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Bendita Sois Vós #68 Os debates e o jogo do certo ou errado

Geórgia Santos
27 de julho de 2022

Nesta semana, o jogo do certo ou errado. Começamos por estratégias de campanhas que não incluem debates ou confrontos, passamos pelo desabafo de Dilma e chegamos à vida fácil de Bolsonaro. Quem erra e quem acerta na política brasileira?

Depois de não participar dos debates da eleição de 2018, Jair Bolsonaro repete a dose. O agora presidente e candidato a reeleição se dedica às lives, sem filtro e sem contestação. Ou seja, mais do mesmo. Ele não se expõe à questionamentos e, assim, fica menos vulnerável. A novidade de 2022 é que essa também parece ser a estratégia do candidato do PT. Luiz Inácio Lula da Silva não aceitou participar das sabatinas da Globonews, por exemplo, e agora fica a dúvida se comparecerá aos debates ao longo da campanha.

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Ele está certo? Há quem diga que sim, há quem diga que não. E a gente, é claro, vai dar esse pitaco

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Mas o jogo do certo ou errado não para por aí. A semana na política brasileira foi agitada. O ex… presidente … Michel Temer deu uma entrevista em que disse que a ex-presidenta Dilma Rousseff é uma mulher honestíssima. Ela respondeu: ‘Não use minha honestidade para aliviar sua traição’. E então, ela fez bem ou pode ter atrapalhado a campanha de Lula?

E continuando a brincadeira, ainda tem uma articulação para tornar Bolsonaro um senador vitalício e o pedido de arquivamento das conclusões da CPI da Pandemia. Bom, essas duas últimas é bem fácil de responder se é certo ou errado.

A apresentação é de Geórgia Santos. Participam Flávia Cunha, Igor Natusch e Tércio Saccol. Você também pode ouvir o episódio no Spotify, Itunes e Castbox.

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Bendita Sois Vós #67 Golpismo tipo exportação?

Geórgia Santos
20 de julho de 2022

Nesta semana, a admissão de que somos reféns de Bolsonaro. Eu relutei ao longo de quatro anos de dar nome a isso, mas é ele quem define nossa agenda. Ou seja, vamos falar do encontro golpista de Jair com embaixadores em Brasília, uma espécie de golpismo tipo exportaão. E de Anitta, é claro. Porque ela também manda na gente.

Na última segunda-feira, o presidente da república, Jair Bolsonaro, organizou uma reunião com embaixadores estrangeiros no Palácio da Alvorada. O encontro foi mais uma investida contra o sistema de urnas eletrônicas. O encontro foi mais um anúncio de golpe. Mais uma ameaça ao sistema democrático. Mais um recado sobre envolver as Forças Armadas e os aliados.

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Os embaixadores reagiram constrangidos enquanto ele esperava uma ovação

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Lembrando que Jair Bolsonaro é candidato a reeleição e usou a estrututa do governo para isso. Mas afinal, é grave? Existe chance de golpe? Ele tem essa força? A gente vai discutir justamente isso. Mas sem deixar de falar na treta envolvendo Anitta, o PT, Lula, Bolsonaro e tuiteiros e tuiteiras deste nosso Brasil varonil.

A apresentação é de Geórgia Santos. Participam Flávia Cunha, Igor Natusch e Tércio Saccol. Você também pode ouvir o episódio no Spotify, Itunes e Castbox.

Vós Pessoas no Plural · Bendita Sois Vós #67 Golpismo tipo exportação
 
Foto: Clauber Cleber Caetano/PR
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Bendita Sois Vós #66 Não é a polarização

Geórgia Santos
13 de julho de 2022

Nesta semana, a violência da e na política brasileira e o horror a que as mulheres estão submetidas nesse país. E não é culpa da polarização.

No último final de semana, em Foz do Iguaçu, no Paraná, um apoiador de Bolsonaro invadiu uma festa de aniversário e matou o guarda municipal e tesoureiro do PT Marcelo Aloizio de Arruda, de 50 anos a tiros.

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O agente foi assassinado no salão de festas de uma associação, na frente da própria família

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Marcelo estava tendo uma festa temática do PT. Imagens de Lula, estrelas, muito vermelho. Foi quando o policial penal federal Jorge José da Rocha Guaranho entrou no local gritando: “aqui é Bolsonaro!”. A polícia ainda investiga se o assassinato teve viés político.

Pra tirar o dele da reta, o presidente da República teve a cara de pau de telefonar pra família de Marcelo. O guarda que foi assassinado pelo posicionamento político tem familiares bolsonaristas e eles se dispuseram a ouvir Bolsonaro, que até então não tinha prestado condolências e se disse vítima da mídia.

