Voos Literários

O beijo e o ciclo da violência doméstica

Flávia Cunha
31 de janeiro de 2020

ALERTA: Esse texto aborda a violência contra a mulher, com conteúdo que pode provocar gatilhos emocionais. Além disso, para os leitores que não gostam de spoilers, usei trechos do livro Hibisco Roxo, além de dar detalhes do enredo.   

O caso da mulher que beijou o ex-namorado em pleno tribunal, no interior do Rio Grande do Sul, após ele ter tentado matá-la com cinco tiros ganhou grande repercussão nacional. E o perdão virou-se contra a vítima, com o julgamento nas redes sociais, dentro da não-compreensão do ciclo da violência dentro de um relacionamento abusivo. Por coincidência, quando o assunto veio à tona nessa semana, eu estava terminando a leitura do livro Hibisco Roxo

Na obra, a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie aborda, com muita delicadeza, o tema da violência doméstica, expondo toda a complexidade do assunto. O enredo é narrado pela adolescente Kambili, que aos poucos vai revelando aos leitores o grande segredo de sua família. Seu pai, um próspero empresário e católico fervoroso, exerce um total controle sobre a esposa, o filho e a filha. Ao ser desobedecido ou quando considera que houve algum pecado dentro de sua rígida visão de mundo, Eugene aplica castigos em seus familiares. Os maus-tratos vão sendo intensificados ao longo da narrativa, conforme a situação política da Nigéria vai interferindo na rotina do tão temido Papa.

Quem enfrenta Eugene é sua irmã Ifeoma, uma viúva feminista e professora universitária, que prefere não depender financeiramente do irmão. É na casa dessa tia decidida que Kambili e seu irmão Jaja conseguem, aos poucos, romper o controle emocional (e até mental) exercido pelo pai abusivo. Em determinado ponto da narrativa, a mãe consegue fugir do marido e parece prestes a terminar com o casamento.  Chegando na casa da cunhada, ela explica que sofreu um aborto espontâneo depois de ter sido espancada pelo marido:

– Eu estava grávida de seis semanas.  – Ekwuzinal Não repita isso! – exclamou tia Ifeoma, arregalando os olhos.  – É verdade. Eugene não sabia. Eu ainda não tinha contado a ele, mas é verdade. 
Mama escorregou para o chão. Ficou sentada com as pernas esticadas à frente do corpo. Era uma postura humilhante, mas me abaixei e sentei ao lado dela, com meu ombro tocando o seu. Mama chorou por muito tempo.”

Logo em seguida, a história revela a dependência emocional exercida dentro de relacionamentos abusivos. Quando o marido violento entra em contato por telefone, Beatrice recua na sua atitude de sair de casa:

“Tia Ifeoma atendeu e depois veio dizer a Mama quem tinha sido. – Eu desliguei. Disse a ele que não ia deixar você falar com ele.  Mama pulou do banquinho. – Por quê? Por quê?  – Nwunye m, sente-se agora! – disse tia Ifeoma, irritada.  Mas Mama não se sentou. Ela foi para o quarto de tia Ifeoma e ligou para Papa. O telefone tocou logo depois e eu soube que ele tinha retornado a ligação. Mama saiu do quarto depois de mais ou menos quinze minutos. – Nós vamos amanhã. As crianças e eu – disse ela, olhando para algum ponto acima da cabeça de todos nós. – Vão para onde? – perguntou tia Ifeoma. – Para Enugu. Vamos voltar para casa.” 

E por mais que a cunhada tente argumentar, Beatrice prefere voltar para perto do marido abusador, demonstrando o quanto é difícil romper o ciclo da violência doméstica:

