Na penitenciária de Vacaville, na Califórnia, Edmund Kemper descreve como matou suas vítimas enquanto, amigavelmente, aperta a jugular de um agente do FBI. Concentrando os 140kg no indicador esquerdo, ele explica, sem alterar a voz, como sequestrou, matou e estuprou adolescentes. Sim, nesta ordem. Do alto de dois metros de altura, ainda conta como matou, decapitou e violentou a própria mãe. Sim, nesta ordem.
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Esta cena, retratada na imagem de capa, é a tônica de Mindhunter, a grata surpresa do ano passado e, na minha modesta opinião, uma das melhores séries de 2017. Confesso que, dentre tantos títulos do catálogo da Netflix, escolhi somente por causa da minha estranha obsessão com serial killers. Ou melhor, com suas histórias. Foi uma opção despretensiosa, mas que valeu a pena.
Nos anos 70, agente Holden Ford (Jonathan Groff), do FBI, se dedica a traçar um perfil psicológico para o então novo fenômeno dos assassinatos em série. A ideia é desenvolver um método que os ajude a compreender porquê a morte quando não há “motivo”. Para isso, eles passam a entrevistar assassinos já julgados e condenados a prisão perpétua ou ao corredor da morte. São todos personagens reais como o aterrorizante, estranho e simpático – sim, ele é – Ed Kemper (Cameron Britton).
A série foi criada por David Fincher e é baseada em fatos reais. O roteiro foi adaptados do livro “Mindhunter: O primeiro caçador de serial killers americano”, de John Edward Douglas e Mark Olshaker. Douglas atuou como analista do FBI por 25 anos e foi pioneiro na elaboração de perfis psicológicos, tanto que o termo serial killer sequer existia. Apesar do realismo, Fincher não foge de uma boa dose de licença poética e suspense. São dez episódios de cerca de 40 minutos cada. Apesar da longa duração de cada capítulo, os ganchos típicos dos suspenses psicológicos prendem o espectador no sofá, com os olhos vidrados no espelho negro.
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O mais interessante, porém, é que não é uma série policial comum. Ao ponto de fazer com a gente reavalie todo um sistema interno de julgamento
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A produção da Netflix faz com que a gente abandone uma pré-concepção de que todo o crime é vazio, por maldade intrínseca. Não que não exista, mas a série é um exemplo concreto de que uma mente destruída por negligência e violência vai repetir os padrões que internalizou como normais. Afinal, não é produto de ficção. Não se engane, não é uma versão elaborada de Criminal Minds. Esqueça as grandes perseguições e os atos heróicos de Morgan e Hotchner. Mindhunter é um thriller sufocante e angustiante que nos faz questionar a própria existência e destino. Felizmente, a segunda temporada foi confirmada para 2018.
https://www.youtube.com/watch?v=7gZCfRD_zWE
