio Saccol. Você também pode ouvir o episódio no SpotifyItunes e Castbox

Vós Pessoas no Plural · BSV Especial Coronavírus #34 E o vencedor foi o centrão
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BSV Especial Coronavírus #32 Bolsonaro e as eleições municipais

Geórgia Santos
18 de novembro de 2020

Bolsonaro está caindo? Chegamos a esse episódio ainda assimilando os resultados do primeiro turno das eleições municipais no Brasil. Um pouco de ressaca, talvez, mas com todos os votos coitadinhos. [Piscadela pra aos amigos dos states.] E com todos os votos contados, testemunhados a derrota de Jair Bolsonaro nas urnas. Apenas UM dos 78 candidatos com Bolsonaro no nome da urna foi eleito no Brasil. Dica: ele administra o Twitter do Presidente.

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Como diz o Sensacionalista, candidato a síndico do Vivendas da Barra apoiado por Bolsonaro perde a eleição. É uma piadinha, tá gente, mas diz muito
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A outra boa notícia do último domingo é a eleição da diversidade nas Câmaras Municipais. Candidatas mulheres, trans, candidatas e candidatos negros. Além de partidos como PSOL registrando um crescimento interessante. A esquerda conseguiu se renovar, o Bolsonarismo, ao que tudo indica, não.

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Mas essa derrota do Bolsonaro também tem limites
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Afinal de contas, há segundo turno em inúmeras capitais e cidades brasileiras. E na maioria desses locais, o Bolsonarismo segue firme e forte. Sebastião Melo, do MDB, em Porto Alegre, é um desses representantes. Ele disputa a prefeitura com Manuela Dávila, do PCdoB. No Rio de Janeiro, o atual prefeito Marcelo Crivella, do Republicanos, também conseguiu avançar e disputa com Eduardo Paes, do DEM. Em outros lugares, porém, a coisa muda de figura. Em São Paulo, por exemplo, a gente tem Guilherme Boulos, do PSOL, no segundo turno. Ele disputa com Bruno Covas, do PSDB. Deixando pra trás Mamãe Falhei, ou melhor, Mamãe falei, do Patriota, e Joyce Hasselman, do PSL.

Participam do programa os jornalistas Geórgia Santos, Flávia Cunha, Igor Natusch e Tércio Saccol. Você também pode ouvir o episódio no SpotifyItunes e Castbox

Vós Pessoas no Plural · BSV Especial Coronavírus #32 Eleições municipais, Bolsonarismo e diversidade
Gustavo Chagas

Mujiquismo

Geórgia Santos
21 de novembro de 2019

Com uma crise (ou mais) por semana no continente, me sinto mal em repetir o tema “Uruguai” na terceira coluna que escrevo para o Vós. Mas é do pequeno país de 3 milhões de habitantes que vêm os melhores exemplos políticos da América do Sul. E, diante da imensa turbulência pela qual passamos, é nos uruguaios que devemos buscar inspiração.

As eleições deste domingo (24) devem confirmar a vitória de Luis Lacalle Pou, do conservador Partido Nacional, à presidência uruguaia. As pesquisas e a lógica apontam para o fim dos 15 anos de governo da Frente Ampla. Não é necessário ir muito longe, no tempo ou no território, para perceber que as forças políticas que chegam ao poder não gostam de deixá-lo.

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Pois no Uruguai é diferente…
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O ex-presidente José “Pepe” Mujica deixou claro qual será o papel da FA caso os prognósticos se confirmem. “Se tivermos que ser oposição, seremos oposição, e não esperem que estejamos com uma pedra em cada mão”, afirmou em entrevista a uma rádio local. A frase não é de um político demagogo querendo parecer democrata. É discurso, mas é prática.

Em 2014, tive a oportunidade de encontrar Mujica. Era repórter de uma emissora de rádio de Porto Alegre e fui escalado para uma coletiva de imprensa do então presidente uruguaio no Palácio Piratini, sede do governo gaúcho. Estávamos em processo eleitoral e, naquele momento, Marina Silva era quem ameaçava as chances de Dilma Rousseff na corrida ao Planalto. Me posicionei na ponta da fila de jornalistas para a rodada de perguntas e preparei a minha.

– Presidente, o senhor conhece Marina Silva? O que acha da candidata que concorre contra Dilma Rousseff?

Dei azar. A assessoria de imprensa responsável pela organização do evento tinha montado duas filas. Apesar de eu ser o primeiro de uma, eles começaram pela outra e o colega que estava na ponta oposta fez justamente a pergunta que eu tinha planejado. A resposta de Mujica, no entanto, me marcou:

– Seria de mau gosto que eu, presidente do Uruguai, me pusesse a opinar sobre a política brasileira diante da imprensa – afirmou – Vocês que são brasileiros que se resolvam.

A resposta evasiva (e, aparentemente, tosca e grosseira como de um gaucho do campo) era mais do que isso. Mujica sabia que não cabia a um chefe de Estado estrangeiro opinar sobre as eleições de outro país.