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Autoridades e políticos culpam a radicalização, a polarização, mas a gente vai discutir isso. Ou melhor, questionar isso

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E como se não bastasse, um anestesista foi preso no Rio de Janeiro após estuprar uma mulher DURANTE o parto. O anestesista Giovanni Quintella Bezerra, de 31 anos, foi preso em flagrante.

A apresentação é de Geórgia Santos. Participam Flávia Cunha e Tércio Saccol. Você também pode ouvir o episódio no SpotifyItunes e Castbox

 

Vós Pessoas no Plural · Bendita Sois Vós #66 Não é a polarização
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Por uma vacina contra a desinformação

Tércio Saccol
13 de julho de 2022
Campanhas e mentiras ameaçam vacinação infantil

Mentiras e falta de engajamento ameaçam vacinação infantil no país

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Por Flávia Cunha, Geórgia Santos e Tércio Saccol (Última atualização em 15/11/22)

Imagine uma criança com fortes dores de cabeça, fadiga persistente, dores nas articulações, problemas respiratórios de toda a sorte, erupções na pele e palpitações cardíacas. É desesperador. Trata-se de um quadro consistente com os sintomas do que se chama de Covid longa. Cientistas da University College de Londres (UCL), no Reino Unido, foram os primeiros a oferecer uma definição padronizada para esta condição. Segundo ele, é um conjunto de sintomas que prejudicam o bem-estar físico, mental ou social das crianças e persistem por pelo menos 12 semanas após o primeiro teste positivo para covid-19. Algo bastante diferente de um resfriado leve ou gripezinha. E este nem é o pior cenário, afinal, a doença pode matar.

Segundo dados do grupo Observa Infância, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Covid-19 matou duas crianças com menos de cinco anos por dia no país. Ao todo, 599 crianças nessa faixa etária faleceram pela Covid-19 em 2020. E em 2021, quando a letalidade aumentou em toda a população, o número de vítimas infantis saltou para 840. Isso sem contabilizar os dados deste ano.

“Perder uma só criança para uma doença que tem vacina, é uma imensa tragédia”, desabafa Akira Homma, assessor científico sênior de Bio-Manguinhos/Fiocruz. E por essa lógica, sensível e precisa, o Brasil testemunha imensas tragédias todos os dias, porque já há imunizantes disponíveis e, mesmo assim, muitos pais se recusam a vacinar seus filhos. E o problema é ainda maior do que se imagina, porque não é apenas a vacina contra a Covid que vem caindo de popularidade. A cobertura vacinal para doenças já erradicadas cai de maneira expressiva há alguns anos. Os motivos são múltiplos, mas, de acordo com os especialistas ouvidos pela reportagem, a desinformação encabeça a lista.

“A Anvisa, lamentavelmente, aprovou a vacina para crianças entre 5 e 11 anos de idade. A minha opinião que eu quero dar para você aqui: a minha filha de 11 anos não será vacinada. E você vai vacinar teu filho? Contra algo que o jovem, por si só, uma vez pegando o vírus, a possibilidade dele morrer é quase zero? O que que tá por trás disso? Qual é o interesse da Anvisa por trás disso daí? Qual o interesse daquelas pessoas taradas por vacina, é pela sua vida?”

Jair Bolsonaro, 2022

Desde que o debate sobre a vacinação infantil contra a Covid começou, o governo federal manifestou ressalvas e críticas ao imunizante para crianças. Mesmo seis meses depois da imunização de crianças de 5 a 11 anos contra a Covid ter sido aprovada pela ANVISA, quase 40% deste público não tomou sequer a primeira dose. Isso de acordo com os dados do próprio Ministério daSaúde. “Quando uma autoridade também fala sobre o problema de vacinação, quando uma autoridade da República fala que quem se vacinar vai virar crocodilo, tem uma população que segue a liderança. É um prejuízo à saúde pública enorme”, ressalta Akira Homma.

O presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações e membro do Comitê de Infectologia da Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul, Juarez Cunha, analisa que esses discursos institucionais e o acirramento da polarização contribuem para diminuir a confiança da população nos imunizantes. “A polarização acabou gerando uma desconfiança na ciência. Isso nunca tinha sido visto. Tanto que assim, a cobertura vacinal de primeira dose contra a Covid no Brasil não chega a 65%. Quantos não internaram? Em quantos não foi feito o diagnóstico? O nosso número de óbitos em crianças e adolescente é 15 vezes maior, por Covid, do que as crianças americanas. Uma doença que já é considerada imunoprevenível para formas graves”, diz.

E mesmo que a vacina contra a Covid tenha gerado um debate mais visível, principalmente por causa das mais de 671 mil vidas perdidas, o fenômeno é bem mais amplo.

