Geórgia Santos

Oprah e a luz no fim do túnel

Geórgia Santos
8 de janeiro de 2018
75th ANNUAL GOLDEN GLOBE AWARDS -- Pictured: Oprah Winfrey, Winner, Cecil B. Demille Award at the 75th Annual Golden Globe Awards held at the Beverly Hilton Hotel on January 7, 2018 -- (Photo by: Paul Drinkwater/NBC)

Ontem, o Globo de Ouro foi mais do que entretenimento. Muito mais. E especialmente ontem. No tradicionalmente glamoroso tapete vermelho, todos usavam preto e ninguém se atrevia a perguntar a procedência da roupa, apenas o motivo. No tradicionalmente fútil tapete vermelho, todos usavam preto como forma de protesto contra os casos de assédio e abuso sexual da indústria cinematográfica. No tradicionalmente colorido tapete vermelho, todos usavam preto para declarar que acabou o tempo (#TIMESUP) em que as mulheres se calavam diante da injustiça.

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E Oprah Winfrey personificou, imaculada, cada gesto dessa luta

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Agraciada com o prêmio Cecil B. DeMille, a apresentadora (e mil coisas mais) e primeira mulher negra a receber a homenagem usou o palco para falar de injustiça, desigualdade e do movimento #MeToo. Ela usou o microfone para amplificar a reivindicação de dignidade em um dos discursos mais impactantes dos últimos tempos. Falou sobre protagonismo negro, empoderamento feminino e liberdade de imprensa.

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Se há homens poderosos que tentam objetificar a mulher em cada gesto e fala, há Oprahs para lembrar que somos humanas e fortes

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Leia o discurso de Oprah Winfrey na íntegra:

 

“Em 1964, eu era uma menina sentada no chão de linóleo da casa da minha mãe, em Milwaukee, assistindo Anne Brancoft apresentar o Oscar de melhor ator, na 36ª edição do prêmio. Ela abriu o envelope e disse cinco palavras que, literalmente, fizeram história: “O vencedor é Sidney Poitier”. O homem mais elegante que eu já havia visto subiu ao palco. Eu lembro que sua gravata era branca e sua pele era negra, e eu jamais havia visto um homem negro ser celebrado daquela forma. Eu tentei explicar, muitas e muitas vezes, o que um momento daqueles representa para uma menina, uma criança que assiste à mãe passar pela porta morta de cansaço de tanto limpar as casas de outras pessoas.

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Mas tudo o que eu posso fazer é citar as palavras de Sidney em Uma Voz nas Sombras (Lilies of the Field), “Amem, amem. Amem, amem.”

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Em 1982, Sidney recebeu, aqui no Globo de Ouro, o prêmio Cecil B. De Mille. E eu não esqueci que neste momento há muitas garotinhas assistindo enquanto eu me torno a primeira mulher negra a receber esse mesmo prêmio. É uma honra. É uma honra e é um privilégio compartilhar essa noite com todas elas e também com os homens e mulheres incríveis que me inspiraram, desafiaram, apoiaram e tornaram minha jornada até este palco possível. Dennis Swanson, que apostou em mim para o talk-show “A.M. Chicago”. Quincy Jones, que me viu no programa e disse a Steven Spielberg, “ela é Sophia em A Cor Púrpura”. Gayle, que tem sido a definição do que é uma amiga, e Stedman, que tem sido minha rocha. Apenas alguns para nomear.

Eu quero agradecer à Imprensa Internacional de Hollywood, porque nós todos sabemos que a imprensa está sob cerco fechado ultimamente. Mas nós também sabemos que é a insaciável dedicação para descobrir a verdade que nos impede de fazer vista grossa para a corrupção e a injustiça. A tiranos e vítimas, e segredos e mentiras. Eu quero dizer que eu valorizo a imprensa mais que nunca ao passo em que tentamos navegar por esses tempos complicados. O que me traz à isso.

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O que eu sei, com certeza, é que falar a nossa verdade é a ferramenta mais poderosa que todos nós temos

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Eu estou especialmente orgulhosa e inspirada por todas as mulheres que se sentiram fortes o suficiente e empoderadas o suficiente para falar e compartilhar suas histórias. Cada um de nós nesta sala é celebrado por causa das histórias que contamos, e neste ano nós nos tornamos a história.

