Cursos
Geórgia Santos
17 de setembro de 2019

O Vós traz ao mercado um curso que prepara jornalistas para atuação na área política. O trabalho do jornalismo político é bastante complexo por natureza, mas o cenário deve ser ainda mais difícil no próximo ano no que tange à análise e reportagem. Por outro lado, a renovação nos poderes Executivo e Legislativo traz oportunidades de trabalho na área de assessoria. Mais do que nunca, o jornalista precisa estar preparado para compreender as complexidades de um Brasil polarizado.

O curso Os Três Lados do Jornalismo Político tem três módulos – que podem ser feitos separadamente – e traz profissionais experientes e conceituados para preparar jornalistas em todas as frentes demandadas pelo mercado: análise política, reportagem e assessoria de imprensa.

VAGAS LIMITADAS

Duração . 12 horas-aula o curso completo / 4h por módulo

Público-alvo.  estudantes de jornalismo, jornalistas e profissionais de áreas afins

DATAS 

Assessoria – 27/09, das 18h30 às 22h30

Análise – 28/09, das 8h ao meio dia

Reportagem – 28/09, das 13h às 17h

Local . Núcleo Apache. Rua Lima e Silva, 601, Loja 05.

PROGRAMAÇÃO

Módulo 1. Assessoria de imprensa com Marcelo Nepomuceno (27/09) 

Conjuntura política e o papel do assessor;

Assessoria no ambiente político (governos executivos, parlamento e judiciário)

Relacionamento com a imprensa;

Ferramentas de comunicação

Comunicação proativa e reativa

Estrutura de assessoria de imprensa

Mensuração de resultados

 

Módulo 2. Análise política com Geórgia Santos (28/09)

Atual conjuntura político-institucional do Brasil;

Democracia brasileira e presidencialismo de coalisão;

Identificando ameaças à democracia;

Análise, comentário político e posicionamento;

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Módulo 3 . Reportagem política com Igor Natusch (28/09)

Limite entre comentário e reportagem;

Reportagem política;

Reportagem política pós-eleição;

Relação com a fonte;

Impacto das redes sociais;

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PROFESSORES

 

Geórgia Santos . Jornalista, cientista política e Doutora em Ciências Sociais.  Formada em jornalismo 2009/2 pela Famecos, é mestra em Comunicação Social pela PUCRS, mestra em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Políticos (IEP) Universidade Católica Portuguesa e doutora em Ciências Sociais da Escola de Humanidades da PUCRS, com período sanduíche na University of California – Irvine, nos Estados Unidos, onde estudou sob a tutela de nomes conhecidos nas áreas de movimentos sociais e política do confronto: David Snow e David Meyer.

Ao longo da carreira, foi repórter de política e apresentadora da Rádio Guaíba e Rádio Gaúcha, e também trabalhou como assessora de comunicação na Assembleia Legislativa. Foi professora das disciplinas de radiojornalismo da Famecos (PUCRS). Atualmente, é editora-chefe do Vós, uma plataforma de jornalismo experimental.

Igor Natusch . Jornalista, formado em 2008 pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Atuou como operador de câmera e editor de vídeo antes de consolidar-se na reportagem. Trabalhou no portal de notícias Sul21, como repórter e editor, e escreveu matérias para veículos como Agora SP, Superinteressante, Aventuras na História, Carta Capital, Rede Brasil Atual e The Intercept Brasil, entre outros. Hoje, atua como repórter do Jornal do Comércio, de Porto Alegre, além de seguir produzindo material jornalístico para vários sites e publicações do país. É também escritor, tendo publicado seu primeiro livro, “Senhor Gelado e Outras Histórias”, no final de 2016.

Marcelo Nepomuceno . Jornalista, pós-graduando em Comunicação Corporativa na ESPM, com 14 anos de atuação em Comunicação Pública e Relações Institucionais. Foi Secretário de Estado da Comunicação do Rio Grande do Sul (2014); Superintendente de Comunicação e Cultura (2017) e Diretor de Jornalismo da Assembleia Legislativa do RS (2009). Também foi assessor de imprensa do governador do Rio Grande do Sul (2011 a 2013), além de assessor de imprensa parlamentar (2014 a 2010) na Assembleia.