Há vários elementos que contribuem para aumentar o poder da desinformação para além do emissor, e um deles é a velocidade com que podemos trocar mensagens sem qualquer filtro, turbinando o acesso às versões dos fatos e não aos fatos. É possível que você tenha encontrado mais desinformação especificamente sobre vacinação infantil do que sobre própria vacinação em geral. A publicitária Clarissa Barreto, de 43 anos deparou com muitas mentiras nas redes sociais. Mas a mãe do Rafael, que tem oito anos, se assustou mais com o que ouviu pessoalmente. “Eu acho que na primeira vez que eu ouvi falar que alguém era anti-vacina, o meu filho tinha a mesma idade do filho dessa pessoa e ela não era “anti” todas as vacinas, ela era contra algumas vacinas específicas, porque rolava uma Fake News de que causava autismo, enfim. E eu não sabia que ela era anti-vacina e ela me pediu uma indicação de pediatra. Eu passei para minha pediatra e daí a minha pediatra atendeu ela e no final a pessoa disse que não queria vacinar o filho com algumas vacinas. Eu lembro que a minha pediatra disse que deveria existir o nome de “filicídio” para isso. Porque tu não querer vacinar o teu filho é tu expor o teu filho à morte”, disse.

Pois o termo filicídio existe e se refere justamente ao pai ou mãe que mata o próprio filho ou ao ato em si. Mas pode parecer uma expressão forte demais para quem não percebe a gravidade do problema. Certamente soa como injusta aos pais que são levados a crer que estão protegendo os seus filhos.

A reportagem conversou com alguns pais e mães que não quiseram vacinar os próprios filhos em off, por isso eles não serão identificados, mas a resposta mais comum é que os filhos não serão cobaias de imunizantes experimentais, embora não seja o caso da vacina contra a Covid, que já passou dessa fase e foi aprovada pelos órgãos competentes. Outro argumento é uma espécie de pesagem de prós e contras. Esses pais entendem que os riscos da vacinação são maiores que os riscos da doença, ignorando o fato de que milhares de crianças já morreram em função do coronavírus e nenhuma faleceu em decorrência da vacinação.

No caso específico da Covid, na avaliação do médico Fabrizio Mota, que atua como supervisor médico do Controle de Infecção e Infectologia Pediátrica da Santa Casa de Porto Alegre, há um erro estratégico na comunicação. “Acho que na pediatria, o primeiro aspecto é que foi feito uma análise incorreta do impacto da doença nas crianças. Sempre, desde o início da pandemia, olhava-se os números das crianças proporcionalmente a dos adultos e idosos. E a gente não pode fazer isso, é um erro de análise muito grave. E todos nós fizemos. A gente deveria olhar a mortalidade infantil pela Covid não comparando com idoso, mas sim mortalidade infantil causada pelo vírus da influenza, pelo adenovírus, pelos outros vírus respiratórios ou outras doenças infecciosas em pediatria. E quando a gente olha esses números, eu comparei os números da Covid em crianças abaixo de 5 anos no ano passado, 2021, com a média de óbitos que a gente tinha por influenza e eu vi que a gente tinha em média três a cinco óbitos anuais no Estado do Rio Grande do Sul, abaixo de cinco anos. E quando a gente olha a Covid em 2021, a gente teve em torno de 14 óbitos nessa faixa etária.”

E essa ameaça, esse senso de que a doença pode efetivamente afetar a nossa vida é algo importante para nos manter mobilizados. Se por um lado a Covid se manteve como uma pauta ativa nos noticiários, outras doenças ficaram um pouco de lado. Além disso, tem o valor investido na comunicação. Um dado levantado pelo site Repórter Brasil junto ao governo mostrou que em 2021 o governo gastou 52% a menos nas campanhas da gripe e multivacinação do que no ano anterior. “As campanhas de vacinação não tem sido apoiadas por campanhas de informação que sejam suficientemente agressivas. Eu não sei se a palavra agressiva é muito forte, mas suficientemente fortes e específicas a convencer a população para se vacinar”, diz o Dr. Akira Homma.

Mas tem mais. Constância é uma variável enorme para a efetividade dessas campanhas, como lembra Patrícia Blanco, Presidente do Instituto Palavra Aberta, que busca promover educação midiática e acesso a informação. Segundo ela, novos pais, com novas visões de educação, surgem a cada momento. Ou seja, as conquistas de informação não estão simplesmente dadas. “Comunicação é constância”, pontua Patrícia, indicando que quando o assunto é comunicação de interesse público, não se pode considerar que o problema está resolvido.