Mas não é apenas a história que afeta a indústria do entretenimento. É uma que transcende qualquer cultura, geografia, raça, religião, política ou ambiente de trabalho. Por isso eu quero, nesta noite, expressar minha gratidão a todas as mulheres que suportaram anos de abuso e assédio porque elas, assim como minha mãe, tem filhos para alimentar e contas para pagar e sonhos para perseguir. Elas são as mulheres cujos nomes nós jamais saberemos. Elas são as trabalhadoras domésticas e agricultoras. Elas estão trabalhando em fábricas e restaurantes e elas estão na academia, na engenharia, medicina e ciência. Elas são parte do mundo da tecnologia e da política e dos negócios. Elas são nossas atletas na Olimpíadas e são nossas militares. E há mais alguém. Recy Taylor, um nome que eu sei e acho que você deveria saber também.

Em 1944, Recy Taylor era uma jovem esposa e mãe. Ela estava voltando para casa após celebração na igreja que frequentava em Abbeville, Alabama, quando foi sequestrada por seis homens brancos armados, estuprada e deixada no acostamento de uma estrada com uma venda nos olhos. Indo para casa, depois da igreja. Eles ameaçaram matá-la caso contasse a alguém, mas a história foi reportada a NAACP (Associação Nacional para o Progresso de Pessoas de Cor), onde uma jovem trabalhadora que respondia pelo nome de Rosa Parks se tornou a investigadora principal do seu caso e, juntas, elas buscaram justiça.

Os homens que tentaram destruí-la jamais foram processados. Recy Taylor morreu dez dias atrás, a poucos dias do seu aniversário de 98 anos. Ela viveu como todos nós temos vivido, anos demais em uma cultura destruída por homens poderosos e brutais.

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Por tempo demais, mulheres não tem sido ouvidas ou acreditadas quando ousam falar a verdade ao poder desses homens. Mas o tempo deles acabou. O tempo deles acabou

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E eu apenas espero, eu apenas espero que Recy Taylor tenha morrido sabendo que a sua verdade, assim com a verdade de tantas outras mulheres atormentadas naqueles anos, e que ainda são atormentadas, segue marchando.

Estava em algum lugar no coração de Rosa Parks, quase onze anos depois, quando ela tomou a decisão de permanecer sentada naquele ônibus em Montgomery, e está aqui com cada mulher que escolhe dizer “Eu também” (Metoo). E com cada homem, cada homem que escolhe escutar.

Na minha carreira, o que eu sempre tentei fazer de melhor , seja na televisão ou em filmes, é falar algo sobre a maneira como homens e mulheres realmente se comportam. Falar sobre como nós experienciamos a vergonha, como nós amamos e como nos enfurecemos, como nós falhamos, como nos retiramos, perseveramos e como superamos.

Eu entrevistei e retratei pessoas que resistiram a algumas das coisas mais terríveis que a vida pode oferecer, mas a qualidade que todos parecem compartilhar é a habilidade de manter a esperança de uma manhã mais clara, mesmo durante as noites mais sombrias.

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Por isso eu quero que todas as meninas que estão assistindo aqui, agora, saibam que um novo dia está no horizonte!

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E quando esse novo dia finalmente amanhecer, será por causa de muitas mulheres magníficas, muitas das quais estão aqui nesta sala esta noite, e alguns homens fenomenais, que estão lutando muito para garantir que se tornem os líderes que vão nos levar a um tempo em que ninguém mais precise dizer “Eu Também”.”

 

Foto: Divulgação. Paul Drinkwater / NBCPAUL DRINKWATER/NBC

Glow

Clitóris ou Ovário?

Fernanda Ferrão
22 de junho de 2017
Clipe música Lalá da cantora Karol Conka Clipe música Lalá da cantora Karol Conka

Se quiser, clique e leia ouvindo: Karol Conka – Lalá

Sabe o boquete? Sabe, né? Já parou para pensar que não existe uma palavra equivalente para sexo oral em mulheres? A Karol Conka pensou. A rapper paranaense de 30 anos é uma das mulheres símbolo do que chamamos de terceira onda do feminismo. O último lacre foi lançado na primeira semana de junho: a música Lalá. O termo foi criado pela própria Karol.

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Sexo oral feminino é ‘lalá’

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É claro que o clipe foi lançado acompanhado de “””””””polêmica”””””””. Afinal, tem muita gente para dar pitaco em todo e qualquer assunto relacionado ao feminino. A equipe que criou o vídeo lindo que acompanha a música é composta apenas por mulheres. O vídeo tem quase dois milhões e meio de visualizações.