“- Você tem um parafuso solto na cabeça, gbo? Vocês não vão a lugar nenhum.  – Eugene vai vir nos apanhar.  – Escute… Tia Ifeoma falou num tom mais suave; ela deve ter percebido que um tom firme não penetraria no sorriso fixo no rosto de Mama. O olhar de Mama continuava vidrado, mas ela parecia ser outra mulher, não a mesma que saltara do táxi de manhã. Parecia estar possuída por outro demônio. – Fique pelo menos alguns dias, nwunye m, não volte tão cedo. Mama balançou a cabeça. Não havia nenhuma expressão em seu rosto, a não ser um sorriso duro. – Eugene não anda bem disse ela. – Tem tido enxaquecas e febre. Ele carrega mais sobre os ombros do que qualquer homem deveria carregar. Você sabe o que a morte de Ade fez com ele? É demais para uma só pessoa.[…] Você sabia que Eugene paga a mensalidade escolar de mais de cem pessoas? Sabe quantas pessoas estão vivas por causa do seu irmão? – Não é disso que eu estou falando, e você sabe muito bem. […] Sabe quantas mães empurraram suas filhas para ele? Sabe quantas pediram que ele engravidasse suas filhas, sem nem precisar se incomodar em pagar o preço de uma noiva? – E daí? Diga… e daí? retrucou tia Ifeoma, gritando. “

Como podemos perceber no trecho acima, a mulher vítima de violência dentro de um casamento procura encontrar motivos para justificar o comportamento do marido abusivo. É muito difícil para quem está de fora da relação compreender, como podemos notar pela reação da personagem Ifeoma. No caso real da mulher que preferiu perdoar o ex e retomar o relacionamento agora que o homem foi absolvido da tentativa de homicídio, me parece que o mais conveniente seria tentarmos não julgá-la. Se a conhecesse, aconselharia terapia e cautela. Alguém que reage com tamanha violência depois de uma discussão conjugal parece ter dificuldade de controlar a raiva, o que pode ser muito perigoso no futuro.

Infelizmente, esse beijo em público está sendo usado para justificar a violência contra a mulher. E para isso, não pode haver perdão. 
Voos Literários

A luta antirracista precisa ser de todos

Flávia Cunha
23 de novembro de 2019

Escrevo esse texto em 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, direto do Rio Grande do Sul, estado brasileiro que optou por não tornar feriado uma data tão significativa. Aproveito o ensejo para falar sobre racismo estrutural, já que muitos brancos insistem em não enxergar a brutal desigualdade racial brasileira, desde os tempos da escravidão até o século 21. Acho importante que uma pessoa que não seja negra toque no assunto, porque evita um dos argumentos mais furados dos racistas velados, que é o suposto vitimismo dos negros quando falam em racismo.

Nessa semana, foi divulgado que a menina Agatha, negra, foi morta mesmo pelo tiro acidental de um polícia militar no Rio de Janeiro. Não havia registro de operação no momento do disparo.  Ela é apenas um dos muitos casos de pessoas negras mortas por balas perdidas da polícia ou ao serem confundidas com criminosos em operações.  Mas quando se fala em genocídio da população negra no Brasil, tem sempre quem reaja contrário à essa ideia. Exemplo disso é o deputado Coronel Tadeu (PSL-SP), que rasgou uma placa de uma exposição no Congresso Nacional sobre o assunto. Ofendeu-se pelos policiais mostrados na imagem que ilustra esse post. Mas como dizer que não existe algo errado quando os negros são 54% da população brasileira mas o percentual de pessoas negras assassinadas no país chega a 71,5%? Veja mais detalhes aqui.

Mas vamos voltar um pouco no tempo.

Na coluna anterior, abordei o fim do império e a proclamação da República. Propositalmente deixei de fora uma questão nevrálgica envolvendo esse período histórico: o fim da escravidão. O Brasil foi o último país do mundo a abolir a escravatura, em 1888. Mesmo sem prever nenhum tipo de compensação para os libertos, o sentimento dos ex-escravos foi de gratidão à Princesa Isabel. Contudo, a elite que ganhava dinheiro com a mão-de-obra escrava, não ficou nada feliz com a decisão imperial, em um momento em que a monarquia brasileira já estava fragilizada por outras questões. 

O movimento republicano ganhou força com apoio de produtores rurais que se sentiam “prejudicados” pelo fim da escravidão. Para se ter uma ideia de como ser republicano na época não era exatamente sinônimo de ser libertário, muitos abolicionistas eram favoráveis ao Império. Após o golpe militar que levou ao início da República, houve quem pressionasse o governo a tomar medidas para amparar a população negra, como a distribuição de terras para ex-escravos. Uma dessas vozes foi o poeta e jornalista José do Patrocínio. No jornal A Cidade do Rio, de sua propriedade, fazia duras críticas ao governo do então presidente (não-eleito) Floriano Peixoto. Resultado por tocar no tabu da falta de indenização aos escravos libertos no Brasil? Patrocínio foi exilado na Amazônia, teve depois seu jornal fechado pelo governo militar e acabou morrendo na miséria.