“Todo dia nascem novas pessoas, todo dia a gente tem novas gerações de pais de mães que chegam e que começam a se questionar. E a gente baixou a guarda no momento em que não poderia baixar, porque a gente via crescer o número de movimentos anti-vacina”, explicou. Baixou-se a guarda a partir de uma ideia de que a população brasileira já tinha uma cultura vacinal apropriada, propícia para receber esse processo de vacinação, que aceitava a vacinação como sendo mandatória, mas era uma ilusão. Segundo o Dr. Akira Homma, a cobertura vacinal vem caindo no Brasil há anos. “A queda da vacinação já estava acontecendo há uns cinco anos. A pandemia só acentuou essa queda.” Ou seja, a Covid não é o nascedouro dessa queda dos dados, é só mais um contexto modificador.

O movimento de desinformação acentua uma queda já verificada nos últimos anos nos índices vacinais entre crianças

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Juarez Cunha, que atua na Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul e na Sociedade Brasileira de Imunizações explica alguns fatores que são fundamentais para consolidar esse contexto. São chamados de os três Cês: Complacência, Conveniência e Confiança

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Complacência se refere às doenças que as pessoas não conhecem, não viram, justamente porque foram vacinadas e daí elas acham que não precisam se vacinar ou vacinar seus filhos. Então esse é um exemplo da pólio e do sarampo, que acabou voltando pelas baixas coberturas vacinais. Conveniência é mais relacionado com a estrutura física da nossa rede, dos nossos quase 40 mil postos de vacinação, salas de vacinação que a gente chama no Brasil. Estrutura física, horário de atendimento e Recursos Humanos. Então, a gente teve uma desvalorização dos nossos profissionais da rede. A pandemia deu uma segurada nisso porque a tendência é que com certeza seria mais desvalorizada e mais sucateado, o nosso SUS e o nosso PNI. E a Confiança passa muito pelo produto. Então tu tem que ter confiança na eficácia e na segurança. E tu tem que saber explicar isso. Agora, a confiança, no meu ponto de vista, dos três cês, é o que mais se abalou com tudo isso. Porque, infelizmente, de 2019 para cá, não interessa mais a posição da ciência. Ou tu é a favor ou tu é contra, dependendo do que que tu acredita em termos políticos, em termos de polarização.”

João Henrique Rafael é analista de comunicação do Instituto de Estudos Avançados da USP Ribeirão Preto. Ele coordena a União Pró-Vacina, que é um grupo que articula governos, órgãos da sociedade civil e institutos para pensar atividades justamente para combater a desinformação sobre vacinas. Embora o grupo tenha sido criado em 2019, as análises sobre grupos que espalhavam desinformação sobre a vacina se potencializaram mais durante a pandemia. João Henrique nos lembra que há diferentes eixos que nortearam esse grupo e sustentaram o alcance dessas mensagens, alcançando pais e educadores e afetando as vacinas para crianças. O Facebook e os grupos foram o principal locus de desinformação, uma espécie de polo de monitoramento.

“O primeiro eixo a gente chamou de ideológico, que foi fomentado com esse novo movimento anti-vacina inglês, que é a questão de associar a vacina com autismo, de vacinas com doença. Então tem um grupo de pessoas na internet que acreditam e eles não se importam com evidência, eles têm para eles que a verdade é essa. E aí você tem todo um leque de eixos de informação, até que a vacina é um agente para diminuir população. Então você começa a misturar outras narrativas e desinformação conspiracionista. Ou até a parte mais prática, que é aquela das Big Pharmas que querem lucrar, então a vacina deixaria as pessoas doente para depois vender. Mas são pessoas que o interesse delas é esse, elas foram convencidas e começam a entrar numa espiral e cada vez mais consumir nesse tipo de conteúdo e vão reforçando as suas crenças e querem convencer os outros, como se fossem salvadores. Só eles conhecem essa grande verdade. Eles precisam libertar. Algo quase religioso e fundamentalista.”

Mas nem tudo é paixão ideológica. Há também um eixo comercial. “São aqueles sites e aquele pessoal que sabe que o jogo da internet é baseado em clique. Então se tem pessoas que consomem conteúdo anti-vacina, eu fabrico. O cara entra no meu site, clica e eu vendo anúncios. Eu ganho com anúncios. Então junto com o eixo ideológico vem esse eixo muito forte comercial em sites como Natural News, coisas assim. Onde você já tem as versões americanas e o pessoal estava tentando emplacar no Brasil”, explica João Henrique.

Mas o eixo ideológico é o principal motivador de consumo, pelo menos. É evidente que o aspecto “político” passou a guiar o debate sobre os ditos efeitos da vacina, primeiro entre adultos e depois para crianças. “A pandemia foi politizada. A ciência acabou sendo politizada nesse sentido de você ter lados”, disse ele. “A gente ficou muito preocupado, porque se as plataformas não tomassem nenhuma medida, se nada ocorresse, na hora que as vacinas estivessem prontas, a percepção da população sobre ela seria muito ruim.” E foi.

