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BSV Especial Coronavírus # 21 A aprovação de Bolsonaro e a caça a uma criança violentada

Geórgia Santos
19 de agosto de 2020

Oficialmente, o Brasil já soma mais de cem mil mortos vítimas da Covid19. E estamos há meses com uma média de cerca de mil perdas por dia. Os números atrozes da pandemia de coronavírus, porém, já não parecem afetar a popularidade do presidente Jair Bolsonaro. Pesquisa realizada pelo Datafolha indica que a aprovação de Bolsonaro subiu para 37%, a melhor do mandato, e reprovação caiu para 34%. A pesquisa realizada pelo Poder 360 indicava a mesma tendência e da XP/Ipespe confirmou as anteriores e apontou uma aprovação recorde.

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E em meio a tudo isso, ainda temos que testemunhar o horror a que foi submetida uma menina de 10 anos, estuprada desde os seis pelo tio, dentro de casa
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Ela engravidou, e apesar de ter direito ao aborto, grupos fundamentalistas tentaram impedir o procedimento. A extremista Sara Giromini, conhecida como Sara Winter, divulgou o nome da vítima e o do hospital do qual ela estava internada para interromper a gravidez.

Felizmente, um grupo de mulheres do Recife, esse sim preocupado com a vida de uma criança, montou uma vigília em frente ao hospital e o procedimento foi realizado com a segurança que a lei deveria garantir a todas as mulheres.

Para discutir a desintegração da democracia brasileira, participam os jornalistas Geórgia Santos, Flávia Cunha, Igor Natusch. Você também pode ouvir o episódio no SpotifyItunes e Castbox e outros agregadores.

Vós Pessoas no Plural · BSV Especial Coronavírus # 21 A aprovação de Bolsonaro e a caça a uma criança violentada
Raquel Grabauska

Criança precisa brincar, criança deve brincar

Raquel Grabauska
12 de julho de 2019

Disse o presidente Jair Bolsonaro sobre trabalhar quando era criança:

“Não fui prejudicado em nada. Quando um moleque de nove, dez anos vai trabalhar em algum lugar, tá cheio de gente aí ‘trabalho escravo, não sei o quê, trabalho infantil’. Agora quando tá fumando um paralelepípedo de crack, ninguém fala nada”.

Eu poderia falar sobre a taxa de desemprego no país, que, segundo o IBGE, atingiu 12,5% e representa um número de mais de 13 milhões de adultos sem trabalho. Eu poderia falar sobre a precariedade das escolas, ou sobre a evasão escolar. Também segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, mais de um milhão de jovens entre 15 e 17 anos, por exemplo, estavam fora da escola no ano passado. Eu poderia falar sobre tantas outras coisas.

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Meu pai sustentava nossa casa. Quando eu tinha 11 anos, ele ficou muito doente. E permaneceu doente até eu ter 17 anos, quando ele faleceu. Passou a maior parte desse tempo em hospitais, internado. A minha mãe ficava bastante tempo com ele – e eu também. Isso significa que durante um grande período da minha infância – e toda a adolescência – eu passei trabalhando e/ou em um hospital. Sem vitimismo, é só a minha história. Eu sei como é.

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Mas senhor presidente, vai chupar um prego, por favor!

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Criança precisa brincar. Criança deve brincar. É direito. É o que faz com que se cresça, é como elaboramos as ideias, é o que nos torna adultos com capacidade de aproveitar a vida. E não é aproveitar a vida fumando crack, senhor presidente. É assumindo responsabilidades, descobrindo o prazer de trabalhar.

Meus filhos brincam muito. Criamos um Espaço de Brincar para crianças. Fazemos espetáculos infantis. Podemos não ter os bolsos cheios. Mas temos ideias, criatividade e uma vontade de viver que são impagáveis.

Bônus: Relatório Estimativa Globais do Trabalho Infantil – Organização Internacional do Trabalho (OIT)

 

Raquel Grabauska

Desativei as notificações do WhatsApp

Raquel Grabauska
12 de janeiro de 2019

Tenho me perguntado muito como vai ser quando os meninos tiverem celular. Meu filho de sete anos perguntou se poderia ter um quando completasse dez. Glup, pensei eu. Fiz cara de que tava preparada pra uma conversa normal e perguntei: porque tu precisa? Ele: porque quase todos os meus colegas têm.

Discurso sobre as diferenças entre as pessoas, os tipos de família, as escolhas. Ressaltando que devemos respeitar as escolhas diferentes, mas que por motivos x, y e x, na nossa era assim.

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Discurso, discurso, discurso. Tem horas que ser mãe dá uma canseira… porque eu não tenho a menor ideia do que responder. Ou se tô fazendo a coisa certa. É sempre aquela sensação de ter pulado de um avião e não saber se o paraquedas vai ou não abrir.

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Enquanto eu falava, meu celular apitou umas 512 vezes. E meu olho queria ir conferir o que tinha acontecido. Era algo importante? Era do trabalho? Era um orçamento? Era? Era?

