Voos Literários

Batalha literária . Brasil x México

Flávia Cunha
2 de julho de 2018

Passo longe do ufanismo de achar os brasileiros melhores em tudo apenas pela nacionalidade. Por isso, acho difícil saber quem ganharia a batalha literária Brasil e México. Inspirada pelas oitavas de final da Copa do Mundo, proponho uma espécie de super trunfo de livros dos países classificados nessa fase da competição. Para a escolha das obras, criei o seguinte critério: escritores contemporâneos e ainda em atividade. As duas competidoras são de peso e com trajetórias relevantes fora de suas obras. 

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Represente do Brasil . Clara Averbuck, 39 anos

Minibiografia: Gaúcha radicada em São Paulo há alguns anos, Clara foi da primeira geração de escritores a perceberem a Internet como um canal de divulgação para textos literários. A escritora tem uma legião de fãs em suas redes sociais e assumiu publicamente uma batalha a favor do feminismo e das causas LGBT. Não esconde seu posicionamento político de esquerda e mesmo assim tem espaço para escrever colunas remuneradas em veículos da grande mídia.

Livro escolhido para essa batalha: Máquina de Pinball, seu primeiro romance publicado, em 2002

Motivo da escolha: O enredo é corajoso ao mostrar uma protagonista feminina com uma postura junkie, inconsequente e totalmente livre do ponto de vista sexual. A personagem Camila está longe de ser uma heroína e isso é absolutamente libertador para quem acha que livros escritos por mulheres precisam ser necessariamente sensíveis e delicados.

Bônus: O livro virou peça de teatro. Também foi adaptado para o cinema, com o título de Nome Próprio. A escritora não gostou do resultado do filme. Ainda assim, considero que vale a pena conferir o longa-metragem.

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Representante do México . Laura Esquivel, 67 anos

Minibiografia . Professora por formação,  em determinado momento de sua vida acabou escrevendo roteiros para televisão e cinema. A ideia de um roteiro virou um romance, que deu início a uma carreira literária de sucesso. Já consagrada como escritora, elegeu-se deputada em 2015, pelo Movimento de Regeneração Nacional, partido de esquerda

Livro escolhido para essa batalha . Como Água para Chocolate, seu romance de estreia, lançado em 1989

Motivo da escolha . O livro traz uma curiosa combinação de gastronomia e amor, sem cair em clichês. As metáforas culinárias são o ponto alto do livro, assim como a dicotomia entre a tradição mexicana e o desejo de rompê-las. O que poderia ser apenas mais uma história de amor proibido, vai muito além disso.

Bônus . O livro foi adaptado para o cinema em 1992, É considerado um dos 100 melhores filmes mexicanos de todos os tempos e recebeu diversos prêmios. Como Água para Chocolate ganhou uma sequência literária em 2016, chamada O Diário de Tita. Laura Esquivel na época desse lançamento anunciou que o enredo se encerraria como uma trilogia, então resta esperar pelo fim dessa história.

Voos Literários

Diretas Já, feminismo e literatura

Flávia Cunha
13 de junho de 2017

No último final de semana, aconteceram manifestações pelas Diretas Já em diversas cidades brasileiras. Em São Paulo, o protesto realizado nesse domingo teve um enfoque diferente: colocar em pauta os direitos das mulheres. A ideia partiu da escritora Clara Averbuck, sobre quem já escrevi aqui.

Eu respeito o trabalho literário da Clara e também sua coragem em se posicionar politicamente em um período de tanto ódio nas redes sociais e fora delas. A trajetória pessoal de escritores e outras personalidades nem sempre é admirável. Mas existem muitas mulheres que fizeram a diferença e servem de exemplos para todos com suas histórias de vida.

Em homenagem ao ato feminista pelas Diretas Já, selecionei cinco biografias de mulheres poderosas de diferentes áreas. Inspirem-se!!

 Carmen Miranda – A trajetória da pequena notável é contada com maestria por Ruy Castro em Carmen, Uma Biografia.

Clarice Lispector – A obra Clarice, é uma referência para os amantes da literatura, mostrando a vida e obra da escritora pela visão do norte-americano Benjamin Moser.

Frida Kahlo – O livro mostra a intimidade da pintora que transformou sua vida em arte. Frida – A Biografia foi escrita por Hayden Herrera.

Janis Joplin – A roqueira transgressora pela visão da irmã na obra Com Amor, Janis Joplin, de Laura Joplin.

Elis Regina – A cantora Elis Regina têm mais de uma obra dedicada à sua trajetória. Indico Elis, Uma Biografia Musical, escrita pelo gaúcho Arthur de Faria.

Voos Literários

Respeita As Minas (Na Literatura e Em Qualquer Lugar)

Flávia Cunha
7 de março de 2017

Se tem um termo que incomoda grande parte das escritoras é ter sua obra denominada como literatura feminina. O rótulo particularmente me remete a uma moça muito comportada, vestida com babados e frufrus, escrevendo sobre corações partidos, fragilidades e futilidades. No outro extremo, caso fosse usual a classificação literatura masculina, acabaria parecendo inaceitável que houvesse sensibilidade nos textos literários escritos por homens.

Em pleno século 21, o feminismo ainda é uma das bandeiras que precisam estar em evidência, para evitar a desigualdade entre homens e mulheres, em um mundo que já abriu espaço para orientações sexuais diversas e debates de temas considerados polêmicos por muitos, como aborto, por exemplo. Nesse contexto, a literatura dita feminista é um instrumento fundamental para o empoderamento feminino, um conceito que muitas vezes desperta antipatia por parte das pessoas mais conservadoras.

Uma das escritoras mais representativas dessa vertente é a gaúcha radicada em São Paulo Clara Averbuck. Na época do surgimento dos blogs, Clara apresentou aos internautas seus textos densos e diretos, abordando temas como sexo, bebidas e drogas na perspectiva de uma mulher forte e sem frescuras. Em 2002, a escritora lançou sua primeira obra Máquina de Pinball, em que aparece sua personagem mais famosa, Camila. A protagonista desse livro acabou indo parar no cinema, em uma adaptação que não agradou a escritora.

Com o passar dos anos, Clara consolidou sua luta feminista, presente no site Lugar de Mulher, no qual é uma das editoras. Também tem uma presença constante nas redes sociais, com posicionamentos políticos e relatos sinceros sobre o cotidiano de uma escritora sem grana no Brasil: viver de frilas para pagar o aluguel, como criar uma filha adolescente sozinha e sua angústia ao receber diariamente relatos de abusos sofridos por outras mulheres, sentindo-se muitas vezes impotente para dar uma real ajuda a essas manas.

Seu livro mais recente, Toureando o Diabo, traz o retorno da personagem Camila, mais amadurecida e com ideais declaradamente feministas. Não é à toa que a obra é dedicada “às minas – todas elas”. Publicado de forma independente, por meio de financiamento coletivo, o livro tem coautoria da ilustradora Eva Uviedo e pode ser comprado aqui.

Do fim dos anos 40, quando Simone de Beauvoir chocou a sociedade com seu ensaio filosófico O Segundo Sexo (que eu recomendo fortemente a leitura), até os dias atuais, o lugar da mulher é mesmo aonde ela quiser. Inclusive fora de rótulos reducionistas como literatura feminina.

(PS: Certamente falaremos sobre mulheres na literatura em muitos outros posts do blog Voos Literários. Mas o dia 8 de março é marcado por lutas extremamente significativas das mulheres e não como um dia de comemorações. Esse texto é uma singela homenagem a todas as mulheres que enfrentam qualquer tipo de discriminação ou opressão em suas vidas.)