Esse cenário investigado pela União Pró-Vacina sofreu uma transformação, sobretudo diante da extinção de grupos e vídeos considerados inadequados ou propagadores de mentiras por plataformas de redes sociais. Isso mais recentemente. Só que o estrago feito, ainda tem eco. Um estudo de 2019 da Sociedade Brasileira de Imunizações e da Avaaz mostrou que dois em cada três brasileiros acreditam em pelo menos uma afirmação imprecisa sobre vacinação.

Pesquisa Avaaz /SBim mostra que mais de dois terços dos adultos já acreditaram em alguma desinformação sobre a vacina

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Quando falamos de vacinação infantil, a ressalva cresce ainda mais, já que os apelos emocionais buscam sensibilizar pais e responsáveis semeando dúvidas e conspirações

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Um dos pais que conversou com a reportagem, mas pediu para não ser identificado se refere justamente a esse apelo emocional. Apoiador do presidente Jair Bolsonaro, ele passou a consumir conteúdo online que lança dúvidas sobre a segurança da vacina. “Essa vacina é experimental e os riscos são muito grandes, eu não sei o que pode acontecer com ela no futuro. Eu ali coisas que falam até em infertilidade”. A filha dele já contraiu o novo coronavírus pelo menos duas vezes e apresenta alguns sintomas de Covid longa.

O historiador João de Los Santos, de 46 anos, é pai da Bibiana, de seis, e não entende quem aposta com a vida dos filhos dessa maneira. “Infelizmente, o que eu vejo é que muitas pessoas, mesmo pessoas de classe média, como eu, com acesso a todos os recursos, duvidam. E eu tive inclusive o relato de uma mãe de um ex-colega da minha filha que estava na dúvida se o filho ia ser vacinado ou não. Isso que minha filha já estava prestes a tomar a segunda dose. Isso acaba me espantando muito, porque a gente chegou num nível de ignorância que está botando a nossa saúde em risco”, desabafa. E isso é verdade não apenas para a Covid, mas para uma série de outras doenças.

“Isso é muito ruim para a população porque aumenta a população suscetível e aumenta a possibilidade de ter de volta outras doenças imunopreveníveis. Muitas delas causam mortes, causam mortes de crianças. Quando não causa morte, causa sequelas. Causa dor, causa sofrimento, causa custo. Então é uma situação que nós estamos vivendo, de baixa cobertura vacinal que a gente tem que trabalhar, toda sociedade tem que ser trabalhada pra reverter”, explica o Dr. Akira Homma. Para se ter uma ideia, no ano passado só 60% das crianças foram vacinadas contra a Hepatite B, Tétano, Difteria e Coqueluche. Contra o Sarampo, Caxumba e Rubéola o índice foi menor que 75%. E a meta, nesses casos, é de mais de 90%.

Segundo o Dr. Akira Homma, além da desinformação, há outro elemento para essa baixa. “A vacinação vem caindo de popularidade, ou de importância no contexto da vida brasileira porque o povo não vê mais doença”, diz. O médico infectologista Pediátrico Fabrizio Mota, que também é membro da Sociedade Rio-Grandenses de Infectologia e da Sociedade de Pediatria do Rio Grande Do Sul concorda. “A gente que vive hoje nos anos 2020 não conviveu com varíola, com surtos absurdos de meningite no final da décadas de 70, a gente não conviveu com poliomielite causando sequelas nas pessoas, a gente não conviveu com sarampo causando óbito em crianças. Quem hoje tem seus 30, 40 anos e preza de uma boa saúde é porque já pegou um calendário vacinal extenso. E quem nasce hoje, o calendário que é feito nos postos de saúde é extremamente privilegiado. Então essa falsa impressão de que não existe o risco porque a gente vê poucos casos começa a fazer com que as pessoas procurem menos a vacinação, porque elas não têm risco.”

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Mas há risco. O fato é que os antígenos bacterianos, virais que causam doenças continuam circulando. “Então você deixa de vacinar e está criando população desprotegida. E nós estamos sob ameaça da volta de doenças imunopreveníveis”, alerta o Dr. Akira Homma

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O infectopediatria Fabrizio Mota, traz uma perspectiva importante para começar a mudar o cenário. “Toda vez que algo começa, as pessoas vem: não é para entrar em Pânico. Mas eu acho que já desmobiliza. Como não entrar em pânico? Nós temos que ter um certo pânico porque vai fazer a gente prestar atenção, para nos organizarmos para suspeitar rapidamente de um caso. Os hospitais já tem que ter um fluxo. Não pode esperar chegar o primeiro caso suspeito para alguém ligar às 10:00 da noite para um infectologista. Eu acho que essa falta de pânico, essa falta de medo de sarampo, por exemplo, a gente tem 70% de cobertura vacinal. É um piscar de olhos pra gente ter um grande surto no país.”

O presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações e membro do Comitê De Infectologia Da Sociedade De Pediatria, Juarez Cunha concorda que sim, a comunicação precisa melhorar, mas a polarização é que é um risco perene. “A perspectiva, a curto e médio prazo, é de um alerta muito importante. O Brasil atualmente é considerado um dos países de altíssimo risco para retorno de pólio. E nós estamos com um risco muito elevado porque as nossas coberturas vacinais estão baixas. Então, apesar dos esforços que a gente tá fazendo, a gente tá em reuniões quase que permanentes com o próprio Ministério da Saúde, sociedades científicas, Organização Mundial de Saúde, todo mundo tá discutindo isso porque a gente precisa reverter. Nós temos um projeto agora junto com Fiocruz que é a reconquista das coberturas vacinais.

Patricia Blanco, que preside o Instituto Palavra Aberta, lembra que nas campanhas e ações, a organização já tem adotado estratégias para driblar essa visão polarizada, que por vezes promove a desinformação contra a vacina infantil antes mesmo da análise de informações existentes. “É um desafio, porque na sociedade polarizada, colocar rótulos é para você inibir o debate. Então quando você rotula determinadas instituições como sendo o direito de esquerda ou comunista ou conservadora ou capitalista, você acaba inibindo o debate. E o que a gente tenta é trazer a discussão para fora do ambiente partidarizado. Os fatos são deixados de lado por crenças e ideologias. E o que a gente tem que trazer é o seguinte, olha vamos analisar a questão factual.

Além das campanhas institucionais, no entanto, é reforçada a importância de estimular a comunicação sobre o assunto não apenas por especialistas, mas influenciadores, artistas e comunicadores que sejam capazes de combater desinformação. Isso porque parte dos jovens não consome mais veículos de comunicação tradicionais, tampouco se interessa por meios convencionais de conscientização. Quem fez esse exemplo foi uma associação chamada Mães E Pais Pela Democracia, que vinha percebendo, entre outras coisas, o avanço do discurso anti-ciência e o risco para as crianças. Aline Kerber, que integra o grupo, lembra inclusive de um movimento de desinformação em uma cidade da Região Metropolitana de Porto Alegre. “Em Novo Hamburgo, tinha carro andando com com Fake News, dizendo que a vacina era experimental e que os filhos seriam cobaias, que não deixassem fazer. Então a gente explicita a problemática. E, sinceramente, nunca vi algo tão contundente, que tenha dado tão “certo”, com tantos danos causados, como foi a questão da vacinação infantil da Covid.”

Aline acrescenta que muitas escolas ficaram temerosas de enfrentar a desinformação, isso por conta da polarização. “Muitas escolas foram censuradas, muitos professores censurados por não poder tratar do tema da vacinação, porque virou uma pauta ideológica”, conta.

Fato é que a prevenção de doenças e a proteção conferida pela vacina é de valor inestimável e nós não podemos abrir mão dessa proteção. Doenças como rubéola, varíola, poliomielite e sarampo foram eliminadas há anos, mas a volta dessas doenças tem um potencial muito grande por causa da população suscetível que recusa vacina. E o grupo “Mães e pais pela Democracia” mostrou que dá para fazer mais de onde estamos.

Produção: Geórgia Santos, Flavia Cunha e Tércio Saccol
Roteiro e apresentação: Tércio Saccol
Edição: Tércio Saccol
Trilha sonora original: Gustavo Finkler

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Bendita Sois Vós #65 O Congresso importa

Geórgia Santos
6 de julho de 2022

Nesta semana, vamos falar de eleição. Mas embora seja tentador alertar, de novo, para os riscos da reeleição de Jair Bolsonaro – da mesma forma como fizemos em 2018 quando ainda não sabíamos como seria pior do que o imaginado – vamos falar da eleição para o Congresso. 

O anúncio da pré-candidatura de Marina Silva a deputada federal pela Rede Sustentabilidade foi criticada por muita gente que entende como oportunismo e acusou a política de estar “sumida”. Houve quem sugerisse que desistir de competir pela presidência para tentar o Congresso era algo menor.

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A questão toda levanta, então, o debate sobre a importância de quadros qualificados no Legislativo e sobre a importância do próprio Legislativo

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Afinal, até que ponto deputados e senadores são co-responsáveis pelo momento trágico pelo qual o Brasil passa hoje?