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A postura poderia servir de modelo para outros líderes, como o brasileiro Jair Bolsonaro, que adora opinar sobre o voto alheio. Mas as lições democráticas de Mujica vão além. Com seus ideais, a oveja negra uruguaia sabe, todavia, que a realidade é que manda
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“Se a ideologia substitui a realidade, aí estás vivendo o fictício e isso te leva à ruína ou a conclusões fantasiosas, que não o são. Eu tenho que lutar para melhorar a vida das pessoas na realidade concreta de hoje e não fazê-lo é uma imoralidade. (…) Estou lutando por ideais, macanudo. Mas não posso sacrificar o bem-estar da gente por ideais. A vida é uma e é muito curta.”

Em uma América Latina que dá golpes, persegue e mata por ideologia (ainda que use o disfarce de ser contra ideologias), proponho o mujiquismo. Se não der certo, ao menos, vamos aprender com o velho.

Voos Literários

Orgulho e Preconceito (no Brasil)

Flávia Cunha
25 de setembro de 2019

O orgulho dele não me ofende tanto – disse Miss Lucas – como o orgulho em geral, porque existe um motivo. Não é de admirar que um rapaz tão distinto, com família, fortuna, tudo a seu favor, tenha de si mesmo uma alta opinião. Se posso exprimir-me assim, ele tem o direito de ser orgulhoso.

– Isto é bem verdade – replicou Elizabeth -, e eu perdoaria facilmente o seu orgulho se ele não tivesse mortificado o meu.

– O orgulho – observou Mary, que se gabava da solidez das suas reflexões – é um defeito muito comum, creio eu. Por tudo o que tenho lido, estou mesmo convencida de que é muito comum, que a natureza humana manifesta uma tendência muito acentuada para o orgulho, que são pouquíssimos os que não alimentam esse sentimento, fundados em alguma qualidade real ou imaginária! A vaidade e o orgulho são coisas diferentes, embora as palavras sejam frequentemente usadas como sinônimos. Uma pessoa pode ser orgulhosa sem ser vaidosa. O orgulho se relaciona mais com a opinião que temos de nós mesmos, e a vaidade, com o que desejaríamos que os outros pensassem de nós.”

A frase acima é do clássico de Jane Austen, Orgulho e Preconceito. Um livro que aborda as diferenças de classe nas relações interpessoais na Inglaterra, no início do século XIX.  Mas qual a relação desse romance com o Brasil do século 21?

Vivemos há alguns anos em uma sociedade dividida entre orgulho e o preconceito. Enquanto a direita conservadora apega-se cada vez mais a conceitos preconceituosos, relativizando racismo, LGBTfobia e machismo, parte dos militantes do espectro mais à esquerda, em especial os intelectuais, parece não se dar conta da vaidade e do orgulho excessivos emanados em seus discursos.  

Em um país onde menos de 10% de seus habitantes conseguem completar o ensino superior, é preciso ter cuidado ao atribuir inteligência apenas a quem teve acesso às universidades. Não estou aqui dizendo que devemos ignorar a ciência e desvalorizar a educação como o governo Bolsonaro faz.  Porém, precisamos ficar atentos ao comportamento de militantes de esquerda que são favoráveis ao #Lulalivre e defendiam um operário no poder, mas que em, seu dia a dia, demonstram a vaidade de acharem-se superiores às pessoas que não tiveram acesso ao mundo acadêmico.

Como diz uma frase compartilhada em redes sociais:

“Não adianta ter doutorado e não cumprimentar o porteiro.”

Por mais duro que seja para nós de esquerda reconhecermos, é inegável que Bolsonaro e seus seguidores no PSL conseguiram mobilizar mais o eleitorado do que a esquerda nas últimas eleições. Um dos motivos é justamente a dificuldade de comunicar-se com a população, como alertou Mano Brown em um comício de Fernando Haddad: 

“A comunicação é a alma. Se não está conseguindo falar a língua do povo vai perder mesmo. Falar bem do PT para a torcida do PT é fácil. Tem uma multidão que não está aqui que deveria ser conquistada”.

Para quem não é filiado a um determinado partido, restam as relações pessoais. Por isso, precisamos eliminar o orgulho e  elitismo intelectual do nosso cotidiano, se quisermos uma mudança no cenário político atual e a diminuição real das desigualdades sociais.

Foto: Cena do filme Orgulho e Preconceito (2005)

Reporteando

A política imita a vida

Renata Colombo
11 de abril de 2018

Por muito tempo, até já adulta, eu não tinha certeza sobre onde me encaixava no espectro político. Eu nem gostava muito de politica porque não acreditava nos políticos. Não gostava de radicalismos. Meus pais votavam no trabalhismo ou na direita, mesmo não sendo radicais, e também não o faziam por ideologia. Minha madrinha já era esquerda roxa. Fazia greve e estava sempre lutando por direitos e igualdade.

