Voos Literários

Criticar o governo Lula é permitido para esquerdistas?

Flávia Cunha
25 de abril de 2023
O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, visita pela primeira vez o centro de transição no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) e se reúne com parlamentares das bancadas aliadas.

Criticar o governo Lula e as falas do presidente da República vem sendo um campo minado para quem tem ideais esquerdistas. Sem dúvida, a eleição do atual presidente é um alívio, depois de enfrentarmos os desmandos de Jair Bolsonaro no cargo. Porém, apenas por isso, Lula seria inquestionável?

Diante de um certo linchamento virtual para quem ousa apontar erros no atual governo, estou internamente reticente desde janeiro de 2023. Será que posso criticar, por exemplo, a forma como foi anunciada a taxação de compras em plataformas asiáticas e seu subsequente recuoDevo comentar que as falas improvisadas de Lula precisam ser contidas por sua equipe? É conveniente opinar que Janja talvez esteja um tom acima como primeira-dama e poderia ser um pouco mais discreta em suas declarações e posicionamentos?

Críticas construtivas deveriam ser bem-vindas

Para além do receio de “cancelamento” por parte de quem vê na figura de Lula um líder que nunca erra, recomendo avaliarmos se determinados posicionamentos contrários ao governo em seus primeiros meses não serão usados como munição pelas hordas da extrema-direita. Então, considero fundamental calcularmos quais críticas poderão ser de fato construtivas e não apenas serem somadas ao mero ato de falar mal de quem está no poder. Nesse sentido, percebemos o quanto o antipetismo construiu um repertório vasto – e tosco – que vai de citar a falta de um dedo de Lula a garantir que ele é o maior ladrão de todos os tempos, ainda que a corrupção no país seja endêmica e presente desde os primórdios da colonização portuguesa no Brasil.

Por outro lado, acredito que a capacidade de análise crítica foi deturpada nos últimos anos, em especial com o acirramento da polarização na política. Desaprovar determinada ação de alguém que admiramos não deveria nos transformar automaticamente em inimigo desta pessoa. 

Mas, no mundo virulento das redes sociais, é muitas vezes o que acontece. Um exemplo recente foi a reação a uma publicação de Manuela D’Ávila, que ousou fazer críticas e dar sugestões à equipe de comunicação do governo federal. Integrante do PC do B e ex-candidata à vice-presidente em 2018 na chapa com o petista Fernando Haddad, tenho certeza que ela jamais imaginou que seria xingada por esquerdistas por esta “ousadia”.  

Indicação de leitura

Como de costume, defendo o ponto de vista que os livros podem contribuir para mudanças reais de comportamento. Por isso, sugiro a leitura de Pensamento crítico: o poder da lógica e da argumentação, de Walter A. Carnielli e Richard L. Epstein, lançado no Brasil pela editora Rideel. 

No prefácio da primeira edição desta obra de filosofia, os autores destacam a importância do pensamento crítico, tão necessário nos tempos atuais:

“Pensar criticamente é algo com que nos defrontamos todos os dias, e é um componente fundamental da nossa formação numa verdadeira democracia. Precisamos pensar criticamente para sermos melhores cidadãos e melhores profissionais, quer sejamos professores, filósofos, advogados, juízes, políticos, jornalistas, historiadores, médicos, artistas ou cientistas. Se dominarmos o pensamento crítico, teremos a possibilidade de participar de um modo mais produtivo nas relações interpessoais, pois as nossas propostas serão mais claramente formuladas e estarão mais bem fundamentadas. E não seremos tão facilmente enganados pelo mau jornalismo, pela publicidade e pelos maus políticos. Teremos uma palavra sensata e fundamentada a dizer e poderemos contribuir para uma sociedade e para um ensino melhor.”

 

Imagem: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

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