Nós US

Pay Attention to the Details

Sacha
28 de junho de 2017
(pode ler este artigo em português aqui)

This week, the Supreme Court of the United States ruled that parents of the same gender can both be registered on their children’s birth certificates. It was an affirmation of the 2015 sentence that determined the legality of gay marriage across the whole country, no exceptions. This sentence reinforces the full equality of all types of marriage with regard to the rights acquired by married couples. So far, so good. It’s just as important for children as it is their parents the recognition of their fathers (or mothers) as such.

Instead of accepting apparently moderate choices coming from the White House, we must proceed with further more caution

Pay attention, though, to the dissent expressed by the newest judge of the Supreme Court, Neil Gorsuch. Gorsuch was nominated by Trump and confirmed by a Senate in the hands of the Republicans this spring. In his dissent, the judge showed himself to be willing to interpret precedent sentences in the strictest possible manner. When it comes to social issues, he shows himself to be rigidly unwilling to expand minority rights through the courts. Gorsuch seeks to interpret the Constitution as literally and traditionally as possible. This reflex serves a traditionalist vision of society that, it just so happens, conforms itself to the values of the religious right. The judge, beyond those issues, is largely in favor of expanding gun rights—another controversial topic in the country.

For those who may be affected by this type of sentence, Gorsuch is a nightmare of the worst kind installed in the judiciary. The balance of the Supreme Court is the same as it was before the death of justice Scalia. His nomination and confirmation, however, tell us a lot about the judicial vision of both the Republican Party and the president. Instead of accepting apparently moderate choices coming from the White House, we must proceed with further more caution.

Image: diego medrano
Nós US

Não, não querem que tenhas cobertura médica mesmo

Sacha
25 de maio de 2017
(you can read this article in English here)

Parecia a nota final em março quando, para a surpresa de ninguém, o Partido Republicano não conseguiu passar o seu esboço de legislação sobre o sistema de saúde dos Estados Unidos. Foi escrita às pressas sem que o partido tivesse uma ideia esclarecida do que queria fazer para revogar e substituir o nomeado Obamacare, já há vários anos em vigor. Foi tudo um fracasso. Porém, passados dois meses, uma versão não mais bem articulada da mesma legislação foi apresentada novamente e, desta vez, passou. O Senado terá a última palavra sobre emendas e mudanças da proposta.

.

Revela-se um desejo cínico de tirar a cobertura médica que as massas agora desfrutam

.

Basta dizer que a proposta de legislação seria um desastre para os milhões que adquiriram plano de saúde com o Obamacare. Para aplacar a facção conservadora do partido, todo tipo de condição médica existente ou deixava de ser incluido na cobertura, ou teria franquias absurdamente altas. Esta legislação é um ataque frontal à saúde e ao bem-estar da população do país. E não é mera coincidência.

Parte da explicação disso tudo é porque assistência médica não é vista como um direito fundamental no lado conservador dos Estados Unidos, senão um privilégio para quem tiver o poder adquisitivo mantê-la. Segundo a lógica, o interesse não reside no paciente ou segurado, mas sim na corporação que ganha com isso. Acham que a cobertura em massa da população americana gera danos para as seguradoras e provedores de assistência médica. Resta constar que nem a população está disposta a uma reforma de tamanho impacto, nem as seguradoras estão contentes com as mudanças propostas. Revela-se, portanto, um desejo cínico de tirar a cobertura médica que as massas agora desfrutam.

A versão nova da legislação aplacou uma divisão dos conservadores suficiente para passar na Câmara. Não é de todo legislação bem pensada, nem apoiada pelo público. Falta ver se o Senado reconhece o cenário como tal, ou se a saúde for o tema que expulsa os republicanos do poder no Congresso em 2018.

Imagem: Maria Kaloudi
Nós US

No, They Really Don’t Want You to Have Medical Coverage

Sacha
25 de maio de 2017
(pode ler este artigo em português aqui)

It seemed like the last note in March when, to the surprise of no one, the Republican Party wasn’t able to pass its draft legislation on the medical system in the United States. It was written in haste without the party so much as having a clear idea about what it wanted to do in order to repeal and replace the so-called Obamacare, already several years in place. It was a complete failure. However, two months later, a new, no better articulated version of the same legislation was presented and passed. The Senate will have the final word on amendments and changes to the proposal.