Questionava-me se era possível gostar só de um político e não do partido dele, e vice e versa. Me arrepiava com o “Lula lá” desde 89, mas na minha volta sempre falavam mal do PT

Até o dia em que descobri que o posicionamento político da gente tem mais a ver com o nosso posicionamento na vida do que com qualquer outra coisa. Os dois tem extremos, e eu achava errado. Talvez por isso me sentia confusa. Mas foi só perceber que muitos são mais fortes que um só e que defender igualdade e direitos básicos dos cidadãos são obrigações. Foi só olhar para a história é perceber que grandes nações precisaram de radicalismos, de revoluções, para viverem de respeito pleno.

Que se preocupar com os outros e não só consigo mesmo, se revoltar com injustiças e desigualdades, não achar normal gente morando na rua e criança pedindo comida, querer mudar um pedacinho do mundo são parte de uma personalidade, da minha personalidade, genuína de que pensa no próximo, de quem não consegue se ver como indivíduo sozinho no mundo.

Eu cobri dois momentos tristes da nossa história: o impeachment de Dilma Rousseff e a prisão de Lula. Eu cobri uma mobilização popular em cada um destes eventos, de gente que acredita tanto nestes valores que quer recuperá-los.

Acho que agora, já adulta e com a ajuda da minha profissão, minha pergunta foi respondida e as coisas ficaram mais claras. Sim, eu estou triste com o que estão fazendo com a nossa democracia. Sim, nós precisamos de novos líderes políticos e uma geração menos corrupta. Sim, há um grande líder, apesar de você.

Yo No Soy de Aquí

O que Alejandro tem a ver com Sendic, Lula e Temer

Alvaro Andrade
7 de setembro de 2017

Lembro que fazia muito mais frio que agora. Entre um mate e outro, meu primeiro amigo montevideano, o porteiro frenteamplista Alejandro, me apresentava seus conceitos sobre as distorções do regime bolivariano na era Maduro e a vergonha que sentia do ex-colega de faculdade Raul Sendic. Era uma das nossas primeiras charlas, mas logo ali percebi como a política é encarada de forma diferente pelos uruguaios, especialmente à esquerda. Alejandro representa um perfil medio que encontrei por aqui: independente da idade ou ocupação, em geral são politizados, indentificados com valores solidários e humanos, mas nem por isso cerrados em um fanatismo que os coloque em algum pólo extremo do espectro político.

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O motivo da vergonha de Alejandro sobre o hoje vice-presidente do Uruguai e epicentro de um dos maiores escândalos políticos do país nos últimos anos, se deve ao uso de cartões corporativos para despesas pessoais em free-shops enquanto era presidente da estatal de petróleo uruguaia no governo Pepe Mujica

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“En Brasil pasó lo mismo, no?” Me pergunta antes de roncar a cuia. “Si, Alejandro.” Pero en Brasil as coisas foram tratadas de forma diferente, a começar pela própria esquerda. No Uruguay, além do Alejandro e da mídia, O Mujica e a Frente Ampla também consideram errado usar dinheiro público em benefício pessoal. E deixaram isso bem claro.

A FA é uma frente política de centro-esquerda tecida por partidos políticos, movimentos  sociais e sindicais que detém uma grande penetração popular. Há espantosa quantidade de comitês instalados em praticamente todos os bairros do país.  Eles não são poucos: hoje é tão fácil encontrar um frenteamplista na Rambla de Montevideo quanto um Bolsominion na avenida Paulista.

Foto Carlos Lebrato, FA

Diversos setores da coalização que garantiu 15 anos de governo não mediram palavras para apontar os erros do vice-presidente que ajudaram a eleger e era o candidato ficha 1 para a presidência no ano que vem

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O caso será julgado em um tribunal do partido, que analisará um parecer emitido pelos colegas do Tribunal de Conduta Política em que afirma que a atuação de Sendic “..compromete sua responsabilidade ética e política” e denota um “modo de proceder inaceitável”. Eles dão voz à consciência política crítica do Alejandro e 62% dos uruguaios que acreditam que Sendic deveria renunciar.

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Não cedem ao pragmatismo eleitoral, não colocam na perspectiva das realizações de governo, não blindam Sendic como se fosse insubstituível

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Talvez a sanção final que ele irá receber não terá efeitos práticos, afinal, não tem validade jurídica e até agora não pesam sentenças contra ele. Mas a efervescência na base política forçou Sendic a percorrer cada um dos comitês de bairro para dar explicação, pedir desculpas, admitir equívocos e ouvir cobranças.

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Já não faz tanto frio quanto há três meses. Enquanto aqueço a água para o mate, assisto ao vídeo do Lula tentando explicar porque novamente está ao lado de Calheiros e cia. Assisto ao vídeo buscando alguma novidade que justifique o fato de eu ainda cogitar ir até a embaixada brasileira votar em Lula em 2018 para me livrar do Bolsonaro.

Pego a térmica e desço pra charlar com meu amigo.

O elevador abre e logo o Alejandro mostra no celular a foto do bunker de Geddel abarrotado de dinheiro.

Eso parece Narcos! Como ustedes llegaran a tal punto? Me pergunta incrédulo.

Enchi a cuia e apenas respondi que talvez nos faltem mais Alejandros no Brasil.

Foto de capa: Carlos Lebrato, Frente Amplio