O que uma eleição fictícia na Academia Brasileira de Letras na década de 1940 tem a ver com o cenário político atual no Brasil? As tramóias de bastidores para conseguir obter resultados favoráveis.
O enredo do livro Farda, Fardão, Camisola de Dormir, de Jorge Amado, é uma crítica ao período do Estado Novo, de Getúlio Vargas. Com a morte de um poeta libertário, abre-se a vaga na Academia. Forças conservadoras tentam alçar um coronel à vaga de Imortal. O trecho da obra revela as barganhas entre o militar em questão e um integrante do Judiciário para obter a vitória na eleição:
“Impossível candidato de maior prestígio, contando com o apoio das figuras mais poderosas do regime, com trânsito livre… Tão livre assim? Haverá quem queira discutir, torcer o nariz, argumentando com as posições políticas do candidato, mas nenhum irá além do resmungo, terminando todos por engolir a pílula e comparecer com o 29 voto. Eleição líquida e certa.
[…]
Ah! depois colher a merecida recompensa: a primeira vaga no Supremo Tribunal Federal, pois, como se sabe, uma mão lava a outra. Toma lá a Academia, coronel, dá cá o Supremo.
[…]
— Candidato único? Acha possível, querido amigo?”
Os elementos mostrados no diálogo ficcional criado por Jorge Amado podem ser comparados a diversos episódios recentes. Para ficar nos últimos acontecimentos, o que se pode dizer da troca de integrantes na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados para tentar garantir um resultado que favoreça Michel Temer?
Até o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB), considerou a atitude questionável.
Aguardemos os próximos episódios da tragicomédia no Planalto Central. Sem deixar de lado o senso crítico, o jeito é rir. Para não chorar. De raiva.