Igor Natusch

Isso aqui não é notícia! – ou, protestos na Argentina e nosso amor por fake news

Igor Natusch
20 de dezembro de 2017

Já comentei por aqui em tempos idos como a produção e disseminação de fake news é uma indústria, que nos oferece argumentos convenientes em troca do nosso engajamento e, é claro, de dinheiro. É um círculo vicioso extremamente nocivo para a discussão política e para toda a sociedade – e tivemos mais uma prova nos últimos dias, quando muita gente jurou de pés juntos que argentinos estavam gritando “isso aqui não é o Brasil!” durante os protestos contra a reforma previdenciária em curso naquele país.

Multidões identificadas com o pensamento progressista e contrário às medidas que vêm sendo adotadas por Michel Temer no Brasil acabaram disseminando a suposta informação. Eu mesmo, confesso, recém chegado de viagem e um tanto desligado do noticiário, cheguei a acreditar, durante algum tempo, que pudesse ser algo verdadeiro. Uma notícia que, como denunciado por usuários do Twitter e depois demonstrado pelo site E-farsas, não tem qualquer base identificável na realidade.

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Não existem registros em vídeo, relatos nos jornais locais, menções ao grito entre usuários argentinos de redes sociais, nada. Absolutamente nada

 

Se gritaram, não foi possível, pelo menos por enquanto, provar – e se não é possível provar, noticiar para quê?

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O primeiro a noticiar a suposta bomba por aqui foi o site Brasil 247 – não vou dar link porque né, trata-se de uma não-notícia e não merece ser disseminada. Mesmo não sendo um espaço “clássico” de fake news, o portal está (com todo o respeito) notoriamente distante de ser um veículo comprometido com apuração exaustiva ou com a credibilidade das informações que divulga. De onde terá tirado dados que corroborem o que divulga? Não se sabe, e pelo jeito não se saberá em momento algum.

Mesmo sendo altamente enviesado em sua cobertura, e mesmo sem apresentar qualquer evidência daquilo que afirmava em sua matéria, o Brasil 247 conseguiu atingir o coração e a imaginação de milhares de pessoas. Jogando não apenas com a insatisfação diante de reformas sem debate com a sociedade e que mudam (ou mudarão) drasticamente a vida da maioria da população, mas também com o sentimento de desamparo causado pela ausência de protestos nas principais cidades brasileiras. E tendo a publicação compartilhada, obtendo acessos, conquistando espaços de debate. Com uma informação que, repetindo, de informação mesmo não tem quase coisa alguma. Com uma matéria que, no mínimo, foi publicada antes de assar adequadamente no forno – se é que não foi para a mesa do leitor completamente crua, mesmo.

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Isso funciona, é claro, porque ninguém – absolutamente ninguém – está imune à tentação do viés de confirmação

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O questionamento incansável às falsas notícias do lado de lá não é o mesmo quando a manchete encaixa com nossos discursos, quando diz algo que nos é interessante que seja realidade. Não estavam compartilhando por aí que Bono Vox, o vocalista do U2 engajado com causas sociais, viria ao Brasil participar da mobilização de apoio a Lula no julgamento no TRF-4 – algo que a própria “fonte”, senador Roberto Requião, já deixou claro que era uma afirmação hipotética e não um anúncio? Requião mencionou o nome do músico, e isso basta. Que venham as manchetes e os memes!

Muito difícil ver boas perspectivas em um cenário onde a não-notícia só precisa ser agradável para ser tratada como verdade – ainda mais em um lugar como o Brasil, onde a importância da imprensa como salvaguarda democrática nunca chegou a se consolidar de fato. Estamos reféns de nós mesmos, de nossa vontade de ter proeminência em um debate transformado em gritaria de malucos, onde o principal valor é apenas determinar quem grita mais alto. Se a ignorância nos serve, assinamos contrato na hora, sem ler as letrinhas miúdas – e esse é o cenário de sonhos para quem, sem nenhum fato a seu favor, seguirá inventando pseudo-fatos para virar o jogo político na direção desejada. Uma falta de escrúpulos que não tem restrições ideológicas, como se vê.

Prendam a respiração, que 2018 vai ser um negócio daqueles.

Foto: Câmara de Deputados da Nação Argentina

Igor Natusch

As fake news apenas dizem o que você quer ouvir – e lucram bastante com isso

Igor Natusch
11 de outubro de 2017

A completa degradação do debate político no Brasil tem muitas camadas, como uma cebola que apodrece de fora para dentro e não o contrário. Uma delas, com certeza, é o descrédito dos atuais veículos de imprensa.

