Esta semana vi uma notícia que me chocou e inspirou ao mesmo tempo: a de que travestis estavam denunciando a violência e o assédio sofridos por policiais à paisana na Zona Sul de São Paulo. Fiquei chocado – talvez ingenuamente – por perceber que este tipo de conduta ocorria em plena luz do dia. Por custar a crer que essa realidade, tão comum durante a ditadura, como relatam muitas travestis que viveram aquele período, segue presente até hoje.
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E fiquei inspirado pela força e resistência destas mulheres. Não se intimidaram diante da violência. Organizaram-se, filmaram seus agressores e foram até as últimas consequências com suas denúncias.
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Elas desejam apenas trabalhar. É evidente que sua presença é um incômodo ao bairro Cidade Jardim. Travestis, e ainda por cima prostitutas, desvalorizam o preço dos imóveis na região nobre de São Paulo.
Como elas ousam permanecer próximo ao Jockey Club? Misteriosamente aparecem policiais à paisana para reprimi-las, sem que ninguém assuma tê-los contratado. A própria associação de moradores do Cidade Jardim nega a contratação com uma mão e defende que se enxote as prostitutas com a outra.
Desconfio que façam isso porque sabem que é ilegal contratar policiais militares para bicos de qualquer natureza. Tanto é que a própria corregedoria da Polícia está investigando o caso. O que não deixa de ser revoltante – afinal a corporação não está apurando a comprovada e registrada violência dos policiais contra as travestis, mas sim o fato de eles estarem fazendo um bico.
Não fosse a organização das travestis e a coragem em encaminhar as denúncias, nós provavelmente nem tomaríamos conhecimento desta situação humilhante a que elas estão expostas. Que os movimentos LGBTs de São Paulo cerquem de solidariedade estas trabalhadoras. No país em que a expectativa de vida da população trans é de 35 anos, elas são verdadeiras sobreviventes.
