Voos Literários

O último texto do ano

Flávia Cunha
31 de dezembro de 2020
Neste último texto do ano

começo confessando que fiquei na dúvida sobre o que escrever. Então, durante alguns dias, achei que poderia ser uma boa ideia fazer uma retrospectiva a respeito dos temas e livros abordados na coluna Voos Literários. Depois, imaginei que vocês, meus leitores, já estariam cansados de balanços e retrospectivas. E, certamente, se tem uma palavra que define 2020 é cansaço.

Neste último texto do ano,

prossigo confidenciando que continuei mais um tempo sem saber qual assunto eu analisaria aqui. Apesar da hesitação, cheguei a escrever uma espécie de inventário de quantos livros eu havia lido nos últimos 12 meses.  Para, assim, poder avaliar de que forma a pandemia e o distanciamento social afetaram meu ritmo de leitura. Porém, desisti deste projeto de postagem, por considerar inócua a minha experiência individual perante tantas pessoas acometidas de ansiedade e outras dificuldades.

Neste último texto do ano,

pensei, ainda, em refletir sobre o quanto 2021 será desafiador no Brasil. Sem auxílio emergencial, sem data certa para começar a vacinação. Com pandemia, com Bolsonaro. Porém, mais uma vez, abandonei o texto, antes mesmo de começar. Afinal, quem, infelizmente, não sabe disso? 

Neste último texto do ano,

acabei, meio na marra, optando por escrever apenas uma tentativa desajeitada de transmitir esperança. Mas como fazer isso?  Talvez compartilhar um sonho possa ser uma saída. Desejar que em algum livro, ainda a ser publicado, esteja a resposta para muitos de nossos problemas atuais. E não ter vergonha de fantasiar que, no próximo ano, poderia muito bem existir uma obra chamada “Como a vacina contra o coronavírus mudou o mundo”.  Além disso, aproveito para imaginar, com todas as minhas forças, um livro com o nome “A falta de planejamento da vacinação no Brasil resultou na queda de Bolsonaro”.  

Nesse último texto do ano,

termino me despedindo e propondo que a gente não desista. Que tenhamos força e resiliência em 2021 para, a cada dia, lutar, do jeito que der, por um mundo menos injusto.  Antes de encerrar, aproveito para deixar um pequeno presente para vocês: um poema de Mario Quintana, chamado Esperança. Pois se tem algo que precisamos, é dela.

ESPERANÇA

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano

Vive uma louca chamada Esperança

E ela pensa que quando todas as sirenas

Todas as buzinas

Todos os reco-recos tocarem

Atira-se

E

— ó delicioso vôo!

Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,

Outra vez criança…

E em torno dela indagará o povo:

— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?

E ela lhes dirá

(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)

Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:

— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA…

Voos Literários

No Dia dos Namorados, o amor na visão de grandes escritores

Flávia Cunha
12 de junho de 2018

Tenho uma certa implicância com o aspecto comercial do Dia dos Namorados, mas é bonito de ver o amor ser exaltado mais do que o ódio nas redes sociais, pelo menos uma vez no ano.  Em homenagem à data, selecionei alguns trechos de grandes escritores falando sobre esse sentimento poderoso, incontrolável e, por vezes, incoerente.

Para começo de conversa, um pouco de Caio Fernando Abreu aos que vislumbram os primeiros sintomas do amor (e da paixão):

“Há alguns dias, Deus — ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro.

Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro.”

Em Pequenas Epifanias

Indico Clarice Lispector para os que amam e, por algum motivo, sofrem por esse amor:

“Mas há a espera. A espera é sentir-me voraz em relação ao futuro. Um dia disseste que me amavas. Finjo acreditar e vivo, de ontem pra hoje, em amor alegre. Mas lembrar-se com saudade é como se despedir de novo”.

Em Água viva

Aconselho aos portadores perpétuos de paixões desmedidas, ler Gabriel García Márquez sem moderação:

“Ele ainda era demasiado jovem para saber que a memória do coração elimina as coisas más e amplia as coisas boas, e que graças a esse artifício conseguimos suportar o peso do passado.”

Em O amor nos tempos do cólera

Esse poema de Mario Quintana é fundamental aos que temem ser exaustivos na expressão de seus sentimentos:

Fere de leve a frase… E esquece… Nada

Convém que se repita…

Só em linguagem amorosa agrada

A mesma coisa cem mil vezes dita.”

Em Espelho Mágico

E, por fim, recomendo Shakespeare aos céticos à entrega amorosa genuína:

É um amor pobre aquele que se pode medir.”

Em Antônio e Cleópatra