A apresentação é de Geórgia Santos. Participam Flávia Cunha, Igor Natusch e Tércio Saccol. Você também pode ouvir o episódio no SpotifyItunes e Castbox

Vós Pessoas no Plural · Bendita Sois Vós #65 O Congresso importa
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Bendita Sois Vós #64 Como controlar o corpo de uma mulher

Geórgia Santos
29 de junho de 2022

Nesta semana, aprenda como controlar o corpo de uma mulher. Porque é isso que insistem em fazer.

Em um intervalo de poucos dias, testemunhamos uma série de ataques à existência das mulheres, com violências de natureza concreta e simbólica, aqui, no Brasil, e nos Estados Unidos.

Primeiro, uma menina de 11 anos que está grávida e tem o direito ao aborto negado. A criança procurou o hospital de uma cidade de Santa Catarina com 22 semanas de gravidez. A equipe se recusou a fazer o procedimento alegando que o limite é de 20 semanas. O caso, então, vai parar nas mãos da juíza Joana Ribeiro Zimmer que, segundo reportagem do The Intercept Brasil não apenas negou o direito ao aborto como falou o impensável à criança.

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“Pode suportar mais um pouquinho?”

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A menina eventualmente conseguiu realizar o procedimento. O presidente da república, Jair Bolsonaro, manifestou-se contrário à decisão final, insinuando que a concepção foi fruto de uma relação consensual, ignorando que uma menina de 11 anos, de acordo com a legislação brasileira, não pode consentir. Portanto, qualquer criança grávida é vítima de estupro de vulnerável. Lembrando que o aborto em caso de estupro é autorizado no Brasil.

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Enquanto isso, a Suprema Corte dos Estados Unidos revogou a decisão conhecida como Roe vs. Wade, de 1973, que garantia o direito ao aborto legal em todo o território americano

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Agora, fica a cargo dos Estados a decisão sobre o corpo das mulheres. Alguns dos mais conservadores, como o Alabama, foram ágeis e já criminalizaram a prática, mesmo em caso de estupro.

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E então, no último final de semana,  a atriz Klara Castanho, de 21 anos, teve a intimidade revelada da maneira mais torpe

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Dois colunistas de fofoca expuseram a mulher de forma vil e cruel, espalhando para o mundo que ela escondeu uma gravidez e que encaminhou a criança para a adoção. Forçando a jovem a vir a público e explicar que havia sido estuprada e que a criança era fruto desse abuso. Ainda assim, foi condenada, por decidir não criar a criança.

Ou seja, mesmo em caso de estupro, está errada a mãe que quer terminar a gravidez e está errada a mãe que decide não fazer o aborto mas opta pela adoção. Só está certa a mulher cristã, cisgênero – lógico -, que casa com um homem e que procria. Desde que tenha poder aquisitivo alto pra criança ter “uma vida boa”, porque pobre não deve ter filhos. Ah, ela também que “ser feminina”. Magra, usar salto alto, fazer as unhas, cuidar da casa e do marido e ser obediente, deve ficar calada. E ainda assim, estará errada.

A apresentação é de Geórgia Santos. Participam Flávia Cunha, Igor Natusch e Tércio Saccol. Você também pode ouvir o episódio no SpotifyItunes e Castbox

Vós Pessoas no Plural · Bendita Sois Vós #64 Como controlar o corpo de uma mulher
 
A capa é uma montagem a partir da arte de Cristiano Siqueira.
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Cantinho da Leitura #19 Quando objetos viram personagens

Geórgia Santos
24 de junho de 2022
Neste episódio do podcast Cantinho da Leitura, falamos de quando objetos viram personagens. A jornalista Geórgia Santos conversa com Flávia Cunha, jornalista, mestre em Literatura pela UFRGS, produtora editorial de livros infanto-juvenis e colunista do Vós. O Cantinho da Leitura é um podcast parceiro da Companhia das Letrinhas.
 
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A personificação, também chamada de prosopopéia, é um recurso de escrita que dá vida própria a objetos inanimados
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Na literatura infantil, transformar meros objetos em personagens mexe com a imaginação das crianças e amplia o repertório delas sobre o mundo. Então, nesse episódio a Flávia fez uma seleção de livros para diferentes faixas etárias que fazem uso da personificação.
 
Nas dicas de leitura, Memórias de um cabo de vassoura, de Origenes Lessa, da editora Global; Uma Aventuras do Velho Baobá, de Inaldete Pinheiro de Andrade, do selo Pequena Zahar; Coisas que Eu Queria Ser, de Arthur Nestrovski, da Companhia das Letrinhas.
 

