Morreu, recentemente, aos 98 anos, Antonio Candido, um dos mais reconhecidos estudiosos da Literatura Brasileira. Ao ver no Facebook a publicação de um conhecido da área de Letras comentando o fato, imaginei que o fato não teria grande repercussão na grande mídia. Felizmente, me enganei e houve justas homenagens a esse crítico literário e professor universitário da USP. Destaco especialmente os artigos do Estado de São Paulo, em que há uma boa análise da sua trajetória, e da Folha de São Paulo, no qual ele é comparado a grandes teóricos como Gilberto Freyre (Casa Grande & Senzala) e Sérgio Buarque de Hollanda (Raízes do Brasil).
A comparação é feita principalmente devido ao trabalho mais grandioso desse carioca radicado em São Paulo: Formação da Literatura Brasileira: Momentos Decisivos. Lançado na década de 1950, a obra ainda está disponível para venda e é uma referência no meio acadêmico. Candido optou por estudar o Arcadismo e o Romantismo, considerados por ele decisivos para a formação do que ele chama de sistema literário, de forma a estabelecer uma tradição.
O interessante é que a criação desse sistema literário não era considerado por Antonio Candido o essencial de sua obra, mas foi o mais chamou a atenção da crítica. Rebatendo seus críticos da época, ele escreveu o seguinte comentário no prefácio da segunda edição da obra (ainda na década de 1950):
“Este livro foi recebido normalmente com louvores e censuras. Mas tanto num quanto noutro caso, o que parece haver interessado realmente aos críticos e noticiaristas foi a “Introdução”, pois quase apenas ela foi comentada, favorável ou desfavoravelmente. Esse interesse pelo método talvez seja um sistema de estarmos, no Brasil, preferindo falar sobre a maneira de fazer crítica, ou traçar panoramas esquemáticos, a fazer efetivamente crítica, revolvendo a intimidade das obras e as circunstâncias que a rodeiam.”
Ele também enfrentou artigos contrários na imprensa da época pelo fato de não ter incluído em seu o livro um estudo sobre o Barroco. Sobre essa fato, Candido argumentou nunca ter negado a existência da literatura barroca e que a censura à sua decisão de utilizar o século 18 como o momento em que o sistema literário se configura se deve “a uma vontade por parte da crítica de compreender que a literatura pode ser estudada de várias formas”.
E a gente aqui achando que os haters são uma novidade da pós-modernidade…
Ainda sobre Antonio Candido, outro fato que sempre me chamou a atenção sobre ele foi sua amizade com Oswald de Andrade, o modernista mais transgressor da Semana de 1922. Curiosamente, foi devido a uma crítica literária negativa que a amizade entre os dois começou.
“Ele zangou e escreveu um artigo muito violento sobre mim. Mas depois nos encontramos em uma livraria e ele disse: ‘ataquei você com violência e você respondeu com serenidade. Proponho que nos tornemos amigos’.”
A revelação de Antonio Candido ocorreu durante evento promovido pela Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), em 2011.
Quem dera que as críticas (sejam elas literárias, ou não) sempre acabassem assim: em harmonia e com a descoberta de uma verdadeira amizade.
