Neste sábado, 12 de setembro, o escritor da paixão, como foi descrito por Lygia Fagundes Telles, completaria 72 anos se estivesse neste plano. Parece clichê, mas o legado literário de Caio Fernando Abreu permanece vivo, mesmo ele tendo partido no já longínquo ano de 1996. A obra de Caio F. (como ele gostava de assinar em cartas, em uma referência ao livro e filme cult Christiane F.), atingiu um patamar de universalidade, por conseguir abordar temáticas que permanecem atuais.
SEM TABUS
Um desses assuntos é o suicídio. Enquanto o tema era considerado tabu até recentemente pela mídia brasileira, Caio teve coragem para abordá-lo. Há referências à ideação de morte em textos de obras como Inventário do Irremediável (lançado em 1970), O ovo apunhalado (publicado pela primeira vez em 1975) e Morangos mofados, livro mais conhecido do grande público e que fez sucesso desde seu lançamento, em 1982.
SOBREVIVER É MELHOR
As tentativas de suicídio não foram apenas conteúdo ficcional. Caio chegou a reconhecer, em entrevista na década de 1980, que havia tentado se matar, mas tinha percebido que a vida era a melhor escolha:
Você nunca pensou em suicídio?
Já tentei três vezes. Mas eu era muito jovem e faz muito tempo. Não tentaria de novo. Adoro viver. Era uma atitude um pouco literária. Achava muito chique se suicidar aos 20 anos. Mas chique é sobreviver.
Confira a entrevista completa aqui.
EU QUERO A VIDA
Antes disso, na década de 1970, Caio escreveu um poema em que cita a palavra suicídio, mas desde a primeira estrofe enfatiza a importância de permanecer vivo:
“(sem título)
Eu quero a vida.
Com todo o riscos
eu quero a vida.
Com os dentes em mau estado
eu quero a vida
insone, no terceiro comprimido para dormir
no terceiro maço de cigarro
depois do quarto suicídio
depois de todas as perdas
durante a calvície incipiente
dentro da grande gaiola do país
de pequena gaiola do meu corpo
eu quero a vida
eu quero porque quero a vida.
É uma escolha. Sozinho ou acompanhado, eu quero, meu
deus, como eu quero, com uma tal ferocidade, com uma tal
certeza. É agora. É pra já. Não importa depois. É como a quero.
Viajar, subir, ver. Depois, talvez Tramandaí. Escrever. Traduzir. Em solidão. Mas é o que quero. Meu deus, a vida, a vida, a vida.
A VIDA
À VIDA.”
Para quem ficou interessado em conhecer a faceta poética do escritor, o livro Poesias nunca publicadas de Caio Fernando Abreu, de Letícia Chaplin e Marcia Ivana de Lima e Silva, reúne mais de 100 poemas do autor.
* Este é o primeiro de uma série de três textos da coluna Voos Literários que abordarão a importância da campanha Setembro Amarelo, de prevenção ao suicídio.
Se, por algum motivo, você sentiu-se desconfortável ao ler sobre esse assunto, ligue para o CVV, que atende 24h pelo número 188. Voluntários treinados podem te ajudar a lidar com essa situação difícil.
Imagem: Acervo Caio F. Abreu – DELFOS/PUCRS.
