Voos Literários

Exausta (mas com esperança em 2022)

Flávia Cunha
21 de dezembro de 2021

Exausta de Brasil. É assim que me encontro nesse finzinho de ano. Ando fugindo das notícias, o que não é algo muito digno de uma jornalista admitir publicamente. Mas sei que não estou sozinha nesta sensação.

Como não estar exausta? O ano de 2021 foi uma continuação bem difícil de 2020, com a tristeza crescente pelas vítimas da pandemia e a raiva incessante pela postura tenebrosa do ser (humano?) que ocupa a presidência da República. A última dele foi fazer uma dancinha em uma lancha, ao som de uma música com letra misógina. (Viram? Mesmo exausta, sigo tendo acesso a notícias infames).

Esperança

Porém, neste último texto do ano gostaria de deixar uma mensagem de esperança e não apenas de cansaço e reclamação. (Exausta mas com empatia pelos sentimentos alheios, compreendem?) Por isso, desejo que os bons ventos do Chile possam, de alguma forma, chegar ao Brasil. 

Sabemos que a realidade de cada país é diferente. Por outro lado, não podemos esquecer que o modelo econômico chileno é inspiração para Paulo Guedes. Ele mesmo, o ministro maléfico que deseja o fim da suposta mamata dos aposentados. Afinal, na visão dele, quem merece ficar bem são apenas os muito ricos e nunca os trabalhadores das camadas mais empobrecidas.

Brasileiros mais conscientes

E, sim, estou exausta também de Paulo Guedes mas em busca de esperança, lembram? Pois então, vou focar no desejo que os eleitores tenham mais consciência ao votar em 2022. Que entre as escolhas possíveis, os brasileiros resolvam abrir a “porta” de um futuro com menos pobreza e mais vacinas. Entendam que política não se faz apenas nas urnas. Pois precisamos estar nas ruas, expressando nossos desejos, assim como nossos irmãos chilenos bem fizeram em 2019. Porque lá, mesmo exaustos de tanto neoliberalismo e crueldade dos governantes, eles não se renderam. 

Feminismo e política

Aliás, inspirada pela vitória de Gabriel Boric, estou lendo Mulheres de minha alma, da chilena Isabel Allende, a escritora de língua espanhola mais lida no mundo. Na obra, a autora trata sobre sua visão pessoal do feminismo e faz necessárias observações a respeito da política recente em seu país:

“Até 2019, o Chile se considerava o oásis da América Latina, país próspero e estável num continente sacudido por vaivéns políticos e por violência. Em 18 de outubro daquele ano, o país e o mundo se surpreenderam quando a ira popular explodiu. Os números econômicos otimistas não mostravam a distribuição dos recursos nem o fato de que a desigualdade no Chile é uma das maiores do mundo.

O modelo econômico do neoliberalismo extremo, imposto pela ditadura do General Pinochet nos anos 1970 e 1980, privatizou quase tudo, inclusive os serviços básicos, como a água potável, e deu carta branca ao capital, enquanto os trabalhadores eram duramente reprimidos.

Isso produziu um boom econômico que durou algum tempo e possibilitou o enriquecimento desenfreado de uns poucos, enquanto o restante da população sobrevivia com dificuldade a crédito. É verdade que a pobreza diminuiu para menos de 10%, mas essa cifra não revela a extensa pobreza dissimulada da classe média baixa, da classe trabalhadora e dos aposentados, que recebem pensões miseráveis. O descontentamento acumulou-se durante mais de trinta anos.

Nos meses seguintes a outubro de 2019, milhões de pessoas saíram às ruas para protestar em todas as cidades importantes do país, no início de forma pacífica, mas logo começaram os atos de vandalismo. A polícia reagiu com uma brutalidade que não se via desde a época da ditadura. 

Ao movimento de protesto, que não tinha líderes visíveis nem estava ligado a partidos políticos, foram-se somando diversos setores da sociedade, com suas próprias reivindicações, desde os povos originários até estudantes, sindicatos, associações profissionais e, lógico, grupos feministas.”

 

Como podemos perceber, há semelhanças da descrição da conjuntura chilena feita por Isabel Allende com o atual estado de pobreza dissimulada da população brasileira. Por isso, mesmo exaustos, merecemos a esperança de que mudanças positivas também possam acontecer por aqui. Quem sabe? É melhor acreditar, apesar do ceticismo e cansaço.

Feliz 2022! Retorno em janeiro, com colunas mensais.

Imagem: Qimono – 502 images/Pixabay

 

 

 

Voos Literários

Jane the Virgin: amor incondicional à Literatura

Flávia Cunha
3 de setembro de 2019

Jane the Virgin chegou ao fim depois de 5 deliciosas temporadas de homenagem à telenovelas. Mas a série vai muito além disso. Aborda protagonismo feminino, imigração e romance lésbico, entre outros temas incomuns para comédias, de uma forma respeitosa e inovadora.

Em meio ao enredo por vezes propositalmente nonsense, sempre me chamou a atenção o grande amor da protagonista pelos livros. Jane poderia ser apenas uma grande fã de telenovelas, pois é essa a influência que teve da avó e da mãe, de origem latina. Porém, por ser uma verdadeira nerd, ela transferiu a paixão televisiva para a Literatura.

Alerta de spoilers sobre a trajetória de Jane como escritora:

Ao longo das temporadas, vemos Jane lutar para ser reconhecida profissionalmente como escritora, após saber que seu primeiro livro foi publicado principalmente por influência de seu pai, um famoso ator de novelas. Sua personalidade obsessiva por perfeição sofre para chegar ao que considera um romance à altura de seu próprio talento.

Nessa parte podemos esperar por um final muito feliz, já Jane consegue não somente lançar seu segundo livro, como ter a consagrada autora Isabel Allende como a responsável por seu prefácio, além de receber um cachê milionário pelo seu trabalho como escritora.

No fim das contas, trata-se de uma grande homenagem ao realismo mágico latino-americano, outra grande referência da produção.

A quinta temporada, que terminou de ser exibida na televisão norte-americana em julho de 2019, ainda não chegou à Netflix.

Fotos: CW/Divulgação