Camila Cornelsen e Vera Egito dividiram a direção. Camila teve sua conta extinta e foi bloqueada do Instagram depois de postar 01 minuto do vídeo em seu perfil. Vera, em conversa com a Dani Arrais, do Don’t Touch My Moleskine, disse:

“Na celebrada música brasileira – poderia dizer de todo o mundo também – o sujeito do desejo é masculino e o objeto desse desejo é feminino tradicionalmente. Mas agora a moça bonita que vem, não passa. Ela fica e fala do que está afim. Deixa claro também quais são suas vontades, preferências, e toma o eu lírico do tesão pra si. Karol é essa mulher inteligente, de personalidade, independente e corajosa. Ela é linda também. Provavelmente o rosto mais simétrico que eu já filmei, impressionante. Linda em qualquer enquadramento. Mas já é tempo do atributo da beleza não ser mais o principal ao se falar de uma mulher. Especialmente uma mente criativa como Karol Conká. Foi de uma honra e de uma felicidade enormes realizar esse trabalho para ela. Especialmente ao lado da Camila Cornelsen, minha mana fotógrafa inspiração e apoio pro meu trabalho e pra minha vida. ‘Direitos de prazer iguais’, clama Karol. É isso aí. Celebremos esses novos tempos. Não tem retrocesso. Desse lugar de fala a gente não sai mais.”. Punto y basta.

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Nos dias seguintes ao lançamento, Karol postou frames e imagens do clipe sempre lembrando o quanto tem sido atacada apenas por falar de um assunto que incomoda aqueles que estão acostumados a dominarem todos os cenários: os homens.

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Eu poderia falar muitas outras coisas sobre este assunto, falar das conversas que tenho com amigas, sempre cheias de relatos de homens que não conhecem o corpo feminino e de como o pudor imposto pela sociedade faz com que essas mulheres que reclamam dos homens muitas vezes nem saibam instruí-los. Porém, deixo aqui apenas a íntegra da letra escrita por Conka. Te juro que vais entender do que estamos falando! #melambelá

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Lalá – Karol Conka

Lá lá lá

Moleque mimado bolado que agora chora
Só porque eu mandei ajoelhar
Fazer um lalá por várias horas

Ele disse por aí que era o tal
Pega geral e apavora
Seduzi pra conferir
E percebi que era da boca pra fora

Dá pra perceber que existem vários
Falam demais, fingem que faz
Chega a ser hilário
Mal sabe a diferença de um clitóris pra um ovário
Dedilham ao contrário
Egoístas criando um orgasmo imaginário

Pouco importa pra ele se você também tá satisfeita
Esses caras ainda não aprenderam que 10 minutos é desfeita
Nem a bomba que toma não aguenta o molejo da lomba
Se desmonta, tem medo e no final só me desaponta

Já fico arrependida
Seca, desacreditada e fria
Desse jeito desanima
Quero ser bem atendida

O que me anima é a habilidade na lambida
Malícia, muita saliva enquanto eu queimo uma sativa

Lá lá lá, me lambe lá
Lá lá lá, me lambe, me lambe, me dê uma lambida lá

É inacreditável, eles ficam sem ação
Quando a gente sabe o que quer e já mete a pressão
Tem que saber fazer se não gera contradição
Direitos de prazer iguais, mais compreensão

Isso daqui não tá de enfeite
Dá um jeito, se ajeite
Sem ser fake, então vai se deite
Se eu quero, respeite

O clima deixa de ser quente, confundiu minha mente
Falam de mais, quando chega na hora a ação não é equivalente
Nem vem, sou apenas mais uma com experiência e sabe quem tem
Vejo vários convencidos achando que no final mandou bem

Minhas amigas concordam também
Vocês podem ir mais além
Sem dedicação espantam um harém

Curvem-se, encostem os lábios na flor
Quebra esse tabu, isso não é nenhum favor

O que me anima é a habilidade na lambida
Malícia, muita saliva
Enquanto eu queimo uma sativa

Lá lá lá
Lá lá lá, me lambe lá
Lá lá lá, me lambe, me lambe
Me dê uma lambida lá
Lá lá lá
Lá lá lá, me lambe lá
Lá lá lá, me lambe, me lambe
Me dê uma lambida lá