PodCasts

Sobre Nós #9 Imparcialidade

Geórgia Santos
19 de novembro de 2018

No Sobre Nós desta semana trazemos o mito da imparcialidade para o centro do debate nas palavras George Orwell, em Homenagem à Catalunha. Com Raquel Grabauska e Angelo Primon.

Voos Literários

Sete livros para compreender o anarquismo na História e na atualidade

Flávia Cunha
28 de agosto de 2018

Há 91 anos, em agosto de 1927, ocorria um dos julgamentos mais injustos da história da justiça norte-americana. Os anarquistas italianos Nicola Sacco e Bartolomeo Vanzetti foram condenados à morte, acusados de dois homicídios. Cinquenta anos depois, foi comprovada a inocência dos dois, absolvidos oficialmente pelo governo de Massachusetts.

O processo Sacco & Vanzetti, como ficou mundialmente conhecido, levanta questionamentos que entrelaçam o passado e o presente.

A pena de morte, defendida por muitos no século 21, é mesmo a solução para os problemas de segurança pública no Brasil, com tantas falhas processuais que levam inocentes para a cadeia?

Será que se os réus do julgamento de 1927 não fossem imigrantes e líderes do movimento operário sindical, a opinião pública da época teria apoiado as execuções, mesmo com evidências de que os acusados eram inocentes?

Além disso, por que não se fala sobre o movimento anarquista na grande mídia brasileira, a não ser em operações policiais que tratam os ativistas como criminosos?

Pessoalmente, meu contato inicial com o anarquismo foi singelo. No primeiro livro de memórias de Zelia Gattai, ela lembra de seus descendentes italianos, católicos, por parte de mãe, e anarquistas, na ascedência paterna. No trecho abaixo de Anarquistas Graças a Deus, a escritora recorda uma história familiar, quando seu avô escolhe chamar de Hiena uma de suas tias:

Soubemos então que vovô, anarquista convicto, resolvera dar esse nome à filha visando mais uma afirmação de seus princípios anticlericais. 

Fora ao cartório, lá em Florença, onde a menina havia nascido e onde a família vivia, para registrá-la:

– Que nome quer dar à sua filha? – perguntou o escrivão. – Hiena! – declarou o rebelde. O homem pensou não ter compreendido, perguntou novamente: – Qual é o nome? – Hiena! – repetiu o pai da criança, entusiasmado com a reação do tipo; a polêmica desejada estava garantida.

O escrivão ainda tentou dissuadi-lo, não se conformando com tão estapafúrdia decisão:

– Mas, meu senhor! Como pode dar a uma criança inocente o nome de um animal tão repugnante?

– Se o Papa pode ser Leão, por que minha filha não pode ser Hiena? – revidou o velho Gattai que, na época, pouco mais tinha que trinta anos de idade.

A menina foi registrada com o nome de Hiena e Hiena ficou sendo até morrer.”

Sobre o anarquismo na atualidade, vale ressaltar que a Federação Anarquista Gaúcha lançou há poucos dias uma campanha por democracia direta. Saiba detalhes a respeito da iniciativa aqui.

Para saber mais sobre o anarquismo através dos livros, pedimos ao jornalista e anarquista Rodrigo Jacobus indicar 6 obras fundamentais:

Os Grandes Escritos Anarquistas – organização George Woodcock: Esse é um clássico dos clássicos, bom para quem quer iniciar-se no vasto universo anarquista. Um apanhado histórico abrangente, apresentando as ideias mais essenciais das diferentes correntes.

Organismo Econômico da Revolução – A autogestão na Revolução Espanhola – Diego Abad de Santillán: Com enfoque mais econômico, apresenta práticas e reflexões a partir da experiência aplicada ao longo da Guerra Civil Espanhola. Não é muito conhecido, mas é um livro muito bom sobre o assunto, embora um pouco mais pontual.

Notas sobre o Anarquismo – Noam Chomsky:  Mais contemporâneo, apresenta uma faceta que nem todos conhecem do respeitado acadêmico Noam Chomsky. Dá um respaldo mais formal ao assunto é um tanto quanto “fora da caixa”, já que, de um modo geral, o meio acadêmico é impregnado com o referencial marxista como modelo epistemológico de teoria crítica.

Lutando na Espanha – George Orwell:   O original chama-se Homenagem à Catalunha.  Situado na Guerra Civil Espanhola, é basicamente um relato da experiência de Orwell junto aos milicianos. Um tanto quanto jornalístico, com descrições que são simplesmente fantásticas. Na minha humilde opinião, é melhor que o relato de Hemingway  em Por quem os sinos dobram. Tem um viés mais literário e por isso vale a leitura, apesar de a temática não ser especificamente relacionada ao anarquismo.

Poder e Domínio – Uma Visão Anarquista – Fábio López López –  Livro mais próximo da nossa geração, calcado em reflexões a partir das experiências semelhantes às atuais. Uma baita reflexão com viés mais contemporâneo.

A Desobediência Civil – Henry David Thoreau – Com uma verve bem peculiar, é considerada uma importante referência dentro do ideário anarquista.

 

Voos Literários

A Revolução dos Bichos

Flávia Cunha
30 de maio de 2017

Estamos vivendo tempos estranhos no Brasil (e também em outros lugares do mundo), isso todos sabemos. Nesse contexto, é bom recorrermos a um clássico literário sobre política e poder. O romance satírico A Revolução dos Bichos, de George Orwell, é uma fábula que aborda uma verdadeira rebelião dos animais de uma fazenda contra seus donos.  O que poderia ser uma história com final feliz (“e os bichinhos viveram em harmonia para sempre”) degenera para uma tirania por parte de uma das espécies, que resolve agir como se fosse mais especial que as outras.

