Tão série

O fim da p*** do mundo

Geórgia Santos
20 de janeiro de 2018

No feriado do Ano Novo, minha prima e afilhada e antenada e adolescente de 15 anos me falou sobre uma estreia da Netflix programada para janeiro. The End of The F*** World (algo como O Fim da P*** do Mundo), uma série de humor negro sobre um adolescente psicopata que pretende deixar de matar animais para assassinar algo um pouco maior. Ela sabe que eu gosto de um sanguinho. Assisti ao trailer.

https://www.youtube.com/watch?v=vbiiik_T3Bo

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Amei. Aguardei. Assisti ao primeiro episódio, ao segundo, ao terceiro … ao oitavo. Amei. 

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Só não é uma comédia de humor negro, como promete. Apesar de alguns momentos hilários e de diálogos impregnados de sarcasmo, a série britânica é um suspense. E dos pesados. Com direito a tensão, sofrimento por antecipação, angústia e muito, muito sangue. Sangue nível Tarantino. Sangue. Baseada na HQ homônima de Charles S. Forsman, a história ainda apareceu em um curta-metragem antes de ser transformada em série pelo serviço de streaming. 

A trama envolve dois adolescentes perturbados por motivos diferentes. James (Alex Lawther) é um psicopata calado, apegado à sua faca de caça, que fritou a mão para tentar sentir alguma coisa e agora quer matar alguém, pra ver como é. Apenas. Alyssa (Jessica Barden) é uma rebelde arrogante que fala sem parar e tem uma forte tendência maníaco-depressiva, pendendo para uma ninfomania wanna be. Os dois fogem de casa sem rumo. Levam apenas o desdém pelas figuras de autoridade que tem em casa – justificado, diga-se de passagem.

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Eles são tão estranhos que beiram à perfeição. Eu oscilava constantemente entre querer dar um soco no estômago de cada um e pegar no colo para fazer um carinho

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É como se eles estivessem presos em uma sociedade da qual não fazem parte. São desajustados e é injusto que isso seja um problema. Em uma cena fantástica do primeiro episódio, Alyssa quebra o próprio celular em um ataque de fúria. A colega que estava sentada diante dela havia enviado uma mensagem em vez de conversarem como duas pessoas normais que dividem uma mesa durante o almoço. James também não tem celular. Os dois apenas observam essa sociedade torta sem empatia, sem pares. Eles vão vivendo, sem futuro, enfrentando o sistema insolente que se apresenta como a salvação quando os dois sabem que é o carrasco.

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Eles vão vivendo, nessa roadtrip imprevisível. Absolutamente triste e linda

Uma viagem de descobertas e fins

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A arquitetura da série acompanha a sofreguidão do roteiro. São oito capítulos de 20 minutos, fáceis de consumir de uma só vez. Ela é projetada para ser consumida assim. E para facilitar, a trilha sonora é impecável. Se a série fosse um biscoito, a trilha com Graham Coxon (Blur), Fleetwood Mac, Mazzy Star, Shuggie Otis e Françoise Hardy seria o leite. Sem contar nas inúmeras referências à cultura pop.

Confesso que quando minha prima e afilhada e antenada e adolescente me falou sobre essa série, não achei que fosse gostar tanto. Por mais que a premissa do sangue e da psicopatia me interesse, nunca tive muita paciência para ficções que abordam conflitos adolescentes. Mas no final das contas, é simplesmente uma ótima produção que mistura humor negro, violência e bizarrices surreais de maneira primorosa. É uma arte subversiva. Entrenenimento na sua melhor forma.