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Bendita Sois Vós #63 O Brasil que mata

Geórgia Santos
15 de junho de 2022

Mais de uma semana após o desaparecimento na Amazônia, começam a surgir pistas mais concretas sobre o paradeiro do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips.

Equipes de buscas encontraram vários pertences da dupla. Um notebook, cartão de saúde em nome de Bruno, calça preta de Bruno, par de botas de Dom, chinelo preto de Bruno, mochila de Dom.

Na segunda-feira, a esposa de Dom Phillips, Alessandra Sampaio, informou ao jornalista André Trigueiro, da Globonews, que os corpos de Bruno e Dom teriam sido encontrados, mas a Polícia Federal negou. Não houve essa confirmação, ainda. Uma pessoa está presa. Amarildo da Costa de Oliveira, conhecido como PeLado, foi avistado por ribeirinhos passando no rio logo atrás da embarcação de Bruno e Dom, no trajeto que os dois faziam entre a comunidade de São rafael até a cidade de Atalaia do Norte. A polícia encontrou vestígios de sangue na lancha usada por ele. Os familiares dizem que ele foi torturado pela polícia e que está sendo forçado a confessar o crime.

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O governo federal demorou a reagir. O presidente Jair Bolsonaro disse que “isso acontece em qualquer lugar do mundo”, que “os dois sabiam do risco daquela região”

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No episódio de hoje a gente explica que ISSO, que provavelmente aconteceu com Dom e Bruno, não acontece em qualquer do mundo. E tem acontecido cada vez mais no nosso lugar do mundo.

A apresentação é de Geórgia Santos. Particiapam Flávia Cunha, Igor Natusch e Tércio Saccol. Você também pode ouvir o episódio no SpotifyItunes e Castbox

 

Vós Pessoas no Plural · Bendita Sois Vós #63 O Brasil que mata
PodCasts

Bendita Sois Vós #62 O mundo invertido dos eleitores

Geórgia Santos
8 de junho de 2022

Nesta semana, o mundo invertido dos eleitores. Uma pesquisa do Datafolha indica indica que 29% dos eleitores de Bolsonaro são de esquerda e que 23% dos eleitores de Lula são de direita. Estamos no mundo invertido? No multiverso? Será que o voto não é programático, como se poderia pensar? Ou será que há outra explicação?

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A gente explica o que isso quer dizer no Brasil de hoje

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Enquanto isso, o cenário parece ruim para o atual presidente. Além de estar distante do primeiro colocado nas pesquisas, a pecha de “preguiçoso” está começando a colar. Quem ouve o Bendita Sois Vós não vê muita novidade nisso, não é, afinal, trabalhamos com verdades. Ao contrário de Jair Bolsonaro.

De todo modo, as coisas não parecem boas pra ele. Além de ser tachado como preguiçoso, a venda de armas aumentou e o governo decidiu usar o dinheiro destinado ao reajuste de servidores para reduzir o corte no orçamento. Ou seja, o bloqueio orçamentário caiu de R$ 8,2 bilhões para R$ 6,96 bilhões e a decisão sobre reajuste será tomada até o fim de junho.

Vós Pessoas no Plural · Bendita Sois Vós #62 O mundo invertido dos eleitores
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Cantinho da Leitura #18 Livros infantis para ajudar na conversa sobre bullying

Geórgia Santos
27 de maio de 2022

Neste episódio do podcast Cantinho da Leitura, livros infantis para ajudar na conversa sobre bullying. A jornalista Geórgia Santos conversa com Flávia Cunha, jornalista, mestre em Literatura pela UFRGS, produtora editorial de livros infanto-juvenis e colunista do Vós. O Cantinho da Leitura é um podcast parceiro da Companhia das Letrinhas.

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O bullying, infelizmente, não é um assunto novo

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E vem sendo tratado com mais frequência nas escolas e mesmo em família. Mas nem sempre os adultos sabem abordar esse tema com naturalidade e é aí que os livros podem entrar em cena. As obras de literatura infantojuvenil são um recurso lúdico e sensível para falar de algo grave: a prática sistemática e repetitiva de atos de violência física e psicológica. A convidada deste episódio é Janete Petry, graduada em pedagogia e especialista em psicopedagogia clínica e institucional.

Nas dicas de leitura, Bullying e suas implicações no ambiente escolar, de Sonia Maria de Souza Pereira, da editora Paulus; O livro dos medos, de diversos autores, com organização de Heloisa Prieto, da Companhia das Letrinhas; Samira e os esqueletos, da escritora norueguesa Camilla Kuhn, da editora Brinque Book; Eu falo como um rio, de Jordan Scott, editora Pequena Zahar; Princesa Kevin, do escritor francês Michäel Escoffier, editora Companhia das Letrinhas.