Pedro Henrique Gomes

Todos os horrores do presidente

Pedro Henrique Gomes
3 de junho de 2017

Rever Todos os Homens do Presidente, filme de Alan J. Pakula sobre a investigação jornalística conduzida pelos repórteres Carl Bernstein e Bob Woodward e que resultou na renúncia do então presidente Nixon, não é menos que iluminador. O leitor ao certo conhece o caso Watergate: a detenção de 5 homens que tentavam instalar escutas e fotografar documentos a mando dos Republicanos na sede dos Democratas, em junho de 1972.

Corria a campanha que culminaria na reeleição de Nixon. Ele sabia dos grampos. Nixon renunciaria dois anos depois e acabaria generosamente anistiado por seu sucessor Gerald Ford, então vice-presidente. Pakula filmou a rotina dos jornalistas dentro do thriller de conspiração, de tramas subterrâneas, de informantes, de homens que sabem mais que outros, de poder e dinheiro, de mentira, de blefe; filma, claro, relações de força. O mundo é este de sangue e violência.

Junto com Klute (1971) e A Trama (1974), compõe a “tríplice coroa da paranoia” de Pakula. Filmes de conspiração e complô, assassinatos políticos e obsessões de indivíduos diante de acontecimentos públicos foram algo comuns a partir dos anos 1960 e 70 no cinema americano. O assassinato de Kennedy em 1963, filmado por Abraham Zapruder, teria sido a imagem detonadora da ficção paranóica, que legaria, além dos filmes de Pakula, A Conversação, de 1974, de Francis Ford Coppola.

A paranoia está sempre a nos rondar, seja como forma, seja como ideologia. Surge de um acontecimento factual, mais ou menos verdadeiro, e se desenvolve ad infinituum na mente do paranoico. No cinema, frequentemente só cessa com a morte do paranoico.

O recente e atual clima político brasileiro, em forma e ideologia, abre espaço a toda sorte de maquinações conspiracionistas. As teses de complôs políticos, para lá e para cá, pululam nos media. Em meio ao caos, aos fake news, ao fla-flu polarizador, é irônico que o fim do jornalismo seja, como todos os anunciados “fins”, ele também um embuste. Antes do que nunca, agora é preciso mais jornalismo, mais investigação séria, mais apuração. A tecnologia e seus usos pelas forças políticas da riqueza engendraram novas estruturas de dominação, controle e manutenção da barbárie civilizacional que nos acomete. Para derrubar um corrupto, parafraseando uma alegoria dos anos 1960, é também preciso que o jornalismo volte a ser perigoso. Se um dia o foi.