A tentativa de “passar pano” na dívida histórica brasileira com os negros parece ter raízes nesse momento histórico. Um romance que retrata a sociedade escravagista do século 19 é Um Defeito de Cor, publicado em 2006 pela escritora mineira Ana Maria Gonçalves, após uma extensa pesquisa histórica. O livro aborda a trajetória de Kehinde, que até a infância vivia em Savalu, na África, e acaba sendo capturada e trazida ao Brasil  em um navio negreiro. A obra vai virar minissérie televisiva em 2020. No trecho abaixo, a personagem descreve sua relação com a religião católica e com o que classifica como “defeito de cor”:

Ou seja, eles tinham dúvida se nós éramos humanos e se podíamos ser admitidos como católicos, se conseguiríamos pensar o suficiente para entender o que significava tal privilégio. Eu achava que era só no Brasil que os pretos tinham que pedir dispensa do defeito de cor para serem padres, mas vi que não, que em África também era assim. Aliás, em África, defeituosos deviam ser os brancos, já que aquela era a nossa terra e éramos em maior número. O que pensei naquela hora, mas não disse, foi que me sentia muito mais gente, muito mais perfeita e vencedora que o padre. Não tenho defeito algum e, talvez para mim, ser preta foi e é uma grande qualidade, pois se fosse branca não teria me esforçado tanto para provar do que sou capaz, a vida não teria exigido tanto esforço e recompensado com tanto êxito.

Outro livro que aborda a questão racial é Americanah, da aclamada escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. A obra é uma leitura que pode ser interpretada em várias camadas, ao abordar a história de amor de Ifemelu e Obinze, separados quando a jovem sai da Nigéria e vai estudar nos Estados Unidos. (E acaba depois retornando ao seu país de origem, sendo a “americanah” do título).   Para a abordagem desse texto antirracista, separei um trecho do blog ficcional que Ifemelu mantém quando está em território norte-americano: Observações Diversas sobre Negros Americanos (Antigamente Conhecidos como Crioulos) Feitas por uma Negra Não Americana.

No trecho abaixo, a personagem faz uma postagem direcionada aos brancos, em que é bastante didática ao refletir sobre questões como racismo estrutural, escravidão e o absurdo do termo “racismo reverso”:

Querido Americano Não Negro, caso um Americano Negro estiver te falando sobre a experiência de ser negro, por favor, não se anime e dê exemplos de sua própria vida. Não diga: “É igualzinho a quando eu…”. Você já sofreu. Todos no mundo já sofreram. Mas você não sofreu especificamente por ser um Negro Americano. Não se apresse em encontrar explicações alternativas para o que aconteceu. Não diga: ‘Ah, na verdade não é uma questão de raça, mas de classe. Ah, não é uma questão de raça, mas de gênero. Ah, não é uma questão de raça, é o bicho-papão’. Entenda, os Negros Americanos na verdade não querem que seja uma questão de raça. Para eles, seria melhor se merdas racistas não acontecessem. Portanto, quando dizem que algo é uma questão de raça, talvez seja porque é mesmo, não? Não diga: ‘Eu não vejo cor’, porque, se você não vê cor, tem de ir ao médico, e isso significa que, quando um homem negro aparece na televisão e eles dizem que ele é suspeito de um crime, você só vê uma figura desfocada, meio roxa, meio cinza e meio cremosa. Não diga: ‘Estamos cansados de falar sobre raça’ ou ‘A única raça é a raça humana’. Os Negros Americanos também estão cansados de falar sobre raça. Eles prefeririam não ter de fazer isso. Mas merdas continuam acontecendo. Não inicie sua reação com a frase ‘Um dos meus melhores amigos é negro’, porque isso não faz diferença, ninguém liga para isso, e você pode ter um melhor amigo negro e ainda fazer merda racista. Além do mais provavelmente não é verdade, não a parte de você ter um amigo negro, mas a de ele ser um de seus “melhores” amigos. Não diga que seu avô era mexicano e que por isso você não pode ser racista (por favor, clique aqui para ler sobre o fato de que Não há uma Liga Unida dos Oprimidos). Não mencione o sofrimento de seus bisavós irlandeses. É claro que eles aturaram muita merda de quem já estava estabelecido nos Estados Unidos. Assim como os italianos. Assim como as pessoas do Leste Europeu. Mas havia uma hierarquia. Há cem anos, as etnias brancas odiavam ser odiadas, mas era meio que tolerável, porque pelo menos os negros estavam abaixo deles. […] Não diga: “Ah, o racismo acabou, a escravidão aconteceu há tanto tempo”. […] Finalmente, não use aquele tom de Vamos Ser Justos e diga: “Mas os negros são racistas também”. Porque é claro que todos nós temos preconceitos (não suporto nem alguns dos meus parentes de sangue, uma gente ávida e egoísta), mas o racismo tem a ver com o poder de um grupo de pessoas e, nos Estados Unidos, são os brancos que têm esse poder.  […] Então, depois dessa lista do que não fazer, o que se deve fazer? Não tenho certeza. Tente escutar, talvez. Ouça o que está sendo dito. E lembre-se de que não é uma acusação pessoal. Os Negros Americanos não estão dizendo que a culpa é sua. Só estão dizendo como é. Se você não entende, faça perguntas. Se tem vergonha de fazer perguntas, diga que tem vergonha de fazer perguntas e faça assim mesmo. É fácil perceber quando uma pergunta está sendo feita de coração. Depois, escute mais um pouco. Às vezes, as pessoas só querem ser ouvidas. Um brinde às possibilidades de amizade, de elos e de compreensão.”

Voos Literários

Chimamanda e a polêmica do azul e rosa no Brasil

Flávia Cunha
8 de janeiro de 2019

A fala da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos sobre “meninas usarem rosa, meninos usarem azul” gerou uma repercussão negativas na Internet mas obteve uma ampla defesa por parte do eleitorado alinhado com o atual presidente. Porém, considero que essa declaração vai muito além de ser apenas uma bobagem ou cortina de fumaça para encobrir ações mais relevantes do governo, como já li por aí . Por trás do empolgado grito de Damares Alves está o conservadorismo, que é contrário às causas LGBT e feminista. É também a dinâmica do novo governo: usar os costumes como ferramenta de coerção dos “diferentes” e, ao mesmo tempo, agradar a uma parcela da população que se incomoda com quem é fora do padrão.

Vou falar aqui hoje do ponto de vista feminista, por acreditar que ele abarca o respeito e a igualdade, que é o que todas as pessoas com o mínimo de bom senso deveriam querer para a nossa sociedade.

Para abordar o assunto escolhi dois livros da aclamada escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, que tem obras traduzidas para mais de 30 idiomas e é um fenômeno mundial na área editorial e no ativismo feminista.

Em Sejamos Todos Feministas, a autora faz uma reflexão necessária sobre como seria libertador para todos alcançar a igualdade:

[…] meninas poderão assumir sua identidade, ignorando a expectativa alheia, mas também os meninos poderão crescer livres, sem ter que se enquadrar em estereótipos de masculinidade.”

O livro é uma adaptação de um famoso discurso feito por Chimamanda em um TEDx e também foi musicado pela cantora pop Beyoncé.

INFÂNCIA FEMINISTA

Porém, já que ao explicar posteriormente sua fala a ministra brasileira tentou remendar dizendo que o uso de determinadas cores deve ser aplicado apenas durante a infância, vou me deter mais na obra Para Educar Crianças Feministas – Um Manifesto.

Esse livro da escritora nigeriana foi inspirado na carta a uma amiga que fez o pedido à autora de conselhos de como criar uma criança dentro dos preceitos do feminismo. (Lembrando que trata-se de educar para a igualdade e não de mulheres terem mais valor do que homens.)

Para Educar Crianças Feministas tem várias respostas que podemos aplicar para o discurso e visão de mundo arcaica de Damares Alves.