Sabemos que Orwell, o mesmo autor de 1984 – livro que comentei nesse post aqui – escreveu Animal Farm pensando especificamente em criticar o regime comunista da União Soviética que, para ele, era a degeneração do socialismo real, no qual ele acreditava. Porém, o que torna A Revolução dos Bichos um livro universal e atemporal é tratar de manipulações que, infelizmente, acabam ocorrendo em qualquer época e sistema político.

Na história, as ovelhas são retratadas como os animais com menos capacidade intelectual e, por isso, são sempre mostradas como as primeiras a concordarem com as mudanças impostas nas propostas de governar a granja, sem nem ao menos darem-se conta do conteúdo das modificações. Apenas são levadas a concordarem, no melhor estilo maria-vai-com-as-outras. (Como muitos internautas e eleitores que vemos por aí, no mundo real.)

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Um dos exemplos de manipulação mostradas na história são os mandamentos dos bichos, que, originalmente, eram 7

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  1. 1. qualquer coisa que ande sobre duas pernas é inimigo
  2. 2. qualquer coisa que ande sobre quatro pernas, ou tenha asas, é amigo
  3. 3. nenhum animal usará roupas
  4. 4. nenhum animal dormirá em cama
  5. 5. nenhum animal beberá álcool
  6. 6. nenhum animal matará outro animal
  7. 7. todos os animais são iguais

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Ao longo da história, são modificados

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  1. 4. nenhum animal dormirá em cama com lençol
  2. 5. nenhum animal beberá álcool em excesso
  3. 6. nenhum animal matará outro animal sem justo motivo

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Com a opressão sendo institucionalizada na fazenda, resta apenas um mandamento:

Todos os animais são iguais, mas uns são mais iguais que os outros.

Para quem interessou-se por saber mais detalhes e curiosidades sobre esse clássico literário, publicado pela primeira vez em 1945, pode dar uma conferida nessa matéria da revista Galileu. E, nesse link aqui, é possível conferir, na íntegra, uma animação baseada no livro e datada de 1954, além de um filme para a TV lançado em 1999.

Voos Literários

Que País É Esse? (Na Literatura)

Flávia Cunha
23 de maio de 2017

Imaginem o Brasil com um governo com representantes interessados apenas em vantagens pessoais. Não estou falando de um livro-reportagem abordando os dias atuais em território brasileiro, mas de uma obra escrita no início da década de 1980 por Ignacio de Loyola Brandão. Sendo Não Haverá País Nenhum uma distopia, evidentemente mostra um Brasil com ainda mais problemas do que enfrentamos no momento. Entre eles, a Amazônia transformada em um deserto, a cidade de São Paulo rodeada por toneladas de lixo que formam colinas imensas, sol tão forte que corrói a pele em poucas horas…

Porém, pelo menos dois fatores nos remetem a inconvenientes semelhanças com o país real. O período histórico relatado no livro é a Época da Grande Locupletação, referindo-se ao enriquecimento ilícito dos governantes. Além disso, o narrador da história está completamente desorientado em relação à política e não entende de uma forma clara o que se passa a seu redor. Que é, pelo menos para mim, a sensação que tenho ao assistir aos noticiários nos últimos dias. Meu palpite é que tem algo a mais por trás de todo o escarcéu com as gravações feitas pelos empresários falcatruas da JBS. Mas o que existe mesmo? Quais são os interesses financeiros e políticos em retirar Michel Temer do poder? E qual seria o sentido de denunciar Aécio Neves antes das eleições presidenciais de 2018?

Enquanto eu e o restante dos brasileiros que não recebemos malas com dinheiro de propina ficamos desorientados em relação ao sentido de tudo isso, recomendo leituras que nos façam refletir e não ser feitos de bobo por discursos políticos vazios. O livro de Ignacio de Loyola Brandão pode ser encontrado facilmente nas grandes livrarias, como por exemplo, aqui.

E, em se tratando de distopias e momentos políticos e governos questionáveis, não podemos deixar de citar 1984, de George Orwell. O protagonista desse romance tem um trabalho que é basicamente reescrever notícias, de acordo com as mudanças de posicionamento do governo totalitário que domina seu país. Esse clássico literário é de onde provém a expressão Big Brother, que é o olho que tudo vê.   

Já em Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, a sociedade é desprovida de núcleos familiares e as pessoas são divididas por castas. Qualquer questionamento ao sistema é impedido através da ‘soma’, uma substância que impede o surgimento de emoções ou possíveis revoltas.

Para concluir, vale conferir esse artigo, bem didático, sobre a distopia na literatura, do qual destaco esse trecho:

“A literatura distópica também pode representar um regime utópico que na prática destoa da teoria. As comunidades regidas pela distopia normalmente apresentam governos totalitários, ditatoriais, os quais exercem um poder tirânico e um domínio ilimitado sobre o grupo social.

Nestes estados impera a corrupção e as regras instituídas em nome do bem-estar coletivo revelam-se elásticas. As conquistas tecnológicas são utilizadas também como instrumentos de monitoramento dos indivíduos, da Nação ou de grupos empresariais.”