Geórgia Santos

R.I.P. Jornalismo ou (Você não pode achar isso normal)

Geórgia Santos
12 de setembro de 2016

Em 2013, os brasileiros foram surpreendidos com protestos massivos, que reuniam milhares e milhares de pessoas nas ruas de inúmeras cidades do país. Quem preferiu testemunhar do sofá, via a tudo estático, extasiado, empolgado e até assustado. Em grande parte, foram transmitidos em tempo real em canais de notícias da TV Fechada, especialmente a GloboNews. Até que alguém cunhou uma frase que resumia bem a situação: “O gigante acordou”. As pessoas, de repente, lembraram que a rua era, sim, lugar de protesto e reivindicação. E mesmo um público tão heterogêneo como aquele poderia querer a mesma coisa.

Ao longo desses últimos três anos, muita coisa aconteceu. Muitos protestos também. E com eles, muitos repertórios de reivindicação pertencentes a uma gama ampla e diversa (cartazes, gritos, apitos, depredação etc). Foi contra o governo em 2013, contra a Copa em 2014, contra Dilma em 2015, contra e a favor do Impeachment em 2016.

Com relação a esses últimos, a grande imprensa teve uma reação quase orgásmica. Deleitava-se com os protestos que fazia questão de dizer que eram pacíficos enquanto mostrava fotografias de criancinhas abraçadas em policiais e babás empurrando os carrinhos do bebê. Mas tudo bem, manifestação mais do que legítima e definitivamente expressiva (alguns falam na casa do milhão, mas as fotos são contraditórias. Deixemos assim).

Já sobre protestos contra impeachment, o foco da mídia é a “destruição”. Milhares de pessoas tomam as ruas, mas o mais importante é confronto com a polícia. Milhares estão indignados com a situação política, mas o grupo de 10 vândalos tem mais destaque. Uma menina ficou cega, mas o absurdo está em queimar contêiner.

Que seja. It happens.

Mas nada foi como que o jornal O Estado de São Paulo fez hoje.

Ontem (04), mais de cem mil pessoas saíram às ruas da capital paulista (e outras cidades do Brasil) para protestar contra o novo “presidente”, Michel Temer, que havia dito que havia umas 40 pessoas na rua. O “Fora Temer” ecoava pelo país inteiro em um grito pacífico. Sim, pacífico. Sem quebradeira, sem vandalismo, sem incêndio.

Sabe qual foi a capa do jornal O Estado de São Paulo nesta segunda-feira, dia 05?

A CANONIZAÇÃO DE MADRE TERESA DE CALCUTÁ.

Meia dúzia de palavras sobre o protesto em uma nota microscópica que ressalta um tumulto inexistente e nenhuma foto.

Em outros periódicos, frisaram o “confronto” que ocorreu no final do protesto. Detalhe, não houve confronto, apenas uma ação arbitrária da polícia, que usou bombas de gás para dispersar o público que não fez absolutamente nada a não ser gritar. Além, é claro, do jornalista agredido gratuitamente por policiais.

Se os manifestantes choraram a morte da democracia, eu registro aqui meu pesar pelo falecimento do jornalismo.