E daí me enxerguei. Preciso ter uma relação mais saudável com meu telefone. Desativei as notificações do WhatsApp e sou bem mais feliz. Ainda olho bastante, faz parte do meu trabalho. Mas vejo no meu tempo, e não porque o celular mandou eu olhar.

Raquel Grabauska

O que meu filho vai ser quando crescer?

Raquel Grabauska
28 de dezembro de 2018

Lembro que adorava ler, quando pequena,  a revista Mad. Tinha uma parte em especial: um quadro com a imagem do que os pais achavam que o filho seria e outro com o filho no futuro, sendo algo absolutamente diferente. Hoje, alguns seriam impublicáveis. Totalmente politicamente incorretos.

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Bom, qual pai/mãe não sonha com o futuro dos filhos? Meu filho mais velho tem sete anos. Ele já “foi ser”: baterista, cientista, matemático e engenheiro da Lego que moraria na Alemanha. Possivelmente, já teve outras carreiras que foram descartadas nesses anos todos.

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Quando ele tocava bateria, eu, mãe artista, me emocionava, exibia, orgulhava. Quando começou a fazer contas de cabeça com seus míseros 7 aninhos, o pai, das Exatas, não cabia em si de felicidade. A cada troca de profissão, novos planos e expectativas. E a torcida silenciosa dos pais pra ver se o guri vai para as Humanas ou Exatas.

Pelo que conheço dele, pelo que conheço de nós, tanto faz. Meu pai queria que eu fosse nutricionista. Morreu no ano em que fiz vestibular para teatro. Antes de eu fazer, que fique claro. Não foi de desgosto, fiquem calmos. Muitas pessoas ficaram com pena: eu era uma boa aluna, com potencial. Como gastei toda aquela inteligência fazendo teatro?

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Eu não sei o que teria feito se meu pai estivesse vivo no vestibular. Não sei se teria tido coragem. A mãe respeitava minha decisão. Não torcia, mas respeitava. Meus irmãos me incentivaram. Eu fiz no impulso.

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Quando vejo meus filhos crescendo, fico torcendo para diminuir minha expectativa. Porque quando a gente está crescendo, a nossa expectativa em relação a nós mesmos já é imensa. Só nesse ano, meu filho começou uma escola nova, aprendeu a ler, teve que extrair dois dentes e depois disso ainda teve dois dentes moles que não caem nunca. Já pensou?! Como dar conta de tudo isso?

Quando vejo que ele já tem sete anos, vejo que ele só tem sete anos. Está crescendo e é uma criança. E vai errar, e vai bater cabeça, e vai… é lindo e difícil. Vou torcer pra que ele cresça bem. Que tenha a sorte de ter pessoas leais por perto. A minha parte eu estou fazendo: deixar ele crescer sendo ele.

*A imagem da capa é de um robô que mexe braços e pernas. Foi construído pelo nosso ilustrador mirim, Benjamin, de sete anos. 

Raquel Grabauska

Dia de praça

Raquel Grabauska
2 de novembro de 2018

Hoje fui para uma praça com os meus filhos. Com a cidade violenta, isso que era um hábito diário, virou artigo de luxo. Mas não é disso que quero falar. Os guris estão com 4 e 7 anos. Então já são mais independentes. Consegui sentar algo em torno de 28 segundos sem ter que atender nenhum deles. Quase deu para tomar um gole de água!

Fomos cedo, então tinha todo o espaço só para eles. Para eles, as manhas, as brincadeiras de dois irmãos capetas. Cúmplices. Inimigos. E inseparáveis com a chegada de uma terceira criança que ameaça a qualquer um dos dois. Não importa o quão brabos estejam um com o outro, é só sentir que o outro está sendo ameaçado por um intruso que toda a briga desaparece. O sentimento de proteção que brota de um pro outro é umas das coisas mais fortes e lindas que já vi.

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Seguindo pela praça, tem um casal desesperado. Um pai e uma mãe correndo atrás de UMA criança, não estão dando conta

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O menino deve ter perto de dois anos, não acordou em um bom dia. Chora porque quer ir no balanço ocupado (o único dos seis balanços que está ocupado), chora porque alguém olhou pra ele, chora por… E corre. E os dois correm atrás dele. Duas irmãs brincam enquanto a mãe está no telefone. As três estão tranquilas, quase nem percebem que tem mais gente por ali. E vão chegando pessoas. E entre um joelho esfolado de um filho e a vergonha do outro por ter caído do balanço, vou olhando aquelas crianças todas e reconhecendo as fases pelas quais já passei como mãe. Estranho ver isso como num filme.

Os primeiros passos, o bebê que come areia, as primeiras quedas, a disputa pelo balanço, a corrida pro colo em busca de proteção… Estamos todos fazendo a mesma coisa, deixando essas crianças crescerem. Eles vão crescer. Cabe a nós estarmos presentes.