What’s left is a cynical desire to strip the medical coverage that the masses now enjoy

Suffice it to say that the proposed legislation would be a disaster for the millions who acquired health insurance under Obamacare. To appease the most conservative faction of the party, all sorts of pre-existing conditions would either no longer be included in coverage plans, or would see their premiums skyrocket. This legislation is a direct attack on the health and well-being of the country’s population. And it’s not a coincidence.

Part of the explanation is that healthcare is not seen as a fundamental right by conservatives in the United States. Instead, it’s considered a privilege for those who have the means to sustain it. By this logic, the interest isn’t in the patient or insured person, but in fact in the corporation that profits off of them. They believe that mass coverage of the American population creates problems for insurance and medical providers. However, neither is the public at large predisposed to such a dramatic reform, nor are insurance and medical providers happy with the proposed changes. What’s left, then, is a cynical desire to strip the medical coverage that the masses now enjoy.

The new version of the legislation appeased enough of the conservatives to pass the House. It’s not at all well thought out, nor supported at large. We’ll see yet if the Senate recognizes that, or if healthcare will be the issue that forces Republicans out of power in the Congress in 2018.

Image: Maria Kaloudi
Nós US

SNAFU, or Situation Abnormal

Sacha
10 de maio de 2017
(pode ler este artigo em português aqui)

It’s important to remember that the political climate in which we live today is not normal. Not because of the extreme rhetoric, no. It’s because of the constant breach of ethics and decorum coming from the White House.

The director of the FBI has just been fired by the president. The president names the directors of many a position, so all the more normal in a transitional government, right? Much to the contrary, as it were. The director of the FBI is named to a fixed 10 year term in the position, regardless of who becomes president. The president can, of course, revoke the position at will, however this is an action generally reserved for situations of dire necessity. In this case, just by chance, James Comey was carrying out an investigation on the connections between Trump and Russia, possible interference in the election, and more.

The most abnormal thing about this administration up to now is its relationship with the press

The firing of James Comey, though, is not the first anomaly in the Cabinet. Candidates who are openly opposed to the intended functions of their departments are being systematically nominated to lead them. The attorney-general was declared too racist to be a federal judge in 1986. The secretary of education wants to dismantle the public education system in favor of radical privatization. Nearly every position could serve as an example.

Among them, the most abnormal thing about this administration up to now is its relationship with the press. Beyond questioning the legitimacy of the traditional press for convenience, it doesn’t hide the fact that it lies and distorts reality. When it came out that Comey had been fired, the White House decided to speak to the…Russian press. It blocked all American media from the press conference, accepting only Russian sources. To say that this is extraordinary is not saying much.

We still don’t know where the investigation into Trump and his campaign will go. In the meanwhile, the actions by Trump demonstrate a worrying abnormality.

Image: abcdz2000
Nós US

Situação anormal

Sacha
10 de maio de 2017
(you can read this article in English here)

Vale relembrar que o cenário político no qual vivemos hoje não tem um caráter normal. Não é pela retórica extrema, não. É pela brecha interminável de ética e decoro vindo da Casa Branca.

O diretor do FBI acaba de ser demitido do seu cargo pelo presidente. O presidente nomeia os diretores de muitos cargos, então tudo normal por um governo em transição, certo? Pois, muito ao contrário. O diretor do FBI é nomeado para cumprir um mandato fixo de 10 anos, seja quem for o presidente. Cabe, sim, ao presidente revogar o cargo à sua disposição, porém, esta ação é contemplada apenas em situações de grave necessidade. Neste caso, por muito acaso, James Comey estava a realizar uma investigação sobre conexões entre Trump e a Rússia, possível interferência na eleição e mais.

O mais anormal desta administração até agora é a sua relação com a imprensa

A demissão de James Comey, contudo, não é a primeira anomalia nos cargos do gabinete. Candidatos abertamente em contra das funções dos seus departamentos são sistematicamente nomeados para os liderar. O procurador-geral foi declarado demasiado racista para servir como juiz federal em 1986. A secretária de educação quer desmantelar o sistema de educação pública a favor privatização radical. Quase todos os postos serviam de exemplo.

Entre todos, o mais anormal desta administração até agora é a sua relação com a imprensa. Além de questionar a legitimidade da imprensa tradicional por conveniência, não esconde que mente e distorce a realidade. Quando saiu que Comey tinha sido despedido, a Casa Branca decidiu falar com a imprensa…russa. Barrou toda a imprensa americana da conferência, aceitando apenas fontes russas. Dizer que o acontecido é extraordinário é dizer pouco.

Ainda não sabemos aonde vai a investigação de Trump e a sua campanha eleitoral. As ações de Trump presidente, no entanto, mostram uma anormalidade preocupante.