Sobre a polêmica azul x rosa no vestuário infantil, Chimamanda comenta, ao falar sobre a busca de uma roupa em uma loja:

Na seção das meninas, havia umas coisas pálidas espantosas, em tons de rosa desbotado. Não gostei. A seção dos meninos tinha roupas num azul forte e vibrante. Como achei que o azul ia ficar lindo em contraste com a pele morena dela — e sai melhor nas fotos —, comprei uma roupinha azul. A moça do caixa me disse que era o presente ideal para um garotinho. Falei que era para uma menininha. Ela fez uma cara horrorizada: “Azul para uma menina? Fico imaginando quem foi o gênio do marketing que inventou essa dualidade rosa-azul. […] Por que não organizar as roupas infantis por idade e expô-las em todas as cores? Afinal, todos os bebês têm corpo parecido.”

Mais adiante, na mesma obra, a autora comenta sobre as brincadeiras serem separadas por gênero, o que ela também considera inadequado:

Os brinquedos para meninos geralmente são “ativos”, pedindo algum tipo de “ação” — trens, carrinhos —, e os brinquedos para meninas geralmente são “passivos”, sendo a imensa maioria bonecas. Fiquei impressionada com isso. Eu não tinha percebido ainda como a sociedade começa tão cedo a inventar a ideia do que deve ser um menino e do que deve ser uma menina. Eu gostaria que os brinquedos fossem divididos por tipo, não por gênero. Já contei sobre a vez que fui a um shopping americano com uma menina nigeriana de sete anos e a mãe dela? A menina viu um helicóptero de brinquedo, uma daquelas coisas que voam com controle remoto. Ela ficou fascinada e pediu um. “Não”, disse a mãe. “Você tem suas bonecas.” E a menina respondeu: “Mamãe, é só com boneca que vou brincar?”. Nunca me esqueci daquilo. A intenção da mãe era boa, claro. Era bem versada nas ideias de estereótipos de gênero — meninas brincam com bonecas e meninos brincam com helicópteros. Agora me pergunto, um pouco sonhadora, se a menininha não teria virado uma engenheira revolucionária se tivessem dado a ela a chance de explorar aquele helicóptero.”

Para quem me lê aqui e têm crianças pequenas por perto, sugiro refletir sobre como a questão de gênero ensinada durante a infância pode refletir durante a idade adulta, influenciando nos relacionamentos amorosos e, como Chimamanda mencionou acima, nas escolhas profissionais.

A organização doméstica ainda é uma atribuição considerada exclusivamente feminina em diversos países.

Chimamanda aconselha como sua amiga (e todos que têm filhxs) deve agir para mudar essa situação:

Ensine a ela que ‘papéis de gênero’ são totalmente absurdos. Nunca lhe diga para fazer ou deixar de fazer alguma coisa ‘porque você é menina’. ‘Porque você é menina’ nunca é razão para nada. Jamais. Lembro que me diziam quando era criança para ‘varrer direito, como uma menina’. O que significava que varrer tinha a ver com ser mulher. Eu preferiria que tivessem dito apenas para ‘varrer direito, pois assim vai limpar melhor o chão’. E preferiria que tivessem dito a mesma coisa para os meus irmãos.”

E se mesmo depois dessa toda essas reflexões sobre gênero (que começa com a história do rosa e azul) vocês ainda acharem que o assunto é “bobagem”, atentem para os números de violência contra a mulher e para diversos feminicídios ocorridos nos últimos dias no Brasil. Por trás desse cenário de barbárie, há uma criação machista e patriarcal, que passa para os homens a mensagem de que suas esposas, namoradas ou amantes são sua propriedade e, portanto, não podem ter vontade própria e tomar a iniciativa de terminar um relacionamento, por exemplo.

Para mudar esse cenário, é preciso que comecemos, sim, desde a infância a mudar a mentalidade de meninas e meninos.

E, para encerrar o assunto de cor para menino ou menina, observem como nessa foto da infância de Chimamanda Ngozi Adichie ela está linda com um vestido AZUL e branco. Porque cor, meus amigos, nunca teve gênero.

O que existe por trás dessa polêmica é a normatização de comportamentos. Vamos lutar contra isso, porque também faz parte da resistência política darmos liberdade para cada um criar seus filhos dentro de seus valores, desde que eles não sejam perpetuadores implícitos de violência e preconceito, como os conservadores defendem.

Imagens: acervo/autora