Semana passada comentei sobre o editorial do Estadão defendendo Michel Temer como talvez uma mãe amorosa não defendesse um filho, e tivemos recentemente casos de crítica que beiram o absurdo, como um protesto chamando a Rede Globo de esquerdista – algo que, convenhamos, só alguém completamente desligado dos últimos 30 ou 40 anos de noticiário pode considerar minimamente crível. Por outro lado, sites de “notícias” que publicam qualquer besteira como se fosse um fato “ignorado” pela mídia hegemônica proliferam como mato, direcionados a leitores de todos os espectros políticos – que, é claro, vão até eles de forma ávida, em busca da “verdade” que o jornalão e a emissora de tevê estão escondendo da população.

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As duas situações se alimentam da mesma tendência (uma das tantas que já existiam meio que desde sempre, mas que as redes sociais aparentemente ajudaram a multiplicar): a de enxergar a notícia como confirmação de ideias já existentes, ao invés de el

emento para a formação de opinião

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O jornal de grande circulação mente e/ou é desprezível apenas quando noticia algo do meu desagrado – afinal, se a notícia é prejudicial ao “outro lado”, lá vou eu compartilhá-la sem nenhum constrangimento. E tanto faz a credibilidade do “veículo” que sigo e/ou reproduzo, desde que a manchete reflita a suposta convicção que já carrego dentro de mim. Ou será possível acreditar que ninguém jamais percebe que está difundindo informações falsas ou, pelo menos, pouquíssimo confiáveis? Percebem sim, e muitas vezes – mas seguem dando likes e RTs, seguem postando em seus perfis, seguem compartilhando com os contatos do Whatsapp. Não importa se é real: o importante é que diga a coisa que desejamos ler ou ouvir.

O que nos leva à curiosíssima notícia, produzida pela Vice, dando conta de que o site JornaLivre (que é, basicamente, um espaço pseudo-jornalístico onde o MBL vende suas ideias e ataca seus desafetos) usa um script que lucra criptomoedas às custas dos leitores, usando o processador de máquinas alheias para tal. Todos os que visitavam o domínio acabavam sendo vampirizados, seja pelo MBL ou por pessoas nas sombras que sequestraram o site para tal fim. É um caso ilustrativo, pois leva às raias da caricatura algo que, para quem parar um pouco para pensar, já seria bem claro: esses sites não mentem e distorcem por prazer ou idealismo, mas para obtenção de poder – político, sim, mas acima de tudo econômico.

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Permita-me repetir: esse pessoal está se lixando para o que você acredita ou não

Eles querem se aproveitar de você para se dar bem

E para ganhar grana. Muita grana

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Como todas as coisas, a ignorância também é um negócio. E alimentar essa ignorância com uma ração diária de pseudo-fatos tornou-se um nicho bastante lucrativo. Para quem usa Google Ads e lucra horrores com acessos, para quem usa acessos para acumular bitcoins – e para quem, desvinculado de escrúpulos, vai usar e muito esse recurso para tentar se dar bem em 2018. O MBL, por exemplo, faz altas articulações com olhos voltados à eleição presidencial do ano que vem – e o JornaLivre, umbilicalmente ligado ao MBL, tem uma função um tanto óbvia nesse panorama.

O mais curioso é que esse pessoal traz, no próprio caráter de seu conteúdo, o antídoto para a perda de leitores. Afinal, as mais de 12 milhões de pessoas difundindo notícias falsas estão bem satisfeitas com o conteúdo que repassam, e vai devolver o rótulo de “fake news” a qualquer veículo que fale outra coisa, seja ele sério ou não. Os que criticam o JornaLivre são desonestos, estão contaminados pelo esquerdismo, e são eles que produz material falso para atacar quem revela a verdade pelo outro lado – é isso que o JornaLivre possivelmente diria diante de uma acusação, e é o que a multidão de pessoas que compartilha seu conteúdo vai aceitar, em questão de segundos, como a explicação mais aceitável.

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Como todas as coisas, a ignorância também é um acordo. E só encontrando um mecanismo que encoraje as pessoas a romper esse acordo em nome de um conhecimento mais pleno será possível a nós – os que acreditam no jornalismo e os que acreditam na política – combater essa tendência cada vez mais assustadora

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Imagem: Reprodução da página inicial do JornaLivre, mostrando a presença do script mineirador de criptomoedas. Publicado originalmente pelo site da Vice.