Imagem: abcdz2000
Nós US

Manifestações pelo senso comum

Sacha
26 de abril de 2017
(you can read this article in English here)

Não é normal que cientistas e entusiastas da ciência saiam às ruas em defesa de suas práticas. Mas cá estamos.

No sábado passado, milhões de pessoas saíram às ruas pelo mundo inteiro em defesa da ciência. Isto é, a ciência geral. A prática de fazer pesquisas empíricas para chegar a conclusões baseadas em resultados duplicáveis. A base de todo o nosso conhecimento do mundo moderno. Foi tanta gente só nos Estados Unidos que, outra vez, superou os participantes da posse do presidente.

A história do anti-intelectualismo nos Estados Unidos não é nada nova

Para entender tudo isso, é preciso reconhecer o fundamento do apelo dos cientistas: a ciência sofre um ataque existencial aos seus recursos e medidas com a chegada de um executivo notoriamente anti-intelectual. A casta política que envolve o presidente também adota esta posição. Seja por interesses corporativos ou religiosos, há uma corrente notável de anti-intelectualismo nos Estados Unidos. O país figura entre os que menos acreditam na evolução e na mudança do clima no Ocidente, entre outros assuntos básicos de ciência. Há setores céticos a ponto de promoverem movimentos contra a medicina moderna que lhes deu a possibilidade de viver vidas mais longas e com melhor qualidade. E assim continua.

A história do anti-intelectualismo nos Estados Unidos, porém, não é nada nova. Existe desde a fundação das colônias em solo norte-americano, antes de serem sequer estados, nem entre eles unidos. No caso dos Estados Unidos, a Grã-Bretanha não conseguiu exportar o seu modelo de classes sociais, sendo a vasta maioria dos chegados provenientes de classes inferiores no velho mundo. Desde então, a educação acadêmica sofre de uma percepção que varia entre inutilidade, elitismo, improdutividade ou mais além. É um constante por partes maiores ou menores da sociedade até ainda hoje.

É por este ceticismo da ciência que tanta gente marchou nas ruas. Não porque existe em si, mas porque acaba de tomar conta dos mais altos poderes do país. O tônico da fé na auto-suficiência e a ideia de que apenas esforços ambíguos são a chave de sucesso não é só o elixir do homem comum. Agora, um dos grandes partidos já tomou uma dose alta. Os cientistas viram-se obrigados a protestar pelo senso comum que entende o benefício do seu trabalho. Falta ver se o resultado é duplicável.

Image: Thomas Jaggi
Nós US

Marches for Common Sense

Sacha
26 de abril de 2017
(pode ler este artigo em português aqui)

It isn’t normal that scientists and aficionados take to the streets in defense of their work. But here we are.

This past Saturday, millions of people took to the streets across the world in defense of science. That is, science in general. The practice of doing empirical research to come to conclusions based on duplicable results. The base of all of the knowledge in the modern world. There were so many people just in the United States that, once again, they exceeded the attendance of the presidential inauguration.

The history of anti-intellectualism in the United States is nothing new

To understand all of this, it’s necessary to recognize the fundaments of the scientists’ appeal: science is under an existential attack to its resources and means with the arrival of a notoriously anti-intellectual executive. The political caste around the president also takes this position. Whether for corporate or religious interests, there is a notable current of anti-intellectualism in the US. The country factors among those which believe the least in evolution and climate change in the West, among other basic topics in science. Sectors of the country are so skeptical of science that they have developed movements against the very modern medicine that has given them the possibility of living longer, better quality lives. And so on.

The history of anti-intellectualism in the United States, however, is nothing new. It’s existed since the founding of the first colonies on North American soil, before there were even states, much less united ones. In the US, Great Britain did not succeed in exporting its class system, because the vast majority of those who settled the colonies came from the lowest rungs of Old World society. Ever since, education has suffered variously from perceptions of uselessness, elitism, unproductiveness, and much more. It is a constant for larger or smaller parts of society through even now.

So many people marched in the street because of this skepticism. Not because it exists, but because it just took control of the highest powers of the country. The tonic of belief in self-reliance and the idea that only ambiguous effort is necessary for success is no longer just the elixir of the Average Joe. Nowadays, one of the main parties has taken its own hearty dose. Scientists found themselves forced onto the streets to march for the common sense that understands the benefits of their work. It remains to be seen whether the result is duplicable.