Raquel Grabauska

Medo de ter medo

Raquel Grabauska
18 de maio de 2018

Hoje eu tinha muiitas coisas pra fazer e aproveitei o caminho do super até o pilates pra resolver assuntos urgentes com meu marido. Estava saindo do super e disse: “depois a gente continua, tô chegando na rua.” Me deu uma tristeza.

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Ter que parar a conversa por medo de assalto. Que tristeza!

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Porque não é parar só a conversa. É parar a vida. Meu filho mais velho tem sete anos. Meus guris têm dois anos e dez meses de diferença. A infância dos dois tem sido completamente diferente. Há seis anos e meio, íamos diariamente na pracinha. Dias de luxo, íamos de manhã e tarde. Tinha a turma da praça. Trocávamos ideias, colos, desabafos. Na segunda maternidade, notei um esvaziamento das praças. O medo tomou conta geral.

Eu não me rendi para o medo. Tentei ir para a rua. Até ser ameaçada por um dono de um cachorro/pônei que estava com seu mino-mamute sem coleira avançando sobre todas as crianças. As crianças não ocupam as praças? Os cachorros ocupam. Adoro cachorro. Sempre tive. Não tenho agora, mas adoro. Mas adoro ir na praça com as crianças. E não tem dado. Porque os cachorros avançam. E a gente recua.

A gente recua por medo de assalto, por medo de cachorro, por medo do medo. Torcendo por um período de avanços.

Raquel Grabauska

Mãe não pode ficar doente

Raquel Grabauska
12 de janeiro de 2018

Eu nunca tomo remédio. Nunca.  Semana passada, ao acordar, chamei meu marido e, ainda deitada, implorei por um remédio para dor de cabeça. Ele trouxe um, eu queria 30. Realmente estava além do suportável. Isso foi só o dia começando. Dor no corpo, mal-estar, aquela função toda. Vontade de ficar deitada e sumir um pouco.

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Ouço vozes: mamãe, vamos brincar?
Dois filhos sorrindo, aquele sorriso incomparável, irresistível
E a mãe sem força

E como a gente faz?

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Não tem o que fazer. A gente cria forças, levanta e brinca. Poucas vezes fiquei doente a ponto de não dar conta de levantar e ser mãe. A sensação é tão ruim, tão ruim, pior que tomar suco de jenipapo. Deveríamos ter super poderes. É o desejo de toda mãe, ao ver o filho doente, que fosse ela no lugar dele. Mas já pensou se fôssemos atendidas nesse pedido? Não dá, realmente não dá.

Só sei que, nesse dia, virei paciente e fui cuidada por dois médicos. Os melhores. Quando voltou do trabalho, mais cedo que o normal para socorrer uma moribunda, meu marido perguntou como eu estava.

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Nosso filho mais novo respondeu: a mamãe não pode falar, ela tá muito fraca

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Ali relaxei, fiquei fraca e pude descansar. Por 30 minutos, pois os médicos queriam continuar o trabalho deles.

Reporteando

Jornalista é pessoa

Renata Colombo
28 de setembro de 2017

Não tem coisa que me revolte mais como pessoa do que violência, abuso, maus-tratos, abandono, enfim, tudo que envolva crianças. Ao mesmo tempo que me embrulha o estômago, desperta uma raiva que desconheço em mim.

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Engana-se quem acha que repórter é um ser frio, isento por completo ou que jamais se envolve com os fatos. Tem coisas que são difíceis demais de cobrir. Já até contei alguns casos aqui para vocês

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Pois bem. Esta semana ocorreu algo que não cobri, mas me revoltou e fez lembrar de outras coberturas. A história de uma guriazinha de cinco anos que teve uma baita coragem de, após um abuso em pleno supermercado de Porto Alegre, fugir do pedófilo e ainda contar para a mãe o que ocorreu.

Lembrei de uma semana há uns quatro anos. Era repórter em Porto Alegre e passei cinco dias cobrindo três casos de abuso sexual de crianças pelo interior do Rio Grande do Sul. Um delegado contou detalhes sobre um padre que abusava dos coroinhas da igreja. Foi insuportável de ouvir e nem tinha condições de publicar um relato tão escabroso. Os outros dois eram de pais que abusavam das filhas. Recordo bem de um em que a menina tinha somente dois anos. Eu disse dois anos.

É impossível ficar alheio ou não sentir nada diante de fatos como estes. Cada colega procura um meio de liberar sua indignação. Eu falo, escrevo, faço questão de publicar e publicar e publicar coisas como esta para que não se repitam. E que a atitude desta guriazinha sirva de esperança para que as futuras gerações tenham a coragem dela de lutar contra violências como esta. E com isso, quem sabe, as próximas nem tenham motivos para precisar de tanta coragem.

Raquel Grabauska

Sem palavras

Raquel Grabauska
9 de junho de 2017

Isso foi a coisa mais emocionante que vi nos últimos tempos. Aproveitem!