Tão série

O Próximo Convidado Dispensa Apresentações

Geórgia Santos
4 de fevereiro de 2018

Antes de David Letterman encerrar a estada de 30 anos no comando do The Late Show, ele entrevistou o então presidente Barack Obama, em maio de 2015. Incerto do próprio futuro, perguntou quais os planos de aposentadoria do ainda jovem político.

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“Eu estava pensando, você e eu, nós poderíamos jogar dominó juntos, sei lá, ir até o Starbucks mais próximo”, disse Obama

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Bem, o entrevistador não esqueceu da sugestão. Com um dos conhecidos copos do Staburcks em primeiro plano e uma barba quase messiânica, telefonou ao ex-presidente e fez uma proposta. Aguardou. Compensou. Barack Obama é o primeiro entrevistado do novo projeto de Letterman no Netflix, My Next Guest Needs No IntroductionO Próximo Convidado Dispensa Apresentações. E, de fato, dispensa.

Alguns poucos reclamaram da empolgação de David Letterman ao entrevistar o ex-presidente. Não gostaram do que chamaram de bajulação. Não concordo. Aliás, discordo tanto quanto possível. O que se vê não é bajulação, e sim um homem grato por ter encontrado alguém por quem nutre imenso e verdadeiro respeito, como ele mesmo diz.

Ao longo de quase uma hora, Obama fala bastante, com a usual discrição. Prefere discutir o macro a entrar nas minúcias do novo governo. Mas esta não é uma entrevista qualquer. A conversa com o primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos é permeada por uma pesada carga histórica e emocional. Letterman viajou à Selma, Alabama, para atravessar a ponte Edmund Pettus ao lado do deputado John Lewis, presente no Domingo Sangrento de 1965. Na ocasião, militantes do movimento pelos direitos civis realizaram um protesto pacífico para reivindicar o direito da população afro-americana ao voto. Foram recebidos com cassetetes, gás lacrimogêneo e sangue. Muito sangue.

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O jornalista perguntou a Lewis o que estava do outro lado da ponte, simbolicamente

E o ativista respondeu sem titubear: “Obama”

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E Obama sabe disso. Sabe que é fruto daquela luta. Sabe que sem Martin Luther Jr e a entrega e o sangue de milhares de outros ativistas, os Estados Unidos não teriam tido o primeiro presidente negro em 2008. Isso também é parte da preocupação do Democrata com a horizontalidade das políticas públicas e a diminuição da desigualdade.

 

Em poucos minutos, ele consegue explicar o problema da desigualdade crescente que assola o mundo. Mais do que isso, lança a pergunta fundamental a que devemos responder.

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Como fazer uma economia nesse ambiente tecnológico globalizado que seja boa para todos?

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Precisamos buscar essa resposta. Talvez a busca seja mais importante do que a resposta em si. A primeira temporada prevê seis episódios, lançados mensalmente. Além de Obama, serão entrevistados George Clooney, Malala Yousafzai, Jay-Z, Tina Fey e Howard Stern. Uau. Não sei quanto a vocês, mas eu estou muito ansiosa.