Image: Thomas Jaggi
Nós US

A extraordinária política de sempre

Sacha
19 de abril de 2017
(you can read this article in English here)

Vivemos em tempos únicos, num cenário político sem precedentes.  A definição de era extraordinária. Descrevo os dias atuais? Não, você entendeu errado. A política de sempre é a política extraordinária. Até com um tal presidente Donald Trump dos Estados Unidos da América.

Os acontecimentos no mundo não deixam de surpreender, a política também

Muito se tem falado sobre o aumento no risco de conflitos com Donald Trump liderando o país mais rico e militarmente potente do mundo. Isto não deixa de ser uma verdade. Porém, o lado que mais interessa é a ideia de que representa uma divergência profunda do status quo. Em maior ou menor grau, o risco de conflito na escala mundial é um constante desde o fim da Segunda Guerra Mundial, para não esquecermos da Guerra Fria e os diversos conflitos do século XX. Até o medo de guerra nuclear por causa de instabilidade de algum regime não é nada novo. No nosso mundo, já vivemos as mesmas tensões que hoje se apresentam com tanto apelo.

A política resume-se na ação e reação a estes eventos da história. A Crise dos mísseis de Cuba foi, no seu momento, o evento da mais alta tensão política no mundo, com o mais alto risco de guerra nuclear, num cenário de vários pontos potenciais de conflitos na mesma escala. A política surpreende-nos tanto quanto o resumo dos eventos que provoca.

O cenário político transforma-se conforme estes acontecimentos, tornando cada momento o mais incerto e arriscado de sempre

Um dos fundamentos da política é que os atores—os políticos, os regimes, os países como entidades monolíticas—respondem com respeito aos seus próprios interesses. Isto é, agem de acordo com o que consideram promover o seu bem-estar. Simples assim, certo? Não, é mais complicado.

A balança de poder no mundo depende de balanças de poder cada vez mais pequenas. Dois países mantêm a paz ou entram em conflito dependendo da correspondência ou não dos seus interesses internos. Um país mantém um regime estável se conseguir uma balança entre os interesses da sociedade civil e a classe político-militar. E continua assim. Em cada escala, uma balança diferente. A política responde, no seu fundo, a todas estas balanças, fazendo decisões para tentar resolvê-las.

É por isso que cada momento, especialmente com os avanços na tecnologia, é e sempre será o momento mais arriscado da história. Ontem parece estável quando amanhã não tem garantias, deixando de lado o que possa ter negado as garantias antes.

Vivemos a evolução de ideias nada novas

Trump não foi um gênio de garrafa que apareceu do nada. É, na verdade, apenas a evolução de pensamentos e ideologia já existente faz décadas nos Estados Unidos. Bill O’Reilly saiu do ar agora neste ano de 2017 depois de 21 longos anos cuspindo as palavras da ideologia que hoje domina na Casa Branca. O Partido Republicano experimentou cessar todas as atividades do governo por causa do orçamento em 1995, 18 anos antes do mesmo ato causar um escândalo de instabilidade impensável. E mais.

O único que há é uma evolução, em todos os lados, de ideias e pensamentos velhos. É verdade que nunca tivemos uma pessoa de tamanha inexperiência, com tal comportamento, com tais conflitos de interesse na Casa Branca. O que sucede, contudo, tem uma história da qual devemos aprender melhor.

Image: Miral Akbulut
Nós US

The Extraordinary Politics of Ever

Sacha
19 de abril de 2017
(pode ler este artigo em português aqui)

We live in unique times, in a political environment without precedents, the definition of an extraordinary era. Am I describing nowadays? No, you’ve just misunderstood. The politics of ever are extraordinary politics. Even with one certain President of the United States Donald Trump.

What happens in the world doesn’t cease to surprise, politics too

A lot is said about the increased risk of conflict with Donald Trump leading the richest and militarily strongest country in the world. This doesn’t cease to be the truth, but, what’s more pressing is the idea that it represents a profound divergence from the status quo. To a greater or lesser degree, the risk of world conflict has been a constant since the end of World War II, lest we forget the Cold War and the many conflicts of the 20th century. Even the fear of nuclear war due to some regime’s instability, thus, is nothing new. In our world, we have lived through the same tensions that today are brought up with such force.

Politics can be resumed in the action and reaction to events in history. The Cuban Missile Crisis was, in its moment, the moment of greatest political tention in the world, with the highest risk of nuclear war, in a climate of many points of potential conflict at a similar scale. Politics surprises us as much as the summary of the events it provokes.

The political climate transforms itself according to these events, making each moment the most uncertain and risky ever

One of the fundaments of politics is that the actors—politicians, regimes, countries as monolithic entities—respond according to their own interests. That is, they act based on what they consider to promote their own well-being. Simple. Right? It’s complicated.

The balance of power in the world depends on continually smaller balances of power. Two countries maintain peace or enter into conflict depending on the overlap or not of their internal interests. A country maintains a stable regime if it achieves a balance between the interests of civil society and the military and political classes. And so on. At every scale, a different balance. Politics responds, at its core, to all of these balances, making decisions on how to resolve them.

That is why each moment, especially with advances in technology, is and always will be the riskiest moment in history. Yesterday seems stable when tomorrow is not guaranteed, setting aside that which may have negated yesterday’s guarantees.

We live in an evolution of ideas that are not at all new

Trump was not a genie in a bottle that came out of nowhere. He is, in truth, just the evolution of thoughts and ideology that already existed for decades in the United States. Bill O’Reilly was cancelled now in 2017 after 21 long years spitting the words of the ideology that now dominates in the White House. The Republican Party tried out shutting the government down in 1995, 18 years before the same act would cause an unthinkable scandal of instability. And so on.

The only thing there is is an evolution, on all parts, of old ideas and thoughts. It’s true that we’ve never had a person of such inexperience, with such a temperament, with such conflicts of interest in the White House. What follows, however, has a history from which we ought to learn better.

Image: Miral Akbulut
Nós US

3 coisas que o escândalo da United nos ensina sobre a nossa cultura

Sacha
12 de abril de 2017
(you can read this article in English here)

É inevitável ter que enfrentar o que aconteceu com aquele passageiro naquele voo da United Airlines quando falamos de Estados Unidos. O episódio mostra algo sobre onde temos chegado enquanto cultura que, certamente, incomoda.

1. Não conseguimos controlar a nossa indignação

É praticamente possível cronometrar a sequência de acontecimentos cada vez que uma notícia destas aparece, tal é a situação do novo mundo de redes sociais. O caso da United não foi diferente. O nosso mundo tem câmeras disponíveis em qualquer dispositivo portátil e regras novas que permitem o uso delas mesmo no ar. Logo, as imagens do homem sendo arrastado do avião não demoraram em aparecer. E nem tampouco a indignação coletiva.

O que ocorreu é horrível e a reação da empresa só deixou as coisas piores, indiscutivelmente. Mas a sequência trágica já se tornou previsível—cada ataque à humanidade, à dignidade, segue a mesma linha. Virou fórmula para sensacionalizar, sem tratar do Sensacionalista. Indignamo-nos por causa de manchetes e vídeos curtos e perdemos o contexto e um entendimento mais completo do que acontece nestas situações. Não é difícil perceber porque isto não ajuda a melhorar o mal que é a causa delas.

2. As empresas já aprenderam a comercializar essa indignação—mas não são isoladas dela, nem a United

Depois dos acontecimentos em Chicago, a United perdeu em torno de U$ 900 milhões. É uma soma impressionante, mas não é uma reação única. Justo antes, a Pepsi lançou uma propaganda comercializando imagens de luta popular e foi escoriada nas redes sociais por isso. As empresas já veem a nossa indignação como fonte de lucro e aplicam-na em campanhas com vários graus de êxito. Só que, às vezes, o grande lucro desejado pode ser mesmo ao contrário. O poder da indignação não é controlado pelas empresas, por mais que tentem.

3. Temos um problema de brutalidade policial

No fundo, o problema real não foi culpa da United, mas da unidade policial que tratou de remover o passageiro que se recusou a sair do avião. Assim que a companhia aérea se viu obrigada a chamar a polícia para tratar de uma situação de beligerância aparente, passou a responsabilidade pelo acontecido aos policiais. E na tradição da polícia de Chicago, não foi com calma e gentileza, como se vê nos múltiplos vídeos. Eis o problema.

Desde a morte em 2014 do jovem negro Michael Brown pelas mãos de um policial depois exonerado, a brutalidade policial e a injustiça têm surgido como tema na política americana. Os casos já são inúmeros e a cada semana temos mais algum, mais um exemplo deste desserviço à população. E nestes cinco anos, pouco ou nada se tem feito para encarar a agressão policial, a militarização de polícia civil ou as injustiças, claramente documentadas, cometidas pela polícia. Temos um problema de brutalidade policial que se agrava com os avanços na tecnologia e incrementos nos orçamentos. Sem confrontar este problema, haverá mais polémicas ao estilo United.

Imagem: Juha Martikainen