Samir Oliveira

LGBTfobia de Estado: quando o poder público é agente ativo da discriminação

Samir Oliveira
20 de julho de 2017

Em maio deste ano a Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais (ILGA, na sigla original, em inglês) publicou o relatório: “Homofobia de Estado – Estudo jurídico mundial sobre a orientação sexual no direito: criminalização, proteção e reconhecimento”.

Trata-se do estudo mais completo e recente a respeito das legislações internas de dezenas de países em todos os continentes sobre a população LGBT. A análise leva em conta não somente a existência de leis que punem a comunidade sexo-diversa, mas também de dispositivos que garantem direitos nas mais diversas instâncias.

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A riqueza de detalhes do estudo é impressionante. Uma leitura fundamental para quem deseja entender como as estruturas de Estado no mundo inteiro tratam a população LGBT

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O relatório aponta que em 124 países não existe nenhuma lei que criminaliza a relação sexual consensual entre gays e lésbicas. A boa impressão causada por este dado desmorona quando observamos a informação seguinte: outros 72 estados criminalizam essas relações em suas leis.

Em pleno 2017, existem quatro nações que punem com pena de morte seus próprios cidadãos LGBTs. Outros dois países possuem esta tipificação criminal de forma parcial, em algumas jurisdições de seu território.

O que diferencia este estudo da mera tabulação fria de dados é sua capacidade de interpretar os números através da realidade de cada país. Não é apenas o conceito físico ou carcerário de punição que é levado em conta.

Por exemplo, o relatório informa que 19 estados possuem leis de moralidade e de propaganda, que proíbem a liberdade de expressão quando o assunto é diversidade sexual e de gênero. Na prática, o Estado censura o direito das próprias pessoas de se reconhecerem e se afirmarem enquanto LGBTs.

A luta por um mundo mais justo e igualitário é árdua e longa. Estas leis não serão derrubadas da noite para o dia. Mas serão inevitavelmente sepultadas em algum momento. Nenhuma tirania dura para sempre.

A prova disso está no próprio estudo da ILGA, que demonstra que 23 países reconhecem e celebram casamento entre pessoas do mesmo sexo. O Brasil está nesta lista – infelizmente não por existência de legislação que garanta este direito, mas por jurisprudência consolidada. Outros 26 estados asseguram a LGBTs o direito à adoção.

As placas tectônicas da História por vezes se movimentam de forma lenta, mas nunca permanecem inertes. Em todos os países que hoje protegem ou garantem direitos a população LGBT um dia já imperou a lógica punitiva. E nos países que permanecem institucionalmente “neutros”, o pêndulo pode virar tanto a nosso favor como contra.

Por isso é preciso seguir lutando e não se render. Sem ingenuidade, mas também sem deixar de acreditar que um outro mundo é possível – e realmente é, se fizermos nossa parte